Uma Chinatown em Brasília. O nome pode ser adequado para a Feira dos Importados, localizada perto do centro da Capital Federal. Os chineses evitam conversas que não sejam sobre os produtos que vendem, tais como óculos, bolsas e roupas de grife falsificadas, mas eles representam o principal grupo de estrangeiros no local, segundo a Cooperfim (Cooperativa de Consumo dos Comerciantes da Feira dos Importados do DF). “Cerca de 20% dos comerciantes da feira são de outros países e a maioria veio da China”, salienta a diretora comercial da entidade, Maria Eurídes Lopes.
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ANIMAIS SÃO VENDIDOS ILEGALMENTE
De acordo com uma pesquisa feita em 2011 pela Codeplan (Companhia de Planejamento do Distrito Federal), as atividades desenvolvidas na Feira dos Importados são exclusivamente voltadas para o comércio varejista. Do total de 1.017 estabelecimentos, nada menos que 910, ou seja, quase 90% do total, são estabelecimentos comerciais.
Maria Eurídes ainda disse ter ciência de que estrangeiros trabalham para chefes que podem não estar na feira. “Existe também uma conversa que eles falam que têm os cabeças, os chineses trabalham pra eles. Acredito que deve ter alguém forte que oferece mercadoria para eles trabalharem, alguma coisa assim”, denuncia. Segundo Maria Eurídes Lopes, na rotina do lugar, os chineses são os primeiros a chegarem na feira e os últimos a saírem.
A delegada da Polícia Civil, Mônica Ferreira, disse que existe “um braço” da máfia chinesa no DF, mas que o centro fica concentrado em São Paulo. “Eles tem tentáculos aqui em Brasília, e vivem desse comércio ilegal, que produz altíssima sonegação fiscal”, explica ela. A delegada afirmou que a Polícia Civil tem feito o possível – dentro do que a legislação permite – para combater a ilegalidade de produtos na feira.
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“Essas pessoas que vendem produtos falsificados, não pagam nenhum imposto, para mim é tolerância zero. Se eu pudesse prendia todos, e eles não funcionavam mais lá (na feira)” – Delegada Mônica Ferreira
Problema de quem?
Segundo a diretora da cooperativa de vendedores, há ciência de que os produtos vendidos pela maioria dos chineses são ilegais. “Isso não é com a gente, e sim com a Polícia Federal. O governo que tem que ver esse lance da fiscalização”. Além disso, a diretora afirma que a maioria dos chineses que vêm para o Brasil tem pouco poder aquisitivo.
A Embaixada da China no Brasil, através de sua oficial consular, Liliana Pereira, evitou responder diretamente as perguntas da reportagem. Quando questionada sobre o conhecimento de chineses que trabalham irregularmente na feira, a resposta foi simples e direta: “não podemos falar sobre isso”. A oficial ainda afirmou que quem cuida da questão de chineses ilegais no Brasil é a Polícia Federal, não a Embaixada.
A Polícia Federal, por meio de sua assessoria, confirmou que é deles a responsabilidade de combater, juntamente com a Receita Federal, os crimes de contrabando e descaminho, sendo que este combate independente da ascendência do criminoso. A PF também afirma que “a situação migratória deve ser avaliada caso a caso, pois há gente com visto de trabalho, permanente, em processo de regularização e até refugiados”.
Sem horário de almoço
Há 21 anos em Brasília, a família do jovem comerciante chinês, que não quis se identificar, veio para o Brasil em busca de melhores oportunidades de emprego. “Aqui é muito melhor para se trabalhar. Pretendo ficar rico e só depois voltar para a China”, conta ele. O jovem diz que, apesar de não dominar o português e por isso não cursar uma faculdade, nunca enfrentou grandes dificuldades por ser imigrante.
O comerciante Pablo Francisco, 20 anos, trabalha para chineses há cinco anos. Mestiço, filho de asiáticos e nascido no Brasil, o jovem alega que já teve problemas com os chineses várias vezes, pois muitos não dão horário de almoço e não assinam carteira. “Às vezes a gente tem que resolver algum problema de saúde, e se faltar já é mandado embora… eles não querem saber se a gente não chega no horário certo, se pega trânsito ou sofre acidente”, reclama.
Contudo, segundo Pablo, a maioria dos chineses que trabalha na feira é considerada de origem humilde: andam a pé e moram perto da feira, onde vivem uma dura realidade. Muito diferente da vida dos “cabeças chineses”, que oferecem os produtos falsificados, fazendo fortuna com a pirataria no DF.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho, há 96 investigações sobre intervalo intrajornada e 34 investigações sobre jornada de trabalho em andamento em todo o DF.
Máfia
Em setembro do ano passado, a Polícia Civil prendeu um dos líderes da máfia chinesa que atuava na Feira dos Importados. Wu Zhaoxiao, de 47 anos, atuava como vendedor de óculos e tênis falsificados. Apesar disso, o chinês tinha carros importados, casa em condomínio fechado e apartamentos em Águas Claras. A operação prendeu, além de Wu, outras 13 pessoas e apreendeu material falsificado em 16 boxes.
Responsável pela prisão de Wu Zhaoxiao, a delegada da Polícia Civil, Mônica Ferreira, disse que atualmente o chinês responde o processo em liberdade. “Esse é meu trabalho. Se eles estão na ilegalidade, seja chinês ou brasileiro, eu vou fazer do mesmo jeito. Não quero saber, esse é meu papel, eu vou cumprir”, afirmou ela.
Texto e Fotos: Ana Carolina Alves