Unidades terapêuticas religiosas representam retrocesso na luta antimanicomial, afirma escritora

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O tratamento de pacientes com transtornos mentais, promovido pelas unidades terapêuticas coordenadas por entidades religiosas, não está de acordo com a reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. É o que afirma a escritora e jornalista, Daniela Arbex, em palestra na 3ª Bienal do Livro e da Leitura de Brasília. Ela escreveu o livro “Holocausto Brasileiro”, sobre as violações de um manicômio em Barbacena (MG) principalmente durante a ditadura militar.

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As controvérsias entre a proposta psicossocial e o tratamento com base religiosa são muitas. Nesse tipo de unidade, é comum apenas a presença de religiosos, pastores ou obreiros. É possível observar que existem poucos ou nenhum profissional de saúde, como médicos especializados, psicólogos e enfermeiros. A autora questiona a assistência ofertada nesses recintos que, de acordo com ela, em sua maioria funcionam como “mini manicômio”. Daniela afirma que nesse tipo de local, a maioria das internações é feita de forma compulsória e o tratamento oferecido é questionável. “Com isso, estamos correndo o risco de ver a realidade de modelos desumanizados novamente”, afirma.

O poder da “indústria da loucura”, que é caracterizada por unidades que visam apenas o lucro ao invés do tratamento dos pacientes, deve ser combatido. A jornalista diz que participa efetivamente desse tipo de trabalho: “Na minha cidade, conseguimos fechar todos os sete locais de atendimento psiquiátrico que trabalhavam com esse modelo desumanizado”.

Tratamento adequado

Daniela reitera que o paciente em crise mental deve ser tratado em hospitais gerais, da mesma forma que pacientes com outras enfermidades são cuidados: “Nós precisamos agir conforme o que diz a lei: o paciente em crise deve ser levado para um hospital geral. Quando um cardíaco ou diabético tem algum problema, ele vai para o hospital geral. Ele não é excluído da sociedade e isolado em um local específico”. O correto seria um atendimento que englobasse a saúde geral de um indivíduo, não apenas o tratamento específico do transtorno. O movimento da Luta Antimanicomial luta justamente por esse direito, ao defender que pessoas com algum tipo de sofrimento mental não devem ser isoladas e submetidas a tratamentos desumanos.

É necessária fiscalização e vigilância constante voltada para os serviços substitutivos aos hospitais psiquiátricos. A escritora diz que as residências terapêuticas coordenadas por profissionais especializados são os modelos mais bem sucedidos de tratamento. Ainda de acordo com ela, os CAP’s (Centros de Atenção Psicossocial) são repletos de problemas, sofrem com falta de equipe e estrutura e não são uma boa alternativa.

Holocausto brasileiro

Daniela Arbex é autora do premiado livro-reportagem “Holocausto brasileiro”, que conta a história do maior hospício do Brasil, fundado em 1903 e localizado em Barbacena, Minas Gerais. No local, conhecido como Hospital Colônia, cerca de 60 mil pessoas entre homens, mulheres e crianças, morreram de torturas, eletro choques, fome e frio. Cerca de 70% dos pacientes não possuíam o diagnóstico de doença mental: eram negros, homossexuais, prostitutas, militantes políticos e até mesmo meninas que haviam perdido a virgindade antes do casamento. A história promove uma reflexão sobre as questões relacionadas ao tratamento dado aos pacientes psiquiátricos no Brasil. Ainda segundo a autora, mesmo caminhando a passos lentos, já é possível observar uma mudança no país ao se tratar do assunto.

Texto e imagem por Laylla Nepomuceno

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