Perfil: professora referência na educação antirracista no DF foi estimulada por pais analfabetos

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A professora Gina Vieira, defensora de uma educação antirracista, cresceu em regiao periférica de Ceilândia, a maior região administrativa do Distrito Federal.

A trajetória dela reflete a luta de uma família humilde que, apesar das dificuldades materiais, fez da educação uma prioridade.

Nascida na década de 70, ela lembra com carinho dos pais, que, mesmo analfabetos, eram apaixonados por aprender e comprometidos em garantir que seus filhos tivessem acesso à educação que lhes foi negada.

“Meu pai era um homem íntegro, mas não sabia ler e escrever”, diz Gina. O pai nasceu em Sobral (CE) e buscou em Brasília  trabalho na nova capital. A mãe, Djanira, mineira, trabalhava como empregada doméstica e estudou até a quarta série.

Mesmo com as dificuldades, ambos fizeram da educação um alicerce em suas vidas. “Eles gastaram todo o tempo e energia para garantir que nós tivéssemos acesso à educação”, revela.

Inspiração

Gina começou sua carreira na educação ainda jovem. Após concluir o magistério, foi inspirada por sua professora, Creuza Pereira, a seguir os passos dela e ser também uma educadora.

“Ela me mostrou o verdadeiro sentido de ser professora. Foi ela quem me ensinou que a educação poderia transformar a minha história”, recorda.

Aos 19 anos, Gina se tornou professora concursada, mas, após uma década de experiência, ela se deparou com uma realidade que a fez repensar sua prática pedagógica.

Ao começar a lecionar para adolescentes, a professora percebeu que muitos desses jovens, especialmente os das periferias, não viam sentido na escola. “Eles odiavam estudar”, afirma.

Foi nesse momento que ela se questionou sobre a resistência dos estudantes à educação.

“Eu queria ser a professora que me inspirou, mas descobri que a escola estava longe de ser atraente para eles”, explica.

Resposta

A solução que encontrou foi investigar o que afastava os jovens da escola e, após um intenso processo de reflexão, Gina se deu conta de que a educação oferecida era superficial, autoritária e, muitas vezes, racista.

“A escola não representa a história do jovem negro de maneira justa”, observa.

A educadora se dedicou, então, a mudar a abordagem pedagógica, focando em atrair os estudantes e dar-lhes a oportunidade de se expressarem de maneira mais livre e criativa.

Para se aproximar dos alunos, a professora utilizou das mídias sociais como ferramentas de comunicação, até que se deparou com um vídeo de uma estudante, ainda na sexta série, que trazia uma representação de uma música que objetificava e reduzia as mulheres.

“A coreografia que ela fazia tinha um apelo erótico que eu considerei claramente inadequado para a faixa etária dela”, relembra.

Projeto “Mulheres Inspiradoras”

Foi nesse contexto que nasceu o projeto “Mulheres Inspiradoras”, criado em 2013, após Gina assistir a um vídeo de uma aluna que reproduzia estereótipos sexistas e objetificava as mulheres.

“Aquela imagem me incomodou profundamente”, diz.

Ela então decidiu agir, propondo a leitura de biografias de mulheres como Anne Frank, Malala, Carolina Maria de Jesus e outras grandes figuras femininas.

“Eu queria mostrar para as meninas que elas não precisavam se reduzir a objetos sexuais”, explica Gina.

O projeto cresceu, ganhou 19 prêmios e se espalhou para outras escolas do Distrito Federal, de Mato Grosso do Sul e até de Moçambique.

Em 2021, foi institucionalizado como política pública e hoje está presente em mais de 50 escolas. “Esse projeto é um movimento de resistência histórica das mulheres e está ajudando a democratizar o debate sobre igualdade de gênero nas escolas”, afirma, orgulhosa do impacto que causou.

Ao longo de sua carreira, Gina se dedica a transformar a escola em um espaço de inclusão, reflexão e valorização da identidade negra e feminina.

“A educação deve ser um meio de libertação”, conclui. Para ela, a luta não é apenas pela transformação das escolas, mas também pela construção de um futuro mais justo para as próximas gerações.

Por Diller Abreu

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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