Há quase seis décadas nascia do sonho de Dom Bosco a capital da República. Brasília completa 58 anos com uma pluralidade de público, sotaques e costumes. Em meio aos anos de resistência, estão as antigas lojas da cidade que vencem as adversidades, como a inauguração de shoppings centers, e se mantém ativa nos mesmos lugares. Seja na W3 Sul, avenida que já reuniu os mais famosos carnavais de rua, ou no Núcleo Bandeirante, primeira região consolidada do Distrito Federal, empreendedores compartilham histórias de perseverança e coragem diante das dificuldades.
A primeira loja de artigos diversos da capital foi a “Pioneira da Borracha”. Antes mesmo da consolidação de Brasília, o empresário Hely Walter Couto, 92 anos, abriu as portas da loja. A rede se expandiu e ele abriu outros estabelecimentos, como a da 511 Sul. A primeira unidade da rede foi inaugurada no Núcleo Bandeirante, graças à colaboração de um amigo do proprietário. “Ele me falou que tinha um lote no local e que poderia me ceder. Então, deixei um cheque com ele e falei para que construísse um barraco para mim”, destaca.
Hely se lembra da animação quando pisou na cidade. “Eu fiquei muito empolgado assim que cheguei aqui, porque muitas pessoas estavam vindo de outras regiões para conhecer Brasília”, acrescenta. O nome da marca foi sugerido por um dos funcionários de Hely. “Eu estava em Belo Horizonte e, durante conversas com um funcionário, ele me perguntou se em Brasília existia casa da borracha. Eu disse que não, então ele falou para o nome ser Pioneira da Borracha”, revela.
O começo do negócio, porém, não foi fácil, ainda mais em uma cidade recém-criada. Hely se recorda que tinha em estoque 100 travesseiros e recebeu uma encomenda de 1 mil. “Quase caí para trás. Eu não tinha o capital necessário. O meu caixa era de apenas 400 mil-réis (aproximadamente R$ 50 mil)”, conta.
A empresa se estabilizou no mercado brasiliense sob o lema trabalho e honestidade. Ao longo dos anos, chegou a ter oito unidades em todo território candango. Atualmente, conta com cinco estabelecimentos, sendo dois na Asa Sul, um na Asa Norte, outro no Sudoeste e o último em Taguatinga. A principal loja, situada na 511 Sul, possui cerca de 35 funcionários, dos quais 25 têm mais de 40 anos de casa.
Culinária
Conhecida pela famosa e tradicional pizza de mussarela com molho de tomate, a pizzaria Dom Bosco é referência no mercado brasiliense. Foi fundada por Enildo Veríssimo Gomes, em 5 de dezembro de 1960, na 107 da Asa Sul, a primeira quadra finalizada no Plano Piloto. O estabelecimento reúne seis unidades em todo o Distrito Federal e coleciona clientes famosos ao longo dos 57 anos: Renato Russo, Nelson Piquet, Cássia Eller, Paula Toller entre outros
O proprietário optou por montar um negócio prático, em que os clientes poderiam comer rapidamente e voltar ao serviço. “Quanto mais trabalhava, mais ganhava, porque as pessoas recebiam por hora”, explica Enildo. No início, eram oferecidos mais de um sabor. “Comecei com três tipos de pizza, mas não deu certo, pois alguns ingredientes ressecavam com o tempo. Então, fiquei apenas com a de queijo, porque ela mesmo fria é gostosa”, conta.
Segundo Enildo, o principal motivo para o êxito do negócio é o fato dele gostar do que faz, utilizar materiais de qualidade e preparar com carinho. “Não adianta terceirizar produtos mais baratos. Tem que usar bons ingredientes para poder dar certo”, enfatiza. Mesmo com o sucesso, o dono da Dom Bosco não tem intenção de tornar o empreendimento uma franquia. “Hoje em dia, as pessoas só visam o lucro, não gostam do que fazem e isso pode atrapalhar a marca”, afirma.
Em relação a divulgação do estabelecimento, ele revela que a maior parte quem faz é a própria clientela. “A freguesia compartilha sobre a loja, o que me deixa orgulhoso. Atualmente, temos mais de 6 mil seguidores nas redes sociais. Pessoas do Brasil todo e até dos Estados Unidos mandam mensagens falando da saudade”, ressalta.
Banca de jornal
A primeira banca de jornal da capital federal foi inaugurada em fevereiro de 1960. Lourivaldo Marques, 80 anos, proprietário do estabelecimento, recorda sobre a fundação da loja. “Eu comecei a vender em um caixote e, depois, em um banca de madeira, enquanto a definitiva não era construída”, conta.
Durante uma viagem à São Paulo, o dono recebeu uma ligação e ficou sabendo que a banca provisória havia sido retirada pelo GDF e removida para um depósito. Porém, com a divulgação da imprensa, a loja foi recolocada no local de antes. “A força da imprensa foi importante para que a trouxessem de volta”, ressalta.
Lourivaldo conta que o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Gallotti, foi um assíduo cliente da Banca Cultural. “Ele vinha comprar o jornal comigo, ou pedia ao motorista para que viesse buscar”, recorda. Em outra ocasião, o proprietário havia perdido as chaves do carro e não conseguiria chegar ao trabalho a tempo de vender os exemplares.
Sabendo da situação, o juiz foi o responsável por informar ao jornaleiro que a chave havia sido encontrada em outra quadra da W3. “Ele me ligou e falou que uma emissora havia noticiado o aparecimento do molho de chaves na 307 Sul”, conta. Nesses 58 anos, a paixão e o empenho pelo serviço foram fundamentais para o sucesso da primeira banca de jornais de Brasília. “Eu faço desta banca o meu sustento. E a melhor parte é o desprendimento pelo trabalho, pois gosto do que faço e não me sinto cansado”, revela.
João Paulo de Brito e Luiz Fernando Santos
Sob supervisão de Isa Stacciarini e Luiz Claudio Ferreira