Terror – “Pecadores” traz ressignificação afro-americana do cinema de gênero

COMPARTILHE ESSA MATÉRIA

O longa de terror racial “Pecadores”, que chegou aos cinemas de Brasília, é outra colaboração do diretor Ryan Coogler e do ator Michael B. Jordan, ambos de Pantera Negra e Creed.

“Pecadores”, de Ryan Coogler, solidifica a nova onda do cinema negro americano, caracterizada pela incorporação de elementos dos gêneros de terror, thriller e western.

Em uma recente entrevista com Jordan Peele, diretor de “Corra” e o principal idealizador do movimento, Coogler explica que o trabalho de Peele com filmes de gênero é brincar com a expectativa do público, e o seu objetivo principal é brincar com a tradição incorporando elementos da experiência dos afro-americanos.

“I feel like what you did is break down a door for a genre where maybe black filmmakers aren’t taken as seriously, we aren’t as present.” [Eu sinto que o que você fez foi quebrar barreiras para um gênero onde cineastas negros não são levados à sério, e não estão presentes] – Igualmente, o que o diretor de “Pecadores” comenta sobre a obra de Peele também é verdadeiro para seu novo longa.

Segue o link da entrevista: https://www.youtube.com/watch?v=BkRqByFwkgI&t=223s

Resumo

Preacherboy Sammie é trabalhador rural da área do triângulo dourado do Mississipi. O cenário de expansão econômica dos anos 30 molda a maneira que Sammie enxerga a realidade, seu pai é pastor de seu pequeno vilarejo (daí vem o apelido do filho) e sua mãe trabalha na lavoura, o menino aprecia a sua vida no campo, mas ele enxerga que a sua paixão pela música o aponta para um outro caminho, o da boemia e urbanização.

Perto do vilarejo de Sammie já existe uma pequena cidade, que ensaia os problemas raciais das grandes metrópoles, os brancos vivem em conjunto com os negros, mas já de forma confrontosa.

Nesse contexto chegam na cidade os gêmeos Smoke e Stack (Michael B. Jordan), primos mais velhos de Sammie.

Os irmãos que viviam em Chicago sob os serviços de Al Capone, decidem enfrentar a vida que deixaram para trás em Mississippi, e vão abrir um clube de blues. Mas a perseguição racial dos anos 30, que é inevitável, dessa vez vai chegar de forma vampiresca.

Confira o trailer abaixo: 

Simbolismos

De maneira similar à “Corra”, aonde Peele utiliza do surrealismo para escancarar o drama de conhecer os sogros de outra etnia, Coogler aborda simbologias fantasiosos para ilustrar a experiência negra dos estados unidos.

É notável que os vampiros presentes na narrativa são uma amostra do comportamento branco americano, ele são atraídos pela música autenticamente negra, mas buscam possui-la, tentam os músicos com promessas de sucesso e de imortalidade. Preacherboy Sammie já sabia desses perigos, seu pai o alertava que tocar sua música atrairia espíritos malignos.

Os vampiros, que servem como os antagonistas, assumem o papel que a KKK teria na narrativa do filme se este não fosse fictício. Na literatura clássica, os vampiros são duques e barões, mas aqui viram donos de pasto, igualmente poderosos e assustadores. A força imparável que os monstros representam também transcende matéria: a narrativa do filme estabelece uma lógica imortal entre presa e predador, no caso a música e os opressores; quando a presa era o blues o predador eram os brancos loucos conservadores, quando a presa era o rap os predadores eram a polícia, e quando a presa eram os cânticos tradicionais os predadores foram os colonizadores.

Montagem através do som

O aspecto técnico mais impressionante do longa é como a música é entremeada com a imagem, aqui a sonoridade é elemento primordial. Como nos folks e blues americanos, a música é narrativa, e evoca as imagens do passado folclórico. Os personagens são todos muito distintos na narrativa, e cada um possui seu som característico, o objetivo é demonstrar pluralidade, emoção, romance e ação tudo do ponto de vista do povo de Mississipi, que são retratados de forma unicamente original.

É só mais uma fórmula?

Mesmo que a nova filmagem de Ryan Coogler seja Peeliana por natureza o diretor de “Pantera Negra” e “Creed” não esqueceu de suas raízes, o foco aqui é divertimento, ação e emoção, filme pipoca de primeira categoria. Os símbolos são interessantes mas não essenciais. Ao tentar incorporar a essência de Jordan Peele, Coogler a transformou, são dois diretores que veem cinema de forma similar, a mensagem é parecida, mas a execução é oposta.

Por Arthur Maldaner*
O repórter assistiu ao filme a convite da Espaço/Z
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-SemDerivações 4.0 Internacional.

Você tem o direito de:
Compartilhar — copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato para qualquer fim, mesmo que comercial.

Atribuição — Você deve dar o crédito apropriado, prover um link para a licença e indicar se mudanças foram feitas. Você deve fazê-lo em qualquer circunstância razoável, mas de nenhuma maneira que sugira que o licenciante apoia você ou o seu uso.

SemDerivações — Se você remixar, transformar ou criar a partir do material, você não pode distribuir o material modificado.

A Agência de Notícias é um projeto de extensão do curso de Jornalismo com atuação diária de estudantes no desenvolvimento de textos, fotografias, áudio e vídeos com a supervisão de professores dos cursos de comunicação

plugins premium WordPress