Basta ligar a televisão, o computador ou o celular. Mesmo em um trajeto curto de carro… Se o rádio tiver ligado, surgem perguntas difíceis de serem respondidas. Como caiu o avião que transportava o time da Chapecoense e matou 71 pessoas? Por que as crianças na Síria estão morrendo e ninguém resolve a guerra? Como aconteceu a tragédia no bairro? Por que morreu a pessoa da família? Histórias das mais próximas ou as distantes… Explicar para crianças sobre perdas não é simples, mas, segundo especialistas, é necessário ser cuidadoso para não mentir. Dependendo da forma como essas situações são tratadas com as crianças, é possível gerar consequências negativas como dificuldade de aprendizado na escola, retrocesso social e até acessos de raiva.
A psicóloga e especialista em luto infantil Karina Rocha acredita que a morte ainda é tratada como tabu cultural e social e erro dos pais é pensar que, por conta disso, a criança não entende nada do que se passa. Para a profissional, a melhor forma de evitar qualquer problema futuro, é educar os jovens sobre a perda. “Os processos de perda são educativos, e às vezes até necessários. A morte vem pra nos mostrar que não somos imortais. Crianças que não são preparadas para perder, não são educadas para se transformar”, completa Karina.
Como conversar com a criança?
O momento da notícia de uma morte familiar é bastante delicado, principalmente quando o ouvinte da mensagem é uma criança. Apesar de depender da idade de quem vai receber essa mensagem, a conversa é necessária. Para a psicóloga Priscila de Oliveira, a forma de explicar a situação deve ser de forma mais lúdica, de forma a educar e proteger a criança. Já Karina Rocha entende que é preferível uma conversa mais direta. “Eu não gosto dessa coisa de ‘fulano virou estrelinha no céu’ porque ela pode passar a vida inteira procurando ou esperando essa estrelinha voltar”.
Consequências da falta de conversa
A falta de diálogo sobre o assunto pode desenvolver diversos sintomas na crianças, devido a sintomatização dos sentimentos. O principal caso é o retrocesso comportamental. “Uma paciente perdeu a mãe e o pai em um acidente, e por não saber como contar para os irmãos mais novos ela começou a ter comportamentos mais regredidos, como fazer ‘cocô na calça’ e dificuldade de aprendizado”, explica Priscila.
Luto Infantil
Além da conversa, as psicólogas concordam que a criança deve possuir o direito de vivenciar o período de luto. Para Karina, a melhor maneira de ajudar uma criança em processo de enfrentamento da dor é auxiliar no alivio da perda física. Proibir mencionar o nome ou falar sobre a pessoa piora a vivência da dor da criança. “Se criança quiser olhar foto, mostre para ela. Conte histórias da pessoa, fale dela, para que ela não se perca na memória. O saudável, no luto, é se permitir sentir”, completa a psicóloga.
Karina detalha que, dos 2 aos 5 anos, a criança consegue entender que a pessoa se foi, mas que deve voltar. Ela não entende que ele deixou de existir. Dos 5 aos 7 anos, a criança já entende que aquele objeto foi perdido e que esse objeto de amor não volta mais. “A criança de 5 a 7, de 7 a 10, à medida que tem um entendimento maior, percebe mais as coisas. O luto dela é uma coisa extremamente pesada, é muito sofrimento. Em luto, ela entra em um processo de ressignificação”.
Invasão midiática
Apesar de apoiar a conversa sobre tragédias com as crianças, caso elas perguntem, Priscila acredita que não se deve deixar as crianças irem pra mídia por elas vivenciarem as situações com muita intensidade. Assistir a uma reportagem sobre a tragédia pode impressionar de forma negativa a criança. “Essa exposição que a mídia faz da tragédia é prejudicial. Teve repórter que entrou no velório, isso é uma exposição da vida privada e causa um sofrimento familiar muito grande”.
Por Beatriz Castilho e Isabella Cavalcante
Foto: Pixabay