“Atenção passageiros. Aqui quem fala é a comandante da aeronave”. A frase ainda surpreende os viajantes. A voz de mulher e o artigo feminino. O fato é que também nos céus elas já estão à frente. No período de 2015 a 2017, de acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), o número de mulheres pilotando aeronaves cresceu 106%. Mais um marco da representação feminina em profissões que, historicamente, são dominadas por homens. No entanto, esse número ainda é inexpressivo.

Após 35 anos do ingresso de mulheres na Força Aérea Brasileira (FAB), em 1982, as mulheres totalizam 16% do total de profissionais atuantes na FAB, de acordo com o Comando-Geral do Pessoal (COMGEP). A história das mulheres na Força Aérea é marcada por pioneirismos e avanços em que a presença feminina ganhou destaque em diversas áreas da aviação. A Academia da Força Aérea (AFA), por exemplo, abriu sua primeira turma com mulheres aviadoras apenas em 2003.
Em vôos comerciais, as mulheres compõem um número ainda menor na carreira de piloto e copiloto. Segundo dados informados pela LATAM, o total de pilotos atuantes na companhia é de 1.955, dos quais apenas 28 são mulheres. Já a Azul informou que, na companhia, as mulheres na pilotagem totalizam 3% do número de pilotos ativos: são 53 mulheres.
As companhias aéreas GOL e Avianca não responderam às perguntas de quantas mulheres havia nas carreiras de piloto e copiloto, até o momento da publicação dessa reportagem.
Realizando sonhos e quebrando estereótipos
Formada em 2003 pela AFA e parte da primeira turma de aviadoras, a Capitã Carla Borges tornou-se símbolo do pioneirismo feminino em 2016, ao ser a primeira mulher a pilotar o avião presidencial e a chegar à primeira linha da aviação de caça. “Fazer parte do primeiro grupo de mulheres pilotos militares da Força Aérea não foi apenas a realização de um sonho meu, mas a possibilidade de realização do sonho de outras mulheres que sempre quiseram se tornar pilotos, trilhar o caminho que eu e minhas amigas de turma estamos trilhando. Hoje, sendo piloto da aeronave presidencial, tenho certeza que todo esforço e empenho que dediquei na minha carreira mostrou-se reconhecido. É um orgulho muito grande”, declarou a Capitã que acumulou, até o momento, mais de 1,5 mil horas de voo.

Carla deixa um recado às mulheres que também querem seguir a carreira: “Para nunca desistirem de seus sonhos, para se dedicarem com todo o coração àquilo que acreditam. Por vezes, enfrentamos obstáculos que nos parecem intransponíveis, mas basta chegarmos ao topo dessa barreira para vermos o nosso sonho se realizando e termos a certeza de que cada noite em claro, cada período longe de pessoas queridas, valeu a pena. Então, lutem por seus sonhos, sempre!”.
Além da Capitã, a FAB tem também outras histórias de mulheres pioneiras na profissão. Como a Tenente Juliana Santos de Souza que, em sua primeira missão como comandante, realizou um transporte de órgãos de Campo Grande (MS) para a cidade de São Paulo (SP). E também a Tenente Aviadora Vitória Bernal Cavalcanti que, aos 23 anos, entrou para a história da aviação, em 2015, ao ser a primeira mulher a pilotar um helicóptero de ataque. Entre outras que, ao longo do tempo, tem feito parte do grupo de mulheres ativas na aviação.
A pilotagem é também uma alternativa de lazer, como é o caso da comandante Ivânia Breter, formada em 2008 pela Associação de Pilotos de Ultraleve de Brasília (APUB). Ivânia ingressou nesse esporte porque, ao acompanhar o marido piloto em dos seus voos, sentiu que deveria saber o que fazer em um momento de emergência, já que um ultraleve possui apenas dois assentos. “Uma das alternativas foi essa, mas depois foi um ganho porque eu descobri que é maravilhoso. Voar é maravilhoso”, afirma a comandante. ”O dia que eu solei o avião, posso dizer, assim, com toda certeza do mundo, que foi o melhor dia da minha vida. A maior felicidade do mundo: decolar e pousar o avião.”
Além do prazer em voar, Ivânia percebeu na sua formação a disparidade no número de homens e mulheres ativos na pilotagem.”É um prazer que, só passando por isso, que dá para saber. Pelo menos por mim que sou uma mulher e quase não tem mulheres nesse esporte. Durante o tempo que eu estive lá, apenas umas três ou quatro mulheres se aventuraram mas não chegaram a tirar a carteira, creio que só eu”.
Emocionada, a comandante também fala dos desafios e sensações, a fim de incentivar ainda mais mulheres a aderirem à prática.“É um desafio enorme porque quando você está sentada ali sozinha, decolar é fácil: o avião faz sozinho. Mas pousar você tem que saber”.
“É até difícil falar porque fico emocionada. É extremamente prazeroso saber que você consegue pilotar uma máquina que tem não só direção e velocidade tem que controlar também o que você não enxerga: pressão,vento… É maravilhoso!”, resume.
Por Aline Lopes
Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira e de Katrine Tokarski Boaventura