Meninas têm mais obrigações em casa do que meninos, mostra pesquisa

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Levantamento realizado pela Plan International Brasil, com 1771 meninas de 6 a 14 anos, mostra contrastes desde a infância.

Fernanda Domingues tem 12 anos e é moradora de Santa Maria, a 26 km do centro de Brasília. Ela não tem irmãos, mas percebe, entre os colegas, que o tratamento dado a meninos e meninas é diferente. “Eu lavo vasilhas, arrumo o quarto e a casa. Meus amigos, não. Quando eu quero sair, primeiro tenho as minhas obrigações, mas eles passam o dia inteiro na rua jogando e soltando pipa independente disso”. A percepção de de Fernanda está conectada com o resultado de um levantamento realizado  pela Plan International Brasil, com 1771 meninas de 6 a 14 anos em todas as cinco regiões do país. A pesquisa mostra que as tarefas domésticas e a obrigação de amadurecer mais cedo são implementadas de formas bem diferentes para meninos e meninas.

Gráfico retirado da pesquisa “Por ser menina”, da Plan International Brasil

Para Fernanda, as atividades deveriam ser iguais para todos os gêneros. “A mulher já tem que casar sabendo de tudo quando a única obrigação do homem é trabalhar fora. Da mesma forma que as mulheres comem, tomam banho e se vestem, os homens fazem isso. Então, eles deveriam aprender,” argumenta.

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Assim como Fernanda, o estudo também mostrou insatisfações gerais em relação ao período para descontrair. Cerca de 31,7% das meninas informaram que o tempo para brincar, direito fundamental de todas as crianças, é insuficiente. Essa insatisfação também reflete em outro número: cerca de 9,6% das entrevistadas não se sente feliz por ser menina — um número 7,3% maior entre as crianças e adolescentes de escola pública do que em relação às de escolas particulares.

Para a psicóloga Rosângela Medeiros, a cobrança em cima de meninas as obriga a amadurecer mais cedo, causando uma piora no rendimento por atividades que devem ser limitadas. “Essas tarefas e responsabilidades colocadas em excesso contribuem para um amadurecimento antes do tempo. O tempo de infância fica reduzido e essas crianças brincam menos, estudam menos e se dedicam menos à escola. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é muito claro nesta afirmação de que lugar de criança é brincando e na escola. Quando se tornam juvenis, aos poucos, algumas tarefas básicas podem ser atribuídas, mas não todas ”.

Por outro lado, Carmem Alves, de 14 anos e o irmão, de 16, foram criados de forma diferente do que a maioria apontada pelo levantamento Eles moram juntos com os pais no Guará. Para Carmem, a divisão das tarefas domésticas em casa depende do momento. No geral, ela afirma não se sentir encarregada de tarefas que seu irmão não realiza, mas a cobrança emocional ocorre de forma mais intensa. “Às vezes sou eu que lavo a louça e limpo a casa, não acredito que exista nenhuma diferença de tratamento nesse sentido.”

Mas o fato é que o estudo mostrou um contexto de disparidade na realidade da divisão de tarefas domésticas por gênero no Brasil. Enquanto 76,8% das meninas se encarregam de lavar a louça em casa, apenas 12,5% dos seus irmãos homens têm a mesma atividade. A desigualdade também segue em outros itens observados  Enquanto 65,6% das meninas limpam a casa, apenas 11,4% dos seu irmãos realizam a mesma atividade.

As meninas também são responsáveis por realizar atividades como cozinhar, passar a roupa, cuidar dos irmãos e arrumar a cama mais do que seus irmãos homens. Também de acordo com o estudo, cerca de 13,7% das meninas de 6 a 14 anos trabalham ou já trabalharam.

Em relação à obrigação de amadurecer, o ponto de vista de Carmem é diferente. “As vezes me falam para eu aprender as coisas da vida, como arrumar a casa, para quando eu tiver casada ter uma “família feliz”. Eu sinto a obrigação de aprender essas coisas e eu acredito que os meninos da minha idade não têm muitas obrigações como as meninas. As pessoas cobram muito mais das meninas”, acredita.

Até na hora de brincar

A divisão de tarefas também reflete outra realidade: a de divisão de brincadeiras por gênero. No estudo feito, 37,3% das meninas nas escolas públicas rurais e 31% nas escolas urbanas particulares declaram que as pessoas da família ficariam chateadas se quisessem fazer coisas que geralmente os meninos fazem. Apesar disso, mais de metade das entrevistadas (65,5%) discordam da afirmativa que “meninas têm que brincar de boneca e meninos de carrinho” e 82,7% concordam que tanto meninos quanto meninas podem escolher qualquer brincadeira ou atividade esportiva.

Por Marina Torres

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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