W3 Sul: centro comercial em queda e a necessidade de revitalização

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Polo comercial de Brasília nos anos 60, 70 e 80. A avenida W3, na Asa Sul, já foi o lugar onde qualquer sonho de consumo poderia ser encontrado na jovem capital do Brasil. Em um dos diálogos do filme “Somos Tão Jovens”, o ator Edu Moraes, interpretando o Herbert Viana (vocalista do Paralamas do Sucesso), diz para Renato Russo que o único lugar de Brasília que ele encontraria sua famosa guitarra seria na W3. Um shopping center a céu aberto.

Mas será que a W3 foi pensada para isso? Decadência é a palavra mais ouvida nos dias de hoje pelos brasilienses quando se trata da avenida. O arquiteto e urbanista Frederico Flósculo, também doutor em psicologia do desenvolvimento humano, esclareceu que, no projeto original de Lucio Costa, não havia planos para um centro comercial na avenida W3 e que, por isso, a partir do surgimento de verdadeiros centros de diversões shoppings na cidade, a famosa pista passou a ser coadjuvante, mas não decadente.

“A W3 era para ser no plano original uma EPIA (Estrada Parque de Indústria e Abastecimento) em menores extensões”. O papel era tão secundário que toda a faixa no sentido do aeroporto deveria ser chácaras produtoras de ovos, verduras e carnes, segundo o arquiteto.

Ponto de venda em derrocada

Clécio Araújo vendendo seus salgados.

O vendedor ambulante de salgados Clécio Araújo prefere o espaço na frente da agência da Caixa como melhor ponto de vendas, na altura da 504 sul. Clécio apontou a instabilidade política como a principal dificuldade dos ambulantes no local. “Depois do Impeachment da Dilma e da incerteza política, muitas empresas aqui andaram fechando. Se um prédio comercial desses começam a fechar as portas, são quase R$ 2 milhões que caem na receita de todos os ambulantes juntos”.

Entrevista com Clécio Araújo:
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“300 salgados diários” era a marca que Clécio conseguia alcançar há dois anos atrás, hoje em dia se mantém em 150. Aluguel demais e a dificuldade de empréstimos no banco em tempos de crise atrapalham, segundo Clécio. “Tenho amigos aí que tinham comércio de 20 anos e tiveram que fechar. Eu vendia salgados com mais 5 funcionários, tive que demiti-los”, exemplificou.

Já o vendedor mineiro André Carlos Silva está em Brasília há 8 anos. Ele apontou a segurança como um dos graves problemas para o desinteresse do comércio naquela área. “Principalmente aqui na altura da 703 Sul, na frente da Praça do Índio (onde o indígena Galdino foi morto há 20 anos), várias lojas já foram assaltadas 2 ou 3 vezes não faz muito tempo”. O fato das regiões administrativas terem crescido nos últimos anos e possuírem atrativos autônomos do Plano Piloto também é uma explicação do ambulante para a queda de movimento, além dos juros e impostos altos.

Entrevista com André Carlos Silva:
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Renovação

Além de arquiteto e urbanista, Frederico Flósculo também encabeçou a equipe campeã do concurso nacional de revitalização da W3 em 2002. Para ele, a missão de revigorar a avenida não está nos altos números de venda, mas sim na cultura. “A cultura irá trazer vida à W3 e não só a da região, mas a do Brasil e do mundo. Começaríamos um programa de recepção e sedução de grandes instituições de cultura do mundo para terem filiais em Brasília, o museu de Nova Iorque é um exemplo.”

Projeto campeão que até hoje não foi implantado sequer discutido pela falta de interesse dos nossos governantes em cultura e alinhamento com a empreiteiras e ideais de verticalização do que no avanço civilizatório. Para o vendedor de tapioca Márcio Santana, que está há um mês na capital, disse que a parte de autorização para estar na W3 vendendo está sendo o maior impasse. “O Sebrae até incentiva a regularizar a empresa, mas a questão da fiscalização nos impede de estar todos os dias na rua”. O comerciante contou que já foi atrás da liberação do GDF para não ter problemas com a fiscalização na área, mas eles não estariam liberando. “Falam que a área de Brasília não tem mais espaço”.

Aluana e seus produtos.

A vendedora de salgados e doces que preferiu se identifcar como Aluana, de 35 anos, também reclamou da fiscalização e disse que a administração está dificultando a vida dos comerciantes ambulantes. “Eles falam que é local impróprio, área pública. Mas todo comércio fica em área pública”.

Uma sociedade rica em quesitos monetários mas empobrecida culturalmente é algo preocupante para Frederico Flósculo, que encerrou a entrevista apontando que esse problema existe desde a concepção da cidade. “Temos uma cidade que historicamente a sociedade é desemponderada, as decisões sempre foram colocadas nas mãos de um grupo pequeno de pessoas”.

Confira outras entrevistas com outros vendedores ambulantes:

Por João Victor Bachilli

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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