Nas salas de aula, mulheres que são mães, donas de casa e trabalhadoras retornam aos estudos

A artesã Maria Pereira, de 58 anos, passou a ter um compromisso todas as tardes que está revolucionando a rotina. Ela voltou a estudar e já chegou ao 1º ano do ensino médio no Centro de Ensino Educacional nº 6 (CED-6), em Taguatinga, no programa da Educação de Jovens e adultos (EJA). O trajeto diário de 15 quilômetros da casa dela, em Samambaia, até o lugar em que estuda se transformou em um encontro com uma nova perspectiva de vida. “Me sinto bem em recuperar os estudos”, ressaltou. Assim como Maria Pereira, o acesso aos estudos se transforma em uma novidade para mulheres que, como ela, tiveram outras prioridades ou foi negado o acesso ao ensino formal. No Distrito Federal, 113 escolas ofertam vagas para EJA.
No caso dela, não conseguiu seguir com as aulas quando era mais jovem porque o pai “não deixava”. Maria casou e teve quatro filhos. “Aprendi mais o português através da palavra de Deus”, destacou a estudante. Hoje, ela afirma que concilia os estudos com atividades domésticas em casa, além do trabalho com artesanato e o curso de língua espanhola.
No CED 6 em Taguatinga, o ensino é ofertado nos turnos vespertino e noturno e atendem cerca de 1,3 mil alunos, sendo 60% mulheres. “Elas são tratadas com muito respeito e carinho. São muito bem acolhidas e a equipe está sempre pronta para atendê-las”, ressaltou o diretor da escola, Rodrigo de Franco.
Nas histórias de alunas ouvidas pela reportagem, os principais fatores que a levaram a não concluir o ensino médio foram o fato de casarem jovens e terem tido filhos. Esse foi o caso da estudante Maria Antônia, 43 anos. Ela se casou aos 15 e teve quatro filhos. Maria Antônia retomou os estudos pela vontade de aprender. “Até para trabalhar como doméstica você sente falta, porque, às vezes, sua patroa sai e pede para você ler alguma coisa ou procurar algum documento”, explicou a dona de casa.
Moradora de Águas Lindas de Goiás (GO), distante 35 km da escola, ela se desloca até Taguatinga para estudar e concilia o cuidado com os filhos e as tarefas de casa. O objetivo dela é fazer uma faculdade de comunicação para dar palestras e conquistar um emprego melhor. “Me sinto realizada, cada dia que venho para a escola me sinto muito feliz”, relatou a estudante.
A professora Sirlandra Carvalho, 34 anos, explicou que na turma em que ministra aulas a maioria dos alunos são mulheres entre 35 e 45 anos. Ela dá aula na Escola Municipal João Gabriel, no Novo Gama (GO), cidade do Entorno do Distrito Federal. Segundo a docente, grande parte delas trabalha como empregadas domésticas e auxiliares de limpeza. “O EJA difere do ensino regular devido ao curto espaço de tempo para trabalhar conteúdos de um ano em um semestre. Não há disponibilidade de recursos, como livros e exercícios voltados para essa forma de educação. Por este motivo, os professores utilizam atividades do ensino regular de forma adaptada”, esclareceu.
Na Escola Municipal João Gabriel os alunos têm palestras sobre saúde, DSTs e cidadania. A opção é diversificar as atividades. Para a turma de jovens e adultos matriculados no ensino fundamental I, professores costumam trabalhar com jogos de palavras para auxiliar na alfabetização. “Levamos atividades mais lúdicas com finalidade pedagógica, pois eles chegam cansados da rotina do dia”, destacou a professora Sirlandra.
No caso de Daniela Costa, 29, inclusive, ela planeja o futuro na área da educação. “Vou fazer pedagogia e com 34 anos estarei formada”, afirmou.. Hoje cuida da casa, estuda e ainda faz o papel de mãe. “Me sinto bem, muito feliz em ter voltado”. Ela está no 3º ano do ensino médio e conclui os estudos em junho de 2018. “Pretendendo voltar aqui na escola como professora para dar o meu exemplo”, destacou.
Por Ana Luísa França
Supervisão de Isa Stacciarini e Luiz Claudio Ferreira