Práticas desumanas semelhantes ao que era desenvolvido em hospícios, manicômios e sanatórios até a década de 1980 ainda são praticadas pelo país, conforme revelam psicólogos que protestam nesta semana de luta antimanicomial, cuja programação vai até sexta (20).
“No Brasil, há muitas instituições que não assumem oficialmente um caráter manicomial, porém funcionam tal e qual, com vários casos de violação dos direitos humanos e com condições de infraestrutura extremamente precárias. Basta citar o caso das violações de direitos humanos registradas há pouco tempo em hospitais psiquiátricos da região de Sorocaba (SP)”, diz o professor de psicologia Ivo Valente, que atua em Foz do Iguaçu. Ele cita ainda o IPF – Instituto Psiquiátrico Forense de Porto Alegre, que há pouco tempo estava sem equipe e com uma estrutura péssima.
O psicólogo Vitor Detomini concorda com a avaliação. Existiriam instituições com práticas veladas. “Talvez não com todas as características dos manicômios clássicos, como de Barbacena (MG) ou Juqueri (SP), mas ainda há os manicômios disfarçados, que pregam uma prática e, na verdade, fazem outra”, explica. Para o psicólogo Sérgio Moura, há práticas irregulares que podem ser observadas com uma inspeção técnica. “Quem entrou em uma manicômio não consegue esquecer o cheiro”.
Problemáticas
Para os especialistas, as problemáticas no tratamento passam pelos preconceitos e pela estrutura dos serviços oferecidos. “Os estigmas sobre a saúde mental, não só com os pacientes, mas também com nós mesmos, trabalhadores. Muitos têm o trabalho saúde mental como castigo, e com isso não vem a desempenhar um bom trabalho”, explica Sérgio Moura.
De acordo com Ivo Valente, houve evolução na rede de atendimento, mas falta infraestrutura. Hoje temos vários CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) em várias partes do país. O serviço é perfeito? Não, não é. Em muitos casos, há falta de equipe e falta de estrutura”. Vitor Detomini também aborda que há dificuldades internas de estrutura. “Há cidades que instauram esses serviços ‘só para constar’ e, assim, eles não funcionam nos preceitos da Reforma, sendo abertos, acolhedores e territoriais. Muitas vezes não há profissionais capacitados para este trabalho ou há profissionais sobrecarregados e sem qualificação ou supervisão profissional. Há também o poder da chamada “indústria da loucura”, formado por donos de clínicas psiquiátricas ou comunidades terapêuticas que, ao invés de visar o tratamento, querem lucro.
Histórico
O movimento da luta antimanicomial é caracterizado pela luta dos direitos de pessoas com algum tipo de sofrimento mental, tendo como um de seus principais objetivos o combate à ideia de que se devem isolar pessoas com tais problemas, garantindo o direito a liberdade. Os avanços e desafios enfrentados na implementação dos Serviços de Atenção Psicossocial – RAPS serão discutidos durante os encontros que serão realizados em diversas cidades espalhadas pelo país.
O dia 18 de maio faz referência ao Encontro dos Trabalhadores de Saúde Mental ocorrido no ano de 1987, no estado de São Paulo e que reuniu cerca de 300 trabalhadores na área da saúde mental e usuários do sistema. Naquela época, diversas práticas abusivas aconteciam nos manicômios, como por exemplo, a eletroconvulsoterapia, técnica que consiste na passagem de corrente elétrica sobre a região temporal comumente aplicada em indivíduos que sofriam de graves doenças mentais. A partir daí, surgiu à possibilidade de uma intervenção social que permitiu a origem do movimento cujo lema é “Por uma sociedade sem manicômios!”.
O dia será marcado por manifestações que buscam mostrar que as condições da saúde mental no Brasil melhoraram, mas que ainda há um longo caminho a percorrer. O movimento afirma que as pessoas que possuem algum tipo de sofrimento mental não devem ser excluídas da sociedade, mas sim acompanhadas e orientadas.
Por Laylla Nepomuceno
Imagem: Creative Commons