Do sonho ao diploma: como programas de financiamento universitário mudaram histórias de vida

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O ingresso de estudantes de baixa renda no ensino superior aumentou a partir de programas de incentivo a educação. É o caso do Financiamento Estudantil (Fies) e do Programa Universidade Para Todos (Prouni). Apesar de terem o mesmo objetivo, os projetos são distintos. O primeiro oferece um financiamento para um aluno e começa a ser pago pelo estudante após a conclusão do curso. O segundo oferta bolsas de estudo parciais e até integrais.

Dados do Ministério da Educação (MEC) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Fnde) mostram que, de 2016 até o primeiro semestre de 2018 houve um crescimento na quantidade de vagas oferecidas pelo Prouni. Em 2016, 239.162 alunos foram beneficiados. Em 2017, o número cresceu para 240.758 e, apenas no primeiro semestre de 2018, chegou a 155.698.

No Fies, no entanto, o quantitativo reduziu desde 2016. Enquanto houve 203.635 contratos em 2016, em 2017 foram 175.978 e até o fim do primeiro semestre de 2018 chegou a 78.859.  Formada em pedagogia, Stella Azevedo Silva Lima, 35 anos, só conseguiu se formar pela oportunidade do Fies. “Eu consegui realizar o meu sonho de ingressar na universidade e cursar o ensino superior. Isso teve uma importância muito grande na minha vida por me possibilitar outras oportunidades de crescimento pessoal e profissional.”

Ela conheceu o Fies por meio de uma amiga que conseguiu ingressar na universidade por meio do programa e a informou sobre o funcionamento. Contemplada em 2013, Stella conta que sem o benefício provavelmente não teria acesso ao ensino superior. Para obter o financiamento, primeiro precisou prestar o vestibular na universidade escolhida para depois conseguir a bolsa integral pelo programa. “Um dos critérios fundamentais foi a baixa renda. Isso contou muito para eu conseguir”, destacou.

Stella ressaltou que diversas mudanças ocorreram na vida dela desde o momento em que ingressou na faculdade. Na visão da pedagoga, os estágios profissionais proporcionaram crescimento e experiência. “A universidade me permitiu conhecimento sobre assuntos até então desconhecidos. Hoje tenho uma outra maneira de pensar sobre certos temas abordados, tanto no meio social quanto no meio profissional.”

O Fies é um programa de financiamento do ensino superior, originado em 2001, dirigido a estudantes que ingressaram em uma instituição particular e não possuem condições de financiar o curso no momento. O objetivo é que o estudante pague após a conclusão do curso.  A inscrição é realizada pela internet por meio do Sistema de Seleção do Fies (FiesSeleção) para estudantes que participaram do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a partir de 2010 e obtiveram uma média de no mínimo 450 pontos e uma nota maior que zero na redação.

O Novo Fies é dividido em duas modalidades. A primeira oferta vagas com juros zeros para estudantes que possuem renda mensal familiar, por pessoa, de até três salários mínimos. Na segunda modalidade, o P-Fies, é cobrado juros baixos para quem possui renda mensal familiar, por pessoa, de no mínimo três e no máximo cinco salários mínimos.

Prouni

O estudante de direito Leonardo Garcia, 31 anos, conheceu o Prouni por meio de propagandas na televisão e amigos que utilizaram o benefício para ingressar no ensino superior o instruíram a tentar uma chance. Para ter a oportunidade de começar um curso superior, Leonardo fez o Enem.

Ele relatou que sem o benefício seria impossível realizar o curso dos sonhos. Leonardo possui a cota de 100% pelo Prouni. “Eu preciso trabalhar e o curso de direito nas federais normalmente é integral. Então, senti a necessidade de fazer numa particular e eu não teria R$ 9 mil por semestre para empregar nisso. O Prouni se tornou a única maneira possível de eu estar realizando o sonho de ser o primeiro advogado da família”, destacou.

Quanto às mudanças ocorridas na vida, ele relatou que as perspectivas e a visão de mundo mudaram. “Você começa a enxergar que um salário de R$ 3 mil não é o máximo que pode chegar. Começa a tomar consciência do seu lugar no mundo e deseja melhorá-lo.”

Leonardo Garcia, 31 anos, estudante de direito pelo Prouni. Foto: Arquivo pessoal/Divulgação

Para o estudante de direito, o curso superior representa uma oportunidade para os jovens da comunidade pelo fato de, após concluírem o ensino médio, precisarem decidir se irão trabalhar para complementar a renda da família ou ingressar na universidade. “Considero os programas de ingresso ao ensino superior muito importantes separadamente e num coletivo. Mas eu acredito que o Fies e o Prouni cumprem uma função social”, ressaltou.

O Prouni é um programa criado pelo governo federal, em 2004, com a finalidade de ofertar bolsas integrais e parciais para o ingresso no ensino superior em instituições privadas. É direcionado aos estudantes que cursaram o ensino médio na rede pública ou que foram bolsistas integrais em escolas particulares e que possuem uma renda, por pessoa, de até três salários mínimos.

Para conseguir o benefício, a pessoa interessada precisa fazer uma inscrição na internet, pelo Sistema Informatizado do Prouni (Sisprouni),  e a seleção é realizada por meio da nota do Enem. É necessária uma média de no mínimo 450 pontos e nota maior que zero na redação.

Risco de descontinuidade

O professor universitário, advogado e consultor da Unesco, Hector Vieira, explicou que não há por meio de uma legislação garantia de permanência dos programas de financiamento estudantil, como o Fies e o Prouni. “Os programas são políticas públicas construídas por áreas específicas do Estado e são embasados em uma legislação que irá trazer os pré-requisitos de ingresso e admissão. Eles não possuem uma garantia de permanência, levando em consideração que uma legislação pode eventualmente sobrepor a outra.”

Segundo o professor, não há possibilidade de criar uma lei que assegure a continuidade dos programas, caso não seja de interesse público. Na visão dele, os projetos deveriam ser tratados como prioridade, visto que permitem o acesso à educação, um direito fundamental e previsto na Constituição. “Levando em consideração que os programas viabilizam o acesso a um direito fundamental, que é a educação, eles deveriam ser tratados de maneira prioritária, mas isso depende de uma força política e de uma série de conjunturas.”

Quanto ao encerramento dos programas, Hector esclareceu que no caso de uma política austera, com maior rigor no controle de gastos, é possível a restrição do acesso ao benefício. “O crédito vem do governo federal. Eventualmente numa política um pouco mais austera, de um ponto de vista econômico, o governo pode acabar restringindo o acesso a esse crédito para programas específicos de ensino superior.”

Na visão do advogado, uma possível interrupção nos programas causaria impacto, pois tiraria uma chance de crescimento e melhoria de vida de muitas pessoas, devido ao fato do ensino superior ser excludente. “O impacto seria enorme, pois esses programas de financiamento do ensino superior propiciaram a entrada de muitos jovens na educação, coisa que não acontecia no Brasil. Eles abrem a oportunidade para pessoas que não possuem condições.”

Por Ana Luísa França

Sob supervisão de Isa Stacciarini

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