O Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode ser identificado por atividades repetitivas, alterações sensoriais, falta de socialização e principalmente ausência ou dificuldade de comunicação. Em Brasília, associações e iniciativas governamentais procuram garantir a qualidade de vida e o desenvolvimento de crianças autistas. Ana Maria Low, médica neurologista infantil, explica que os tratamentos, sejam eles terapêuticos ou esportivos, são de extrema importância para a evolução dos quadros do TEA. “Quanto mais cedo uma criança procura um médico, quanto mais cedo você estimular, melhor a resposta”.
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De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), qualidade de vida é a percepção do indivíduo de “inserção na vida no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Para garantir essa qualidade aos autistas, equipes formadas por Fonoaudiólogo, Terapeuta ocupacional, Psicólogo clínico, Neurologista, Psiquiatra e Pediatra trabalham em conjunto e prescrevem tratamentos base e atividades de acordo com a necessidade de cada criança.
Tablet, celular e televisão passaram a ser aliados dos pais quando o assunto é descontrair as crianças. É comum vê-las com um aparelho ligado na hora do almoço em um shopping, no encontro familiar e até antes de dormir. O que nenhuma das famílias espera é que esse meio fácil de distrair e quietar os pequenos pode acelerar o diagnóstico.
No Brasil, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgado em fevereiro de 2018, cerca de 31.377 mil domicílios contam com um tablet e 46.735 mil casa com um telefone celular. Além dos dispositivos móveis, os aparelhos televisivos estão presentes em 67.375 mil lares, representando cerca de 102.633 mil unidades.
A neurologista Ana Low trabalha há 45 anos na área, e aponta que estudos recentes comprovaram a influência do meio para a identificação do autismo. “Os pais falam ‘nossa mas ela até falava mamãe e papai, brincava e de repente se isolou’. Na verdade a gente sabe que a criança nasce autista, mas as condições ambientais fazem com que aflore, de uma forma mais exuberante”, explica.
As influências às quais a neurologista se refere devem-se, em boa parte, à tecnologia. “Atualmente crianças de 3 anos dominam um celular”, aponta. Como médica, ela orienta para a redução do consumo de mídia pelas crianças. “A primeira coisa que peço e proíbo são menos horas na frente do desenho animado, porque eles imitam as falas, querem ver as mesmas cenas e os pais acham que o sossego é dar um celular. Ali a criança fica naquela coisa que não tem outro estímulo, é visual e repetitivo”.” É difícil ver os pais brincarem no chão com o filho”, critica.
A Galinha Pintadinha, uma das animações mais conhecidas no Brasil, teve seu primeiro vídeo postado no YouTube há 12 anos, em 2006. Hoje, com mais de 14 milhões de inscritos, conta com 47 vídeos. O mais visto, “Pintinho Amarelinho”, supera 620 milhões de visualizações. É sobre esse tipo de conteúdo que a médica chama a atenção dos pais. “Esses estímulos são facilitadores, não digo que são responsáveis, mas desencadeiam o transtorno. No momento em que você restringe, eles passam a olhar em volta, perceber mais o mundo”.
“O mundo inteiro está cheio de autistas”
Ana Low
A médica relaciona o TEA a um arco-íris: de um lado, o Autismo Clássico, e do outro, o Autismo de Alto Rendimento. Segundo ela, quanto mais estímulos forem dados à criança por terapias, psicopedagogia ou atividades físicas, maior é a chance de minimizar as características autistas, como a falta de socialização. “Não é que ela vai sair do espectro, não existe um remédio, não existe uma mágica para sair do espectro, mas existem situações que melhoram o quadro”.
Equoterapia, terapia ocupacional, fonoterapia, psicomotricidade, porque eles são desajeitados, e a natação são as atividades mais indicadas. O esporte aquático é um dos melhores porque trabalha a musculatura dos membros inferiores e posteriores, respiração, concentração e toque.
A Associação Nascional de Equoterapia (ANDE), em Brasília, presta tratamento com cavalos de forma gratuita. Confira no vídeo abaixo como a equoterapia tem ajudado os autistas praticantes.
Segundo um levantamento da Secretaria de Saúde para a Revista Esquina, os 12 Centros Olímpicos e Paralímpicos do Distrito Federal-DF, somam juntos cerca de 19 mil alunos, sendo 626 deles portadores de alguma deficiência e 177 autistas. Um dos centros com maior número de crianças diagnosticadas com TEA é o do Setor O, na região administrativa de Ceilândia.
É lá que Caio, 9 anos, faz natação. De acordo com o pai, Adalberto de Souza, 39, foi pela prática que o filho ficou mais calmo e menos ansioso. “O esporte mudou demais a vida dele, no sentido de equilíbrio, comportamento. Tem sido muito importante”, relata.
Caio nada toda semana na piscina do Centro Olímpico do Setor O — Foto: Giovana Marques
O garoto tinha problemas respiratórios, ataques alérgicos e problemas com sono. Os pais não se contentaram em vê-lo daquela forma. Ambos diminuíram os compromissos para focar mais na saúde de Caio. “No início a gente passou por uma situação muito difícil. O autista é uma pessoa especial, ele requer muito dos pais. Ele estava tendo uma regressão muito grande na escola, então a gente optou por perder uma boa parte do nosso orçamento para cuidar dele”, relembra.
Adalberto acompanha de perto o progresso do filho — Foto: Giovana Marques
Com mais tempo, o pai acompanha Caio na prática aquática. Por lei, é necessário que um responsável espere dentro do complexo poliesportivo. Do outro lado da grade, no concreto, Adalberto fica em pé ou sentado numa mureta, sempre de olho. Ele carrega uma sacola laranja com toalha e roupa seca. De touca e óculos, dentro d’água, Caio vai de um lado para o outro na piscina. O pai espera orgulhoso, à beira da piscina: “Ele já sabe nadar. Já ganhou até medalha, isso tem sido um incentivo muito bom. Está tendo um pouco de dificuldade no aprendizado em grupo, mas fora isso, tem melhorado bastante”.
Por Giovana Marques