Artesãos na Feira da Torre de TV criam alternativas para sobreviver

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A artesã Blanca Rosa Hanusz, de 64 anos, trabalha com jatos de areia para caimento em vidros desde 1992. Uruguaia, ela radicou-se em Brasília há 30 anos. Foi nessa ocasião que começou a se interessar por aprender e produzir vidros decorados, e assim garantir o sustento . “O artesanato é algo que une as pessoas. Por isso que desenvolvi essa técnica, para me comunicar”, conta. Blanca é alfaiate por formação técnica e lembra que já teve 11 funcionários que trabalhavam para ela. Hoje, mantém a banquinha apenas com a ajuda do marido. As dificuldades de manter negócios próprios podem fazer parte das explicações para que o Distrito Federal tenha o menor percentual, entre todas as unidades federativas (20,4%), de trabalhadores autônomos. Confira aqui a pesquisa.

Assista abaixo ao vídeo da entrevista com a artesã:

 

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) mostrou na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) contínua que entre a média de 91,8 milhões de pessoas ocupadas, apenas 25,4% trabalham por conta própria. Os dados apontam que que estados como Pará (35,1%), Maranhão (34%) e Amazonas (33,2%) são os que possuem maior número de pessoas nessa situação.

Confira gráfico por unidade da federação

No caso de Blanca, as principais reclamações têm relação com falta de incentivo e apoio para a micro-empresas. Ela lembra que profissionais do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), por exemplo, visitavam os estandes para oferecer ajuda e cursos. “Nós não temos nenhum tipo de incentivo, Brasília não oferece a matéria-prima necessária e isso dificulta nossa venda”, queixa-se. A artesã se orgulha de ter peças espalhadas pelo mundo por conta dos visitantes que compram os materiais que ela produz. Os trabalhos vão desde um copinho para pinga a vidros decorados de forma mais sofisticada.

A Feira da Torre passou por obras de melhorias há seis anos, mas os comerciantes se queixam que os custos aumentaram Artesãos entrevistados explicam que trabalham de terça a domingo o dia inteiro.. O economista Roberto Piscitelli, professor de finanças públicas, explica que alguns dos motivos para os brasilienses não ter interesse no negócio autônomo, são a grande demanda por serviço público e a falta de preparo daqueles que pretendem empreender. “Brasília abriga muitos servidores públicos. De maneira otimista, isso minimiza o número de empreendedores. Pensando de maneira pessimista, aqueles desempregados não têm o preparo suficiente para saber investir e se manter no mercado por muito tempo”, explica.
O especialista comenta que faltam incentivo e interesse, tanto das instituições, como o Sebrae, que podem preparar quem quer empreender quanto daqueles que procuram por algo do tipo. De acordo com ele, mesmo com todos os empecilhos encontrados no meio do caminho, é possível ser um empreendedor de sucesso na capital. O Sebrae foi questionado, mas não respondeu as perguntas para esta reportagem.

Experiências
A artesã Divina da Penha Roque, 53 anos, trabalha com artesanato há 30 anos, tem uma lojinha de artigos de crochê e conta que ultimamente pensa em desistir. “Está difícil vender. O Brasil todo está com problema financeiro, se não tem reajuste nos salários, não temos público para comprar nossas mercadorias (…) A gente precisa de pequenas coisas aqui na feira, mas está tudo engavetado. Falta incentivo!”.
Divina conta que, para chamar a atenção dos clientes e conseguir vender, tenta inovar no crochê e na exposição dos materiais. Ela vende produtos como tapetes e toalhas. “O cliente tem que chegar e comprar pelos olhos, pela beleza dos produtos”.

Vale à pena continuar?

Por outro lado, há artesãos que não veem a desistência como uma opção. Heraldo Rogério de Andrade, 62 anos, produz brinquedos em madeira desde 1979. Mesmo com a dificuldade para vender, nunca pensou em desistir. “Eu estou sempre mudando. Quem é artesão não foge da raiz. A gente pode mudar nosso trabalho, mas não a nossa essência”. Ele explica que esse trabalho cria envolvimento a partir do dom do profissional. Dono de uma lojinha na feira, ele considera que a ajuda de alguém capacitado seria necessária na produção mas, por enquanto, os custos para contratar impedem essa medida.
Próxima a Heraldo está a loja de Maria das Graças, 66. Ela é artesã há 35 anos. Faz peças em barro há 28 anos e também nunca pensou em parar de criar enfeites e objetos de decoração. Uma das saídas que encontrou foi revender algumas peças de conhecidos para aumentar a variedade de objetos ofertados na loja. Maria garante que consegue se manter bem por fazer produtos diferentes do usual. “Hoje eu trabalho com meu marido. Artesão que é artesão tem que surpreender. Já tem muita gente que revende peças iguais, muitos camelôs”, explica.

Em frente à loja de Maria das Graças, está o comércio de Rosi Piáu, de 46 anos. Ela trabalha com artesanato desde 1992. Ela produz artigos para festas infantis, além de lembrancinhas de Brasília para os turistas que visitam a Feira da Torre. “Apesar da carga tributária ser muito alta, nunca pensei em parar de empreender, a minha liberdade ninguém tira!”, conta. Trabalhadora por conta própria, Rosi não tem funcionários e produz tudo sozinha. Hoje em dia consegue se manter através das vendas na Feira e encomendas por fora.
“Eu vivo disso. Comecei fazendo peças para uma amiga e nunca mais consegui parar”, relembra. Ela explica que tudo o que entra e sai das vendas, além de ajudar em casa, é revertido em material, tornando um pouco mais fácil se manter no mercado com matéria-prima para seus produtos. “Meu prazer é comprar coisas para artesanato. É um investimento”, ressalta.

Formado em magistério e paisagismo, Jaime Miranda, 50, largou as profissões originais há 30 anos para investir no artesanato. Hoje produz artigos como fontes e objetos de decoração. De acordo com o artesão, o trabalho manual sempre foi uma paixão. Mesmo com todas as dificuldades que encontra no meio do caminho, não pensa em largar a atual profissão.
“Falta fiscalização, muita gente não paga impostos, não faz artesanato, e isso complica as nossas vendas. Ainda assim, não paro de trabalhar com isso porque me identifiquei, gosto do que faço”. Hoje, trabalhando sozinho, acredita que é necessário contratar mais alguém para colaborar com a produção mas os encargos para contratação vetam o processo. “Você se vê prejudicado, porque contratar alguém pode gerar muito mais custos para você, não dando o lucro que eu consigo sozinho”.

Por Aline Rocha (texto e fotos)

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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