“Discurso do amor violento foi naturalizado”, alerta professora

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Especialistas de diferentes áreas debateram sobre os vários tipos de violência contra a mulher e como o discurso reproduzido pela mídia pode contribuir para a perpetuação desses crimes.

Discursos travestidos de “românticos” ou “amorosos” podem estar muito mais relacionados à submissão do que ao afeto.  O alerta é de pesquisadoras de diferentes campos do conhecimento que passaram a investigar casos de violência doméstica.  Para a psicóloga Flávia Bascuñan, pesquisadora da área de violência contra a mulher, o discurso amoroso costuma comparecer nas delegacias e hospitais em casos de violência doméstica.

Influências 

De acordo com os dados de violência contra a mulher no DF, em 2020, 70% dos feminicídios foram cometidos nas residências das vítimas, 65% dos autores dos crimes eram conhecidos delas e já possuíam antecedentes criminais. Foram registrados mais de 16 mil casos de violência doméstica, sendo que 91% dos crimes foram praticados por homens e 80% dos registros citam violência psicológica.

A psicanalista Renata Bittencourt, que também é professora de cursos de comunicação, identifica que a violência foi incorporada em discursos sistematizados.

“O discurso do amor violento é tão naturalizado que a mulher não percebe que está inserida nesse contexto”, explica.

Ela apresenta o exemplo de uma paciente vítima de violência doméstica, que o marido restringe dentro de casa, o único contato dela com o mundo exterior nesse período de pandemia é pelo celular. Assim, as informações que chegam às mulheres pelos meios de comunicação afetam a concepção de amor delas.

Filmes de “amor”

A psicanalista contextualiza que uma pesquisa realizada em 2019, na qual as mulheres dizem que consomem sete tipos diferentes de conteúdo de mídia. 91% delas assistem a filmes e 81% a séries, ao todo, resultando em uma média de 4 horas e meia de filmes e 5 horas e meia de séries por semana.

Segundo ela, a forma como são apresentados os relacionamentos nessas produções influenciam diretamente o psicológico das mulheres.

A especialista diz que as relações de gênero são também de poder. Assim, há um ciclo de fabricação da violência, que começa com o abuso psicológico.

 

 

“A violência psicológica antecede todos os outros tipos de violência, mesmo sendo a mais difícil de ser mostrada no tribunal, ela contribui para a violência doméstica e pode ter um fim no feminicídio”, afirmou a professora Flávia.

 

Ao abordar a compreensão do discurso, a professora explicou que ele é composto por crenças e valores, que são reproduzidos pelas instituições. Dessa maneira, são criadas imagens idealizadas do amor, que resultam em modelos a serem alcançados dentro dos significados internalizados em cada um. A promessa de felicidade e estabilidade pode levar à frustração. Segundo ela, essa concepção é representada e propagada não só pelo cinema, mas também por outras formas de arte, como a literatura.

Formação das concepções

O papel das redes sociais, indústria do cinema e a mídia tem contribuído para recolocar a mulher no seu lugar de submissão. A avaliação também é da professora Christine Oliveira, pesquisadora em Direito, Estado e Constituição.

Ela exemplifica essa ideia com os filmes da Disney e produções de Hollywood, que trazem arquétipos sobre o amor e representação da mulher. Os padrões interpretativos dos relacionamentos fictícios levam a uma concepção deturpada do amor nas meninas, afetando em suas futuras vidas amorosas.

A especialista acrescenta que a violência de gênero, percebida principalmente na esfera doméstica, é fruto de uma cultura em que a mulher não ocupa lugares de poder. Como exemplo disso, Christine traz sua área de atuação, com uma maioria masculina: “Como produto social, o direito normativo é patriarcal e machista”. 

Estudos

O tema é discutido por professoras como elas, que fazem parte de um projeto de extensão do CEUB vinculado ao curso de direito. O Provid(Proteção à mulher vítima de violência doméstica) oferece orientação,  assistência psicológica e jurídica a usuários do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM) do Núcleo Bandeirante e da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM/PCDF).

A iniciativa tem como objetivo reduzir a violência doméstica e familiar contra a mulher e também realiza atividades de extensão e pesquisa. O apoio prestado promove o acolhimento e procura fortalecer as mulheres. O debate fez parte do 4º Encontro de Extensão e 17ª Campanha de Responsabilidade Social do CEUB. 

Por Maria Tereza Castro
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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