Os pacientes em estados clínicos mais graves da covid-19 podem ser submetidos ao tratamento por um procedimento chamado de ECMO (da sigla em inglês para Oxigenação por Membrana Extracorpórea). O ator Paulo Gustavo, que morreu no dia 4 de maio após complicações ocasionadas pela doença, foi submetido ao ECMO para não sobrecarregar os pulmões. No entanto, o tratamento não é fornecido pelo Sistema Único de Saúde e o custo diário pode chegar a R$ 30 mil.
Entenda o procedimento
Segundo o médico cardiologista Murilo Felipe Vilela, especialista em Unidades de Terapia Intensiva, o tratamento funciona como ponte para a recuperação do paciente contaminado pela covid-19. O médico alerta que a ECMO não é um tratamento exclusivo para a doença. Antes da pandemia, o procedimento já era utilizado para tratamentos de outras doenças como a Síndrome da Angústia Respiratória (SARA).
Na prática, segundo explica o especialista, a ECMO assume as funções dos pulmões do paciente durante o tempo suficiente para que os órgãos possam se recuperar da contaminação. Em condições normais, os pulmões, nos capilares sanguíneos, realizam as trocas gasosas, ou seja, recebem o oxigênio e liberam gás carbônico.
Com a gravidade da covid-19 e inflamação dos pulmões, essas funções são comprometidas e, por uma válvula em uma veia da virilha, o sangue é drenado para uma bomba e chega até uma membrana que assume o papel de realizar as trocas gasosas. O sangue retorna ao corpo por uma veia no pescoço e é distribuído para os demais tecidos.
Indicações para ECMO
O médico relembra que nem todos os contaminados pelo vírus são indicados para o uso da ECMO. “Os pacientes que precisam de ECMO venovenosa, no contexto do covid, são os pacientes que não responderam à nenhuma das medidas anteriores instituídas”.
Ele exemplifica que se tratam dos casos em que não deram resultados nem mesmo a intubação endotraqueal (através da qual o paciente é acoplado ao ventilador mecânico, então o paciente mesmo acoplado ao ventilador não consegue oxigenar o sangue e eliminar o gás carbônico), uso de bloqueadores neuromusculares (sem resposta a medicação que paralisa a musculatura respiratória), e o uso da técnica de pronação (posição de bruços utilizada nas UTIs).
São contraindicações ao procedimento que o paciente apresente falência múltipla de órgãos, histórico de câncer, problema neurológico severo, parada cardíaca prolongada, obesidade mórbida, sistema imunológico comprometido, insuficiência cardíaca avançada. O médico explica que dificilmente o procedimento seria adequado para quem tem mais de 70 anos de idade.
Riscos
Para os pacientes submetidos à ECMO, o maior risco apresentado é o de sangramento, já que precisam de medicamentos anticoagulantes para que o sistema e a membrana não sofram trombose e nem formem coágulos. Assim, apresenta-se uma maior chance de sangramento, inclusive do sistema nervoso central.
“A maior vantagem do tratamento é a permissão para que os pulmões se recuperem. Quando os pulmões estão gravemente afetados, que nem o ventilador e nem o respirador mecânico conseguem ajudar, através da ECMO os pulmões podem descansar por 10, 15, 20 dias dependendo do paciente”, diz o especialista.
Para o médico, o procedimento representa a possibilidade de recuperação e a sobrevivência de forma independente. “Agora com a covid, o tempo de recuperação aumentou bastante pois os pacientes só são indicados em casos clínicos mais graves. Alguns estudos estão indicando indicando uma média em torno de 28 a 29 dias, e outros indicando que pode variar entre 3 a 6 semanas de recuperação”.
A baixa disponibilidade em escala global e alto custo do tratamento são as grandes desvantagens destacadas pelo especialista. Existem poucas máquinas disponíveis no Brasil e a demanda aumentou, tendo uma variação de valor de acordo com o hospital.
O custo da máquina e do circuito giram em torno de R$ 80 mil, mas o maior desafio é arcar com as diárias do tratamento, que exigem profissionais especializados, respiradores, UTIs e possíveis hemodiálises.
No Distrito Federal, o primeiro caso de sucesso no uso da oxigenação por membrana extracorpórea foi registrado em hospital particular em Taguatinga, em maio de 2020.
Com os altos valores e o aumento da procura, a Secretaria de Saúde foi questionada sobre o oferecimento do tratamento em hospitais públicos e respondeu que, por não ser um tratamento padronizado pelo Ministério da Saúde e pelo Sistema Único de Saúde, não seria ofertado pelo Governo.
A taxa de sobrevida, informada pelo médico, está entre 55 e 60%, considerando o fato que os pacientes estão extremamente graves e se não tivessem sido indicados ao tratamento teriam taxa de mortalidade de 90%.
Segundo um estudo publicado no periódico Lancet, que utilizou dados de 213 hospitais de 36 países no período de janeiro a maio de 2020 em 1035 pessoas publicados na Organização de Suporte à Vida Extracorpórea (ELSO), 57% dos pacientes receberam alta, 6% permaneceram hospitalizados e 37% morreram
Por Fernanda Bittar e Maria Eduarda Cardoso
Arte: João Victor Brilhante / Bureau de Criação
Imagem: Matt Kowalczyk / Creative Commons
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira