Tríplex, suspeitas de corrupção e estado de exceção: entenda os contornos da prisão de JK há 50 anos

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Acusado de corrupção, enriquecimento ilícito, subversão e ser proprietário de um patrimônio superior à renda por segmentos militares, midiáticos e judiciários. O ex-presidente Juscelino Kubitschek foi preso logo depois da edição do AI-5 (Ato Institucional nº 5), no dia 13 de dezembro de 1968.

Anteriormente, ele teve seus direitos políticos cassados por 10 anos, em 1964. Na época, era senador e liderava as pesquisas para a eleição presidencial de 1965, seria a 16ª eleição presidencial direta da história brasileira, que não chega a acontecer naquele ano. Juscelino foi preso na saída do teatro Municipal do RIo de Janeiro logo após a deflagração do AI-5.

O governo de JK foi marcado por um discurso desenvolvimentista com o famoso slogan que prometia caminhar “50 anos em 5”, dando prosseguimento a uma política econômica iniciada por Getúlio Vargas. Quando o ex-presidente Juscelino Kubitschek deixa o governo em 1961, levou consigo um alto índice de popularidade apesar dos grandes endividamentos e a alta inflação, explica o professor Frederico Tomé, ele entra para o Senado e já havia uma articulação por meio do partido para retornar ao poder.

 

“O próprio JK apoiou o Castelo Branco. E há quem diga, que depois do golpe de 64, houve pressão sobre o general Castelo Branco, já presidente,  que ele cassasse os direitos políticos do JK”, explica o professor. Um grupo conhecido como linha dura capitaneados pelo general Costa e Silva fez pressão para que JK fosse cassado.

Para o professor, “esse grupo tinha um projeto de poder que talvez se distanciasse um pouco do projeto de Castelo Branco, que era representante daquilo que se diz “Sorbonne” que diz respeito aos intelectuais do exército brasileiro, cujo projeto era tomar o poder, depurar, retirar a ameaça comunista – e existe aqui toda uma discussão do que seria essa ameaça comunista com uma imagem construída em uma propaganda de medo -, e devolver o governo à sociedade civil”. A figura para isso seria o JK, ele era a ponta de lança para o retorno à normalidade democrática do país, explica o pesquisador.

 

Possíveis semelhanças com caso Lula, segundo pesquisadores

JK era um nome conhecido, que já havia estado na presidência, tinha um apelo popular significativo, liderava as pesquisas, então para justificar essa cassação dos direitos políticos argumentava instabilidade política, levantou-se uma ideia num momento posterior que o JK havia recebido um triplex em ipanema, que estaria no nome de um ex-ministro do seu governo. “Não se provou que esse proprietário do apartamento era um ‘laranja’ do JK, não se provou  que o apartamento pertencia ao JK, mas mesmo assim houve uma campanha midiática pesadíssima contra o JK”, conta o historiador.

Segundo Maria de Fátima Guimarães, doutora em ciências políticas, no caso do JK, ele teria sido acusado de enriquecimento ilícito, corrupção e subversão, isso por ter o apoio de alguns segmentos da esquerda na época. O partido no qual JK era membro, Partido Social Democrático, era um partido considerado populista, mas como ele se associou ao PTB (histórico), na época, era um partido ligado ao trabalhismo, então os militares e os movimentos mais conservadores da sociedade não gostaram nenhum pouco dessa aproximação do JK com esse segmento trabalhista.

“Assim como hoje no caso do Lula, JK foi acusado por segmentos midiáticos, do judiciário e militares”, diz a pesquisadora. Ela diz também que existem diferenças na construção histórica da figura do JK e na do Lula, mas também existem semelhanças quanto ao carisma, popularidade dos dois, além das  acusações que sofreram. “Os dois foram vítimas de processos muito pouco fundados em termos jurídicos, pareciam até processos de exceção sem uma possibilidade de defesa mais ampla, mais profunda, ambos acusados de corrupção, enriquecimento ilícito sem provas muito cabais”, complementa ela.

“Não sou partidário da ideia de que a história se repete”, explica Frederico Tomé. “São processos históricos. Eu vejo que os processos históricos no Brasil, são permeados por estruturas que não mudam com uma facilidade, tendem a uma manutenção, sofrendo alterações no decorrer do tempo. Há uma estrutura autoritária no país e que é calcada em  instituições militares, judiciárias, religiosas e instituições midiáticas, nesse sentido, há uma correlação de forças para a inviabilização do nome do JK. O peso de denúncias midiáticas quando vc não tem um contraponto é bastante complicado é o que a gente percebe hoje no país – me parece que agora há um discurso dominante e hegemônico, não permite o contraditório, ou que o outro lado se manifeste”, analisa o professor.

Após ter seus direitos cassados e prever uma prisão iminente o então senador Juscelino Kubitschek sobe à tribuna e faz um discurso histórico anunciando a perseguição política que sofria e a tensão política que pairava no país. Essa afronta ao governo acaba culminando no seu exílio. Acompanhado de uma grande comoção popular, JK segue para o exílio na Europa, para assim poder articular de longe estratégias políticas.

Em 1967, o ex-presidente exilado retornou ao país. Em 1968, Costa e Silva deflagrou o Ato Institucional número 5 que marca a entrada no momento mais duro da ditadura militar brasileira “depois do AI-5 não havia mais dúvidas de que vivíamos num estado de exceção. Vejo nesse sentido, não só JK mas outras figuras políticas precisavam ser retiradas de uma circulação para que diminuísse a sua influência política”, explica o historiador Frederico Tomé. Nesse momento, a prisão de JK foi efetivada, junto com a proibição de visitar a cidade de Brasília, que havia construído e inaugurado no seu governo. “Passou a viver no ostracismo dentro de sua própria pátria”, como cita Luiz Adolfo Pinheiro em seu livro JK, Jânio e Jango: três Jotas que abalaram o Brasil.

O clima de tensão sobre JK só começaria a aliviar por volta de 1974 quando ele se tornaria um “ex-cassado” ao completar dez anos da perda dos direitos políticos. Em 22 de agosto de 1976 o ex-presidente morreu num acidente de carro no retorno de São Paulo para o Rio de Janeiro. Mais tarde, a Comissão Nacional da Verdade levantou suspeitas acerca do acidente. A própria comissão  chamou a atenção para a Operação Condor que levaria ao silenciamento de várias figuras políticas na América Latina, explica Frederico Tomé.

Por Larissa Calixto

Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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