Pesquisadores condenam coletiva de interventor no RJ que teve “seleção de perguntas” de jornalistas

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Jornalistas e pesquisadores na área da comunicação chamaram de “censura” os procedimentos adotados pela equipe de comunicação do Comando Militar do Leste na coletiva do interventor na segurança pública do Rio Janeiro, general Walter Braga Netto. A conferência foi realizada  nesta semana (terça,27). Segundo os pesquisadores, a atitude de escolher as perguntas que seriam respondidas pelo interventor e os ministros presentes, fere o direito à liberdade de imprensa e é um ato de restrição prévia, vedado pelo artigo 5º da Constituição Federal.

A conduta dos militares de avaliar e escolher as perguntas que seriam feitas aos entrevistados provocou críticas  dos especialistas. Para o professor Luiz Martins, da Universidade de Brasília (UnB), em hipótese alguma, se pode pedir a jornalistas a antecipação de perguntas que serão feitas. “A conduta de submissão de conteúdo prévio a uma autoridade é censura e é inconstitucional”, explica.

O professor de comunicação Sérgio Euclides Souza, do Centro Universitário de Brasília, tem uma visão similar e defende que a geração atual está sendo exposta a um tipo de comportamento que existiu no Brasil há décadas atrás. “A posição do interventor e de seus auxiliares foi uma atitude autoritária que reflete muito bem o espírito antidemocrático que tem estado em nossas instituições desde sempre”. Ele também lamenta a conduta dos jornalistas presentes. “Faltou coragem, né?”.

Perguntas por escrito

Ao chegarem à coletiva, os jornalistas foram informados de que as perguntas teriam de ser escritas. O professor Sérgio Souza explicou que a atitude só foi possível porque os jornalistas permitiram que acontecesse. “Pôde ser feito porque os jornalistas se submeteram a regra. Nenhum jornalista precisa fornecer de antemão as perguntas que irão fazer no caso de uma coletiva ou entrevista”.

Segundo Luiz Martins, a atitude de antecipar as perguntas feitas pode ter causado estranhamento em um contexto brasileiro, mas que não considera uma agressão à liberdade de imprensa. No entanto, o pesquisador acredita que pode ser considerado um ato de “descortesia” com os profissionais da notícia. “Eu não estou defendendo a conduta. Não gostei, não achei simpática. Agora, o expediente de um comandante de uma intervenção, ou do papa, ou do presidente, possui limitações dos mais diversos tipos (que interferem no planejamento de uma conferência de imprensa)”.

O professor Nilson Lage, um dos mais respeitados pesquisadores do jornalismo, afirma que a atitude pode ser vista como um procedimento “normal” dos militares e que faz parte do protocolo da Força. Porém, Lage crê que, neste caso específico, os militares agiram desta forma por acreditarem que a imprensa tem disseminado informações exageradas e tentado colocar o Exército contra a população. “Não são bem os jornalistas, mas o problema é a estrutura da (grande) imprensa, que virou um meio de difamação, e de calúnia (…) Essa atitude foi uma contrapartida ao mau jornalismo praticado”, explica o professor.

A presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga, entende que o procedimento de avaliar os questionamentos antecipadamente, fere a liberdade de imprensa. “O entrevistado até tem o direito de se recusar a responder determinada pergunta, mas os organizadores de um coletiva não podem ‘selecionar’ as perguntas que serão respondidas”, afirmou.

A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do Exército e com o Comando Militar do Leste, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.

Por: Lucas Valença

Foto de capa: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira

 

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