Problemas com anticoncepcionais podem causar doenças sérias, alertam ginecologistas

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Mulheres,

Que demonstram seu sofrimento

Da forma sincera e humana que existe

Mas que também não conseguem esconder

Quando estão completamente felizes.

Mara Chan

Arquivo pessoal

A jornalista Gabriela Costa, de 22 anos, precisou fazer uma cirurgia de retirada de nódulo de um seio quando tinha 17 anos. Uma suspeita dos médicos é que o uso de anticoncepcional pode ter sido responsável pela doença. Ela usava o medicamento indicada para regulação hormonal. “Eu comecei a utilizar [o anticoncepcional] porque estava em um relacionamento e no início da vida sexual ativa. Além disso, porque achava que ajudaria a regular meu ciclo menstrual e melhorar a pele também”. Para a ginecologista Natália Paes Barbosa, problemas como esse podem ocorrer, e devem ser acompanhados por médicos permanentemente. Entre os incômodos que servem de alerta, estão dores de cabeça, náuseas e alteração do fluxo menstrual.

Segundo dados do IBGE, 61% das mulheres brasileiras, optam por usar o anticoncepcional para realizar algum desses objetivos. De acordo com a ginecologista, Natália Paes Barbosa, toda mulher que deseja usar o método contraceptivo tem que passar por uma série de exames para descobrir qual o ideal para ela.

“Primeiramente quando a paciente me procura pensando em anticoncepção, a gente começa fazendo toda uma história, que é o que a gente chama de anamnese.  Para saber se ela tem algum problema de saúde, alguma história prévia, alguma história familiar, usa algum medicamento, já fez alguma cirurgia, fuma. Há vários fatores que influenciam na escolha da via de administração e do tipo de anticoncepcional’’.

Entretanto, dependendo de como o organismo de uma mulher se relaciona com os hormônios de determinada pílula, ela explica que diversos efeitos colaterais podem ser provocados nas usuárias como acne, dor de cabeça, náuseas, aumento de peso, entre outros.

Gabriela Costa começou a fazer o uso da pílula contraceptiva quando tinha 15 anos de idade e manteve o uso até os 17 anos. Depois de passar por vários comprimidos e meios diferentes do anticoncepcional, descobriu após uma série de exames e devido ao acompanhamento médico, que nenhum era compatível com ela.

“Eu passei por vários anticoncepcionais porque todos me davam uma reação muito ruim. Tomei Elane 28, Yasmim, esses que são mais conhecidos, e nenhum dava certo comigo. Todos me davam enxaqueca, náusea, vômito. Ficava insuportável mesmo”.

Efeitos colaterais

Após dez dias seguidos tomando o medicamento os sintomas começaram e persistiram e só cessavam quando Gabriela parava completamente o uso do medicamento. Após certo período de acompanhamento médico, ela descobriu que nenhum tipo de anticoncepcional funcionava com ela.

“Eu descobri isso indo à ginecologista. A gente foi tentando vários métodos, até que a gente descobriu que meu corpo não reage bem a anticoncepcional. Nenhum, seja o adesivo, seja a injeção, seja o comprimido ele não reage bem. Pra mim especificamente o método contraceptivo ideal é o DIU, que não tem essa liberação de hormônio tão forte, tanta química, quanto o anticoncepcional tem”.

Por conta dos anticoncepcionais, a jovem sentia fortes enxaquecas que não lhe permitiam dormir, além de náuseas muito frequentes. Tinha enxaquecas muito fortes, de chorar. E vômito, sempre tinha muita crise de vômito. Quanto mais forte o anticoncepcional, parecia que mais eu vomitava ou ficava sem apetite”. Apesar de todos os efeitos colaterais, a ginecologista de Gabriela não lhe receitou nenhum tratamento específico, apenas suspendeu o medicamento e passou um remédio para enjoo.

“Eu estava meio que tratando só os sintomas que o remédio estava me causando. Tomava remédio para enxaqueca e remédio para enjoo. Mas aí a gente decidiu parar porque vimos que estava fazendo mal para o meu corpo”.

 

Mudança de vida

 

Aos 17 anos, após fazer uma mamografia de rotina, a jornalista descobriu que estava com um nódulo na mama direita. Após a descoberta, Gabriela, que já possuía histórico de câncer de mama na família, passou por uma série de exames para descobrir se era benigno ou maligno. Em seguida, mesmo com o resultado negativo para malignidade, Gabriela passou pelo processo de retirada do nódulo, uma vez que o mesmo apresentava chances de se desenvolver.

“Era benigno, ainda bem. Eu fiz a cirurgia e retirei. E aí a minha própria ginecologista falou que provavelmente o que estimulou a crescer esse nódulo, além do fato de eu já ter esse histórico na família, foi o anticoncepcional, porque ele que alimenta, digamos assim, o nódulo. Então além de tudo que eu sentia, eu ainda tive um nódulo por causa disso e tive que fazer a cirurgia”.

Ao parar o uso do anticoncepcional, Gabriela substituiu a pílula por outro método contraceptivo, o DIU. Hoje, não sente mais nenhum efeito colateral e vive uma vida muito mais tranquila.

“Para mim foi ótimo, porque ele continua sendo um método muito eficaz, tão eficaz quanto o anticoncepcional e que não me dá nenhuma reação, não deixa meu corpo debilitado de nenhum jeito, não me fez passar mal nem nada. Então para mim foi melhor, foi tipo, muito mais qualidade de vida”.

Com uma história diferente, Marina Araújo, estudante de psicologia, tem um longo histórico de trombose na família e, por conta disto, não foi autorizada por sua ginecologista a fazer uso do anticoncepcional.

“Tenho dois tios que já tiveram trombose e meu avô também, todas minhas tias e minha mãe possuem varizes e já passaram por diversos procedimentos para o tratamento”.

Arquivo pessoal

 

A estudante precisou fazer uso do anticoncepcional como método contraceptivo, porém, descobriu em consulta ginecológica, que não pode fazer uso da medicação.

“Então, eu descobri que não podia fazer uso de anticoncepcional aos 17 anos quando fui em uma ginecologista e contei sobre o histórico da minha família de trombose”.

Marina precisou, então, substituir o método contraceptivo e acabou optando por indicação médica  pelo DIU. O uso do DIU nunca interferiu em sua vida nem ocasionou nenhum problema que a prejudicasse. Hoje, ela se sente muito mais segura, sem dúvidas nem medos, devido à instrução médica e por saber que utiliza um método que não prejudica a sua saúde.

Eu me adaptei muito bem ao uso do DIU, me sinto segura e acho que fiz uma boa escolha”.

Dores fortes

 

Arquivo pessoal

Maryane Rodrigues, de 48 anos, empresária do ramo de confeitaria, também teve problemas com o anticoncepcional, porém seu caso foi um pouco diferente. A empresária estava passando por um problema de miomas no útero, ao buscar a ginecologista está lhe receitou o uso do anticoncepcional Diane 35 para diminuir o fluxo e as cólicas. Maryane, porém, já havia feito uso do anticoncepcional quando jovem e sentia fortes dores de cabeça com o medicamento, portanto, resolveu não utilizá-lo.

Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o câncer de útero é o terceiro tumor mais frequente na população feminina e está em quarto lugar na causa de mortes de mulheres por conta do câncer no Brasil. A estimativa mostra que até o primeiro semestre de 2018, 16.370 mulheres já foram diagnosticadas com o câncer. Outra patologia que pode afetar o útero é a endometriose, doença que ocorre quando o tecido que envolve o útero começa a se desenvolver fora do órgão. De acordo com a Associação Brasileira de Endometriose, de 10% a 15% das mulheres em idade reprodutiva podem desenvolver o distúrbio.

No início de 2013, ao fazer uma ecografia de rotina, Maryane Rodrigues descobriu que estava com dois miomas intra uterinos pequenos, mas que lhe causavam muitas cólicas e forte fluxo menstrual. Ainda nesta ecografia, foi identificada também uma mancha escura no útero muito semelhante à endometriose e a médica do exame lhe recomendou procurar um especialista. Porém, mesmo com as fortes dores que Maryane sentia, a ginecologista da empresária não acusou nada além dos miomas.

“[A médica] não me passou nenhum remédio para parar a menstruação e nem outra coisa. Passou um tempo, uns três, quatro meses depois, e eu continuava sentindo muitas dores e o fluxo menstrual estava aumentando”. Ela recorda  que a médica pediu outros exames que indicaram outro mioma menor. “Eram miomas intra uterinos, mas não eram miomas malignos. Ela disse que é da idade, que acontece, pode aparecer e pelo fato da minha mãe já ter tido mioma isso é uma coisa genética”.

Apesar do resultado do exame, a então ginecologista de Maryane apenas lhe receitou uma medicação para as cólicas e pediu para que mantivesse o acompanhamento. Maryane, porém, devido às fortes dores que não cessavam, procurou por outros médicos em busca de descobrir o que realmente tinha.

Descoberta

Apenas em maio de 2015, após uma indicação de uma amiga, Maryane encontrou uma clínica que possuía um especialista em endometriose. No mesmo mês, ela fez uma consulta com o médico e, ao avaliar sua ecografia de 2013, ele constatou que a empresária já tinha indícios de endometriose naquela época. O médico ainda estranhou que nenhuma ginecologista havia lhe indicado um tratamento para parar a menstruação como, por exemplo, o DIU.

Ainda nesta consulta, seu médico constatou que realmente havia endometriose e que o caso era cirúrgico. Ele, então, solicitou que a empresária fizesse um exame de imagem com uma especialista para ter a convicção de quais eram os pontos de cirurgia.“No exame ela constatou que havia endometriose no útero, nas trompas, na bexiga, no final do intestino e um pouco nos ovários”. Após o laudo do exame de imagem, o médico solicitou exames pré-operatórios para, em seguida, marcar a data da cirurgia.

A empresária possuía sangramento tão intenso que chegou a ter hemorragia. Ela utilizava absorventes noturnos durante o dia e sentia muita fraqueza. Devido à perda de sangue que teve, Maryane descobriu nos exames pré-operatórios que estava anêmica e não foi autorizada a fazer a cirurgia.

“A cardiologista orientou que eu voltasse ao ginecologista e pedisse que ele solicitasse junto ao plano de saúde a medicação, que tinha que ser via venosa, para eu poder ficar boa dessa anemia e, assim, realizar a cirurgia. A cardiologista disse que se eu não fizesse esse tratamento, eu poderia precisar de transfusão de sangue durante a cirurgia”.

Tratamento

Após realizar alguns exames, Maryane ainda precisava fazer o tratamento para a anemia, porém o plano de saúde não autorizou. Em seguida, seu médico escreveu e enviou um relatório ao plano justificando a necessidade do tratamento.

“Eu tinha que tomar umas injeções, tive que tomar doze injeções para poder fazer a cirurgia, em dias alternados, porque eu estava em um nível muito crítico de anemia”.

Após o plano liberar o tratamento injetável de ferro, que custava mais de R$3.000,00, Maryane novamente teve problemas com o convênio, dessa vez em relação à sua cirurgia. Sem receber autorização para realizar o procedimento, que custava R$25.000,00, a empresária recorreu à defensoria pública. Após ordem judicial, o convênio autorizou o procedimento e a cirurgia foi marcada para o mês de outubro.

“Eles obrigaram o plano de saúde a fazer a minha cirurgia. Mandaram a intimação para o hospital dizendo que eles tinham que fazer no prazo de 48 horas e, caso isso não fosse feito, eles tinham que pagar uma multa de 60 mil reais e, por dia, mais R$ 10 mil. O plano autorizou [a cirurgia], mas não o material cirúrgico que o médico exigiu. Aí, eu recorri novamente à defensoria e, de imediato o plano liberou. Eu sei que o plano pagou mais de R$ 80 mil em multas para eu fazer uma cirurgia que era 25 mil”.

Recuperação

“Em revisão após a cirurgia, o médico pediu uma nova ecografia e detectou que não tinha ficado nada, não tinha ficado nenhum resquício de endometriose e que os ovários estavam perfeitamente preservados. Por isso, não havia necessidade de reposição hormonal”.

Para a recuperação da cirurgia de suspensão de bexiga, foram necessárias 40 sessões de fisioterapia pélvica, em 2016, que duraram aproximadamente seis meses. Já a recuperação da extração de nove centímetros do final do intestino, foi mais complicada. Maryane sentiu muitas dores no início e precisou fazer dieta com alimentos mais fibrosos. Ainda hoje, ela faz uso de medicação para regular o funcionamento intestinal.

A restauração pós-cirúrgica da retirada do útero e trompas durou em torno de um a dois meses. No início, ela sentia muitas dores na região pélvica, mas, atualmente, ela se demonstra feliz em não sentir mais cólicas nem desconfortos na região lombar. “A melhor coisa que eu fiz foi retirar o útero, porque as dores que eu sentia eram dores que me esgotavam física e mentalmente. Hoje, o útero não me faz falta, levo uma vida normal”.

Recomendação

Dores na parte abdominal no corpo feminino são algo comum na vida de muitas mulheres brasileiras, muitas vezes derivadas da cólica menstrual. No período de ovulação também é normal a presença do sangramento vaginal, mas em alguns casos é importante ficar atenta se às dores e o sangramento não estão mais fortes que o comum.

A ginecologista, Natalia Paes Barbosa, explica que a patologia mais comum no útero é a causada pelo HPV. E recomenda que anualmente todas as mulheres façam o papanicolau, exame que previne o câncer de colo uterino, para que dessa maneira a doença possa ser tratada precocemente antes de se agravar e se tornar um câncer. Também recomenda que as mulheres sempre fiquem atentas a qualquer sinal que saia do comum.

“A gente tem outras patologias uterinas comuns que podem ser pólipos, podem ser miomas, que são patologias benignas que muitas mulheres vão apresentar ao longo da vida. Mas essas não tem como a gente fazer prevenção e dizer ‘’olha fazendo isso ou aquilo você vai ter uma incidência menor dessa patologia’’. Uma vez elas instaladas a gente tem vários tipos de tratamentos, conservadores na maioria das vezes, para que aquele útero continue lá com aquela paciente intacto e a gente não tenha nenhum outro problema’’.

Ela ainda repassa uma última recomendação sobre o anticoncepcional.

“O medo atual, quando vocês [mulheres] procuram a gente, é em relação aos efeitos cardiovasculares dos anticoncepcionais. Então uma mulher hoje que não usa nada, ela tem um risco de ter trombose. Esse risco é muito pequeno e quando a gente associa o anticoncepcional, seja ele de qualquer uma das vias desde que ele tenha o estrogênio, esse risco de trombose aumente em 5 a 10 vezes. Mas mesmo assim ele ainda é muito baixo. Então não está contraindicado o uso do anticoncepcional com estrogênio nas mulheres simplesmente por terem medo dos riscos cardiovasculares. O mais importante é fazer uma história clínica para definir os fatores de risco e escolher o melhor método para essa paciente’’.

Por Malu Burlamaqui.

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