Olhos atentos, bolsas sempre à frente do corpo, passos rápidos, celular escondido, andar sozinho não é uma opção, joias já não são expostas. Dinheiro? Apenas o suficiente para pagar a passagem. Os moradores da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, convivem com o medo. O estado tem passado por uma crise financeira que repercute nas ruas da cidade. Mas esse avanço da violência não é recente. Não é apenas quem reside na capital que está preocupado. Turistas também estão impressionados com os ataques. Em uma década a violência cresceu significativamente, a mortalidade por arma de fogo é evidente. Quem frequenta o Centro Histórico, seja para ir ao Mercado Público ou passar pela Praça da Matriz, não reconhece mais a cidade. Moradores e turistas cobram proteção.
Segundo o Mapa da Violência 2015, a mortalidade por armas de fogo em Porto Alegre teve aumento de 3,6% em uma década (2002 a 2012). Já de 2011 a 2012 o aumento foi de 10,6%, ocupando o 13º lugar em relação às outras 26 capitais do Brasil em 2012, ficando a frente, por exemplo, do Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte.
Rio Grande do Sul
Segundo os indicadores criminais de janeiro à dezembro 2015, divulgado pela Secretaria de Segurança Pública, Porto Alegre possui números alarmantes em comparação aos outros 474 munícipios do Estado que estão dentro da pesquisa:
“Prejuízo de quase R$ 3 mil”
Enquanto estava na recepção do hotel na Avenida Farrapos, Antônia*, 60 anos, contou que três homens armados invadiram o local. Renderam as oito pessoas que estavam no espaço e depois os trancaram na cozinha. “Meu esposo recém fez cirurgia de catarata e por isso estávamos com óculos novos, além de vários medicamentos para o coração. O prejuízo foi de quase R$ 3 mil”, relembrou, indignada.
Antônia* mora em São Paulo há 60 anos, e disse que nunca havia sido assaltada. “A gente encara, senão daqui um tempo não saímos nem de casa”, afirmou após mudar para um hotel na Rua Duque de Caxias.
“A cidade está largada”
Natural e residente em Porto Alegre, Eduarda* afirmou que a marginalização do centro da cidade é recente. “Não é só o turista que estranha, nós moradores também ficamos com medo”, disse a moradora de 66 anos. Ela conta que os colegas que vão visitá-la preferem ficar em hotéis nos bairros do que no centro.
A aposentada relatou que no carnaval a capital fica mais perigosa, pois grande parte da segurança desloca-se para as praias. “Tenho medo principalmente de ir ao centro, a cidade está largada”.
“Damos dicas para os turistas”
Breno*, 49 anos, trabalha com hotelaria há 30 anos e explicou que sempre a equipe auxilia os visitantes com sugestões do que fazer na cidade. “Damos dicas para os turistas, a gente alerta sobre os locais menos seguros como próximo à Santa Casa e a Escadaria da Avenida Borges de Medeiros”. O recepcionista ainda alertou que o ideal é sair com bolsas pequenas e sem objetos de valor.
“Sempre levam o celular”
Ana*, 23 anos, é caixa de uma loja em um shopping para ajudar com os gastos da faculdade. Ela contou que nunca foi assaltada no trabalho, mas na rua os roubos já somam a compra de cinco celulares novos. “Eles sempre levam o celular, que dá pra vender e comprar droga”. A estudante comentou que o shopping é muito frequentado por turistas devido à segurança. “Todos tem segurança terceirizada, e alguns até com porte de arma”.
“Fica fácil corromper”
O taxista e gaúcho Carlos*, 46 anos, trabalha há 20 anos na área. Carlos* já foi assaltado três vezes. “Eu dou sorte. Tenho colegas que são assaltados quase todo dia”. Ele acredita que o maior problema são os baixos salários da polícia. “Meu sobrinho é policial civil, os salários são ruins, dai fica fácil corromper”.
Carlos* relembrou que em uma corrida um policial civil pediu para que fosse até a Vila Conceição, bairro nobre da zona sul de Porto Alegre, local conhecido devido ao tráfico de drogas. Para evitar o risco, o taxista recusou a corrida. “Ele disse que anotaria o número do meu táxi e que seus colegas dariam um jeito em mim”. Mas não demorou muito para o episódio se repetir: um jovem pediu para ir a Conceição, e o taxista recusou. “Ele insistiu e disse que eu podia ficar tranquilo, que ele era chefe da boca de drogas, que se mexerem com os taxistas deles, eles mandam matar”.
Troca troca
No dia 11 de fevereiro, última quinta-feira, o governo formalizou a saída de Guilherme Wondracek como chefe da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, que comandava a corporação desde março de 2014.
Agora quem assume o cargo é Emerson Wendt, que atuava como diretor do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc).
Também ocorreu a nomeação do novo subcomandante-geral da Brigada Militar: o coronel Andreis Silvio Dal Lago. Ele substitui Paulo Moacir Stocker dos Santos, que se aposentou.
Tamanha a violência que, apesar da pouco presença nas ruas, a página da polícia civil do Rio Grande do Sul disponibiliza dicas de segurança para o dia-a-dia, como agir seja em casa, vias públicas ou no trânsito. No caso de assaltos, por exemplo, a indicação é não reagir, nem tente fugir, fornecer o que o criminoso exigir, não fazer movimentos bruscos e procurar alertar o assaltante dos gestos que pretende realizar, como pegar uma carteira.
Para saber mais, basta acessar a página oficial da polícia.
A Agência de Notícias UniCEUB entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (SSP RS) e com a Divisão e Estatística Criminal (DEC), mas até o momento da publicação não obtivemos resposta.
*Todos os nomes indicados foram alterados para preservar a identidade dos entrevistados.
Fotos: Daniella Bazzi
Arte: Camila Campos
Por Daniella Bazzi, de Porto Alegre (RS)