Projeto social ensina tênis para pessoas em vulnerabilidade

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 Projeto social Tô no Jogo mostra que esporte também pode fazer parte da periferia

Raquete em mãos e olhos atentos na bolinha. O movimento feito para devolver o borrão amarelo ao lado adversário da quadra poderá ser decisivo para decretar aprendizado. O Projeto Tô no Jogo é focado no desenvolvimento mental e físico dos participantes, de forma que consigam aos poucos deixar para trás as dificuldades impostas por suas deficiências, sejam elas físicas ou intelectuais. Muitos dos alunos só tinham visto uma partida de tênis e conhecido o esporte pelo que assistiam na televisão. 

Mesmo tendo seu funcionamento interrompido em Brasília devido à falta de patrocínio, a iniciativa marcou a vida de todos que participaram dela, seja como aluno ou instrutor. No caso dos alunos, a oportunidade de entrar em contato com o esporte abriu portas para uma melhor qualidade de vida. 

As manhãs na Associação Pestalozzi, instituição responsável por ceder espaço para a realização das aulas, não têm sido mais as mesmas desde a paralisação do projeto. Trinta e seis alunos saiam de localidades periféricas como São Sebastião, Ceilândia, Vicente Pires e Riacho Fundo para aprender tênis. 

O objetivo do projeto é trazer saúde, diversão e esporte que contribuam também para que os alunos tenham a oportunidade de aprender no dia a dia através de uma raquete e bolinha

As aulas começavam com orientação dos educadores físicos Isabel Nabuco, de 52 anos, e Carlos Mavignier, de 37. “No caso dos alunos que estivessem mais agitados, eu sempre fazia um trabalho de relaxamento seguido de alongamentos para que eles pudessem se disponibilizar para as práticas. E com os que estavam com o ritmo devagar também era feito um trabalho de movimento e percepção do corpo”, explica a professora Isabel Nabuco.

Aluno do projeto há um ano, Walison Rodrigues, de 28 anos, é paratleta e sentiu-se acolhido pelos profissionais que ali dedicavam seu tempo para ajudá-lo de todas as formas. O estudante saia do Mangueiral, em São Sebastião, todos os dias para aproveitar ao máximo as atividades. A sua paixão de fato é o tênis.

Ele conta que as aulas de tênis na Pestalozzi foram as suas primeiras práticas esportivas, tendo em vista que, nos seus tempos de escola, não havia projetos como esse. Até então o esporte só existia para Walison na televisão e foi assistindo às partidas que começou a desenvolver sua paixão.  

Vídeo com entrevista de Walison Rodrigues sobre seu ídolo no tênis

Para Wallison, foi uma oportunidade de ouro poder fazer parte do universo do tênis. Ao falar sobre o projeto “Tô no Jogo”, ressaltou a importância da chance. “É uma sensação muito boa poder praticar. Eu só vejo pessoas com renda mais alta praticando e nós não temos esse acesso”, argumentou. 

Inspiração

Nada disso seria possível sem o sonho, a luta e o esforço da fundadora do Tô no Jogo, Cláudia Chabalgoity, 52 anos de pura história e inspiração. Foi tenista profissional e teve contato com o esporte desde os três anos de idade. Entre os anos de 1989 e 1999, participou de torneios internacionais e conquistou oito títulos. Um dos mais significativos, porém, é o projeto que criou.

“Depois que eu deixei de ser jogadora profissional, o que eu mais me dediquei foi o tênis adaptado para pessoas com deficiência”

Claudia Chabalgoity

A profissional foi responsável por desenvolver o tênis para cadeirantes no Brasil. “O interessante foi que toda a minha experiência no profissional foi depositada ali nas relações pessoais, o que fez uma grande diferença para mim. O social é minha alma: poder trabalhar oferecendo o esporte que eu amo”.

Claudia Chabalgoity, fundadora do projeto Tô no Jogo. Reprodução: Instagram

Enquanto coordenava o projeto, Cláudia se formou em psicologia no CEUB. Ao decorrer de seus estudos, ela constatou a possibilidade de expansão da iniciativa. “Durante meus estudos percebi que o Tênis poderia ser uma ferramenta para o desenvolvimento humano. A partir do curso decidi ampliar a proposta do Projeto incluindo pessoas com deficiência intelectual também, autistas e pessoas com síndrome de Down. E isso segue até os dias de hoje no projeto Tô no Jogo”.

Terapia e aprendizado

A educadora física e professora do projeto Tô no Jogo, Isabel Nabuco, 52 anos, já conhecia o trabalho especial de Claudia envolvendo cadeirantes no esporte e decidiu se juntar a ela nas aulas. “Conversávamos muito sobre essas práticas integrativas como a psicologia e terapias holísticas e ela quando criou o projeto Tô no Jogo me chamou para trabalharmos juntas usando essa abordagem, juntando o esporte com o meu trabalho de terapias alternativas que já faço há 16 anos”, lembrou Isabel.

O parceiro de trabalho de Isabel, Carlos Mavignier, 37 anos, conta que a humanidade e a socialização sempre foram pilares de seu trabalho no projeto, o que impulsionou as relações não só entre os estudantes, mas também entre os professores.

“Penso que meu trabalho dentro do Tô no Jogo agregou muito nas relações que foram criadas e nas interações entre os alunos, tudo isso foi sendo desenvolvido nas nossas aulas. E os alunos começaram a retribuir com uma grande vontade de aprender, de querer fazer parte daquele esporte”, explicou o educador. 

Professores Isabel e Carlos alegrando o dia de Wallison e demais alunos. Foto: Associação Pestalozzi/Divulgação

As aulas de tênis foram essenciais para a melhora constante dos alunos no esporte. A professora Isabel conta que aos poucos eles começaram a desenvolver técnicas de ganhar partidas e o que era antes uma simples troca de bola, acabou se tornando um comprometimento sério.

A diretora da Fundação Pestalozzi, Luciana Pinho, acredita que o projeto transformou o dia a dia dos alunos, auxiliando a capacitação física e mental dos alunos. 

Vídeo com entrevista Luciana Pinho sobre o efeito do projeto nas vida dos alunos

Falta de recursos paralisa as atividades 

O projeto é estruturado para não haver a necessidade dos alunos pagarem pelas aulas de tênis e o patrocínio é o que possibilita isso, pois muitos dos participantes da iniciativa são de famílias humildes que não possuem condições de arcar com o custo das aulas. 

”Nós trabalhamos através de patrocínios, pois a nossa proposta é mais social, de modo que os alunos não tenham a necessidade de pagarem pelas aulas do projeto. Então o ideal é que nós busquemos patrocínio e é uma busca incansável por investidores para que consigamos manter o projeto”, argumentou Claudia Chabalgoity. A falta de patrocínio paralisou o projeto.

A aluna Maria Helena Otaviana, 62 anos, moradora da Vila Planalto, possui deficiência intelectual moderada. Ela afirma sentir muita falta das práticas e pergunta aos professores quando o tênis voltará a fazer parte da sua rotina.

“A experiência para mim foi maravilhosa, gostei tanto que pergunto para os professores todos os dias quando as aulas de tênis irão voltar e acredito que quando voltarem, estaremos um pouco enferrujados e com certeza vamos precisar retomar muitas coisas”, explicou a aluna.  

A diretora da Fundação Pestalozzi, Luciana Pinho, também anseia pelo retorno das atividades e explica que a quantidade de aulas na semana contribui ainda mais para a felicidade e prazer de todos. 

A fundadora do Tô no Jogo, Cláudia, levou a ideia do projeto para outro estado, o Rio Grande do Sul, onde atua atualmente monitorando e ajudando nos trabalhos feitos na APAE (Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais).

Por Gabriel Romeiro e Gabriel Caram

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