Cartomancia não é crime no Brasil, explica pesquisador 

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Em uma pequena sala decorada com velas e incensos, Arlete Citrini embarca diariamente em jornadas simbólicas através das cartas de tarô. Com mais de 20 anos de prática, ela diz que o trabalho é baseado em simplicidade e seriedade.

“Eu só jogo e oriento a pessoa. Não faço trabalhos espirituais ou manipulações. Nosso dever é respeitar o livre arbítrio e agir com responsabilidade”.

Tudo começa com a numerologia para Arlete, pois é por meio dos números de sua vida que se torna possível identificar a fase e os ciclos de vida pelos quais o cliente está passando. Combinada a forte intuição da cartomante, essa leitura inicial já oferece uma visão mais clara dos caminhos possíveis.

Porém indo além com as cartas ciganas e o tarô. Arlete também conta com uma conexão espiritual intensa com a sua guia cigana, o que, segundo ela, garante mais clareza e proteção durante os atendimentos.

Apesar de ainda carregar uma aura de mistério e desconfiança para muitos, a prática da cartomancia não é considerada crime no Brasil, desde que respeitados certos limites. O advogado e professor de direito penal Victor Quintiere, do Centro Universitário de Brasília (Ceub), explica que, no Brasil, a profissão de tarólogo, astrólogo e cartomante ganhou reconhecimento formal em 2022.

“Porém, o problema surge quando a promessa ultrapassa o simbolismo: quando um destino garantido é vendido como certeza, pode haver crime”.

Ou seja, se a cartomante oferece garantias absolutas ou realiza práticas que envolvam manipulação de pessoas, pode configurar crime de estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal.

“A linha entre fé e fraude é tênue. O que protege o cartomante é a honestidade: apresentar o trabalho como orientação simbólica, nunca como garantia de resultados”, explica Quintiere. 

Arlete reforça a postura de responsabilidade e apreço pela sua credibilidade.

“A única coisa que eu tenho é o meu nome. Se eu fizer alguma coisa errada, é fácil cair em descrédito. Por isso, sempre busco honrar o meu trabalho, sem prometer milagres ou fazer amarrações amorosas. Isso, espiritualmente, não é correto”.

Respeito espiritual 

Ela conta que a consulta com as cartas é acompanhada de um profundo respeito ao cliente e à espiritualidade.

“Antes de sair de casa, já preparo minha conexão com o divino. Faço minhas orações e peço proteção para que o atendimento seja para o bem maior da pessoa”.

A cartomante  destaca que o papel fundamental das cartas é orientar, não determinar.

“As cartas mostram o que está errado, o que pode ser feito. Nós temos o livre arbítrio. Algumas coisas podem ser mudadas, outras, amenizadas”.

Para Arlete, o maior mito sobre seu ofício é acreditar que cartomantes fazem trabalhos para manipular terceiros.

“As pessoas perguntam se eu faço amarração. Eu digo: ‘não’. O amor tem que ser livre. Não pode haver amarração”.

O advogado Victor Quintiere ressalta que manipular a decisão das pessoas prometendo alterar o destino pode configurar ilícitos civis e penais, além de ser antiético.

“O cartomante sério deve sempre deixar claro que seu trabalho é interpretativo, não garantidor”, reforça. 

Ressalta que a prática com as cartas exigem muito estudo e dedicação, o exercício da cartomancia vai muito além de só jogar as cartas, exige o conhecimento intelectual de símbolos e linguagens. Sempre se conectando com a espiritualidade de cada leitura.

Já esclarecido até que ponto a cartomancia é legal constitucionalmente, para aqueles que desejam buscar orientação espiritual com seriedade, o advogado Quintiere possui algumas dicas: desconfie de quem promete certeza absoluta e “trabalhos milagrosos”, busque profissionais que trabalham com transparência, respeito e limites éticos. 

O esotérico consciente sabe que sua função não é garantir finais felizes, mas abrir portas para reflexões, reforça o advogado.

Futuro da cartomancia 

Apesar dos desafios e preconceitos, Arlete acredita que a cartomancia continuará viva: “Cada vez mais pessoas buscam não apenas respostas, mas orientação espiritual. Às vezes, a pessoa só quer desabafar, ser ouvida, receber um conselho”.

Sobre a possibilidade de enfrentar problemas judiciais, ela é categórica: “É por isso que procuro usar o mais certo possível. Cliente é cliente, amizade é amizade. Ser profissional é fundamental”.

Em tempos em que a fé, o autoconhecimento e a espiritualidade ganham novos contornos, a prática da cartomancia permanece, navegando entre tradição, intuição e, agora, responsabilidade legal.l

Por Danyelle Silva, Maria Eduarda Medina e Júlia Harlley

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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