Projeto mapeia casos de censura à mídia no Brasil desde 2002

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Processos judiciais que retiram matérias jornalísticas do ar ou impedem a mídia de abordar determinado assunto não se restringem ao recente caso da Folha de São Paulo e do jornal O globo. A liminar concedida pelo juiz Hilmar Castelo Branco Raposo Filho, da 21ª vara cível, que determinou a retirada de publicação desses veículos do ar e os impediu de falar sobre tentativa de extorsão sofrida pela primeira dama, Marcela Temer, é apenas um dos 2.552 casos registrados pelo projeto Ctrl + X, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), que mapeia processos judiciais contra a mídia. “Isso estava aumentando perigosamente e estava trazendo muitos problemas aos jornalistas”, afirma o coordenador do projeto, Tiago Mali.

Em 2016, houve um acréscimo de 30% de ações judiciais contra a mídia em comparação com as eleições de 2012

O Ctrl + X surgiu da preocupação da ABRAJI quanto ao aumento considerável dos processos contra jornalistas e empresas de comunicação que ocorre no Brasil. Hoje, dos 2.552 casos de processos registrados no site, 355 são pedidos de censura prévia e 92 foram deferidos pelos juízes. Esses dados são levantados a partir de uma ferramenta de raspagem de dados em parceria com o PARSEHUB, uma plataforma autodidática que coleta dados da web. “Esse sistema tem sido muito eficiente e estamos encontrando muitas ações que pedem retiradas de matérias”, afirma.

No primeiro momento, o projeto tinha o objetivo de arquivar apenas os casos judiciais abertos nas eleições de 2014, porém, com o crescimento do projeto e da necessidade do trabalho, eles começaram a monitorar todos os casos de censura à mídia. Segundo Mali, o objetivo do projeto é dar visibilidade aos diversos casos de censura que ocorrem por meio de processos judiciais nos dias de hoje. “O nosso objetivo é que a sociedade possa olhar com mais clareza para esse problema e que a gente possa discutir melhor esse aumento que foi verificado”, explica.

“O Ctrl + X é a nossa resposta enquanto associação de jornalistas para esse problema”, explica o coordenador. Para ele, a melhor ação que os jornalistas podem tomar é expor os partidos políticos e os atores que mais praticam essas ações para colocar em pauta a discussão da liberdade de expressão.

A partir do fim da ditadura militar, com a chegada da constituição de 1988, a censura foi oficialmente extinta. Mas, segundo o professor de legislação e ética da Comunicação Eduardo Brito da Cunha, a censura continua acontecendo de forma mascarada por meio de processos judiciais. “Há muitos casos que passam despercebidos por serem decisões judiciais. Muitos nem chegam a ser divulgados”, lamenta o especialista.

Para ele, a melhor forma de os jornalistas se defenderem contra as ações judiciais é recorrer pois, segundo ele, na grande maioria dos casos, a decisão tomada na primeira instância é anulada. “A solução é levar a instâncias superiores”, comentou.

‘Juridicialização’ da política

“A ‘juridicialização’ da política é uma ação conservadora praticada em sociedades como a nossa para se reter o poder”, explica outro especialista em ética e legislação da Comunicação, o professor Sérgio Euclides. Segundo ele, o fenômeno está acontecendo em vários países, inclusive no Brasil. O processo consiste em um tipo de “tapetão” onde o político usa do poder judiciário para reverter alguma situação “desconfortável”, segundo o especialista.  

Euclides conta que o caso que aconteceu recentemente com a Folha e com o Globo é um caso de “juridicialização” da política e o caracteriza como censura já que, segundo o que foi divulgado, a publicação tratava de um assunto que envolvia o atual presidente da república, Michel Temer. “Depois veio a público a informação de que os conteúdos desse celular não eram de natureza privada, mas sim, diriam respeito à vida do esposo da Marcela Temer (Michel Temer) como homem público. É com base nessa informação que eu justifico que isso é censura indevida e inconstitucional”, explica o professor.

 

Bruno Santa Rita

Sob supervisão de Katrine Boaventura e Luiz Claudio Ferreira

Foto: Marcos Santos/USP Imagens

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