No amanhecer, quando a cidade desperta para mais um dia, Rodilene Souza e o filho de 11 anos se levantam com os primeiros raios de sol, às 5h da manhã. A mãe de 42 anos enfrenta uma rotina de venda de alimentos em Vicente Pires.
Rodilene é conhecida nas ruas da região não apenas pelos alimentos que comercializa, mas também pela resiliência diante das dificuldades. Todos os dias, ao lado de seu filho, João Leandro, de 11 anos, ela se lança em uma jornada. A comerciante leva consigo não apenas os salgados, as quentinhas e os bolos que prepara, mas também uma força que desafia as adversidades da rotina.
Ela é mais do que uma comerciante que vende seus quitutes caseiros em frente a uma borracharia. Ela é mais uma mãe que não mede esforços para garantir o melhor para o filho.
Rodilene relata que todos os dias acorda às 5h da manhã com o filho. Por volta das 6h30, eles pegam o transporte público para chegar a Vicente Pires, perto de um viaduto movimentado da região administrativa. O pequeno acompanha a mãe no comércio até a hora de ir para a escola.
“Todos os dias, eu e Leandrinho viemos para Vicente Pires de ônibus. Saímos de Sobradinho para vender nossos alimentos aqui. Por volta das 11h30, meu filho precisa pegar um outro ônibus para ir para a escola que fica em Taguatinga enquanto eu continuo vendendo os produtos o máximo que eu puder”, relata Rodilene.
Após a escola, o filho retorna de Taguatinga e vai até Vicente Pires sozinho. De lá eles pegam novamente um outro ônibus para voltar para casa em Sobradinho. Quando chegam ao lar, ainda não é hora de descansar. A cozinha já aguarda a mãe que precisa preparar os alimentos para os clientes do dia seguinte.
A principal renda de Rodilene hoje é a vendas de seus alimentos. Segundo ela, ser dona de casa não é uma opção, visto que ela se divorciou do marido há 3 anos.
“Eu até poderia ficar em casa para receber a pensão, mas prefiro estar aqui, garantindo o sustento da nossa família e proporcionando um futuro melhor para o Leandro”.
“Às vezes é difícil, mas vale a pena”, confessa Rodilene. “Ver o brilho nos olhos do meu filho compensa todas as noites mal dormidas e os dias de trabalho”.
Ao perguntar sobre os sonhos de João, o garoto diz que almeja virar bombeiro e planeja orgulhar a mãe por todo o esforço dedicado em sua criação.
Auxílios
Segundo o Ministério da Mulher, existem políticas, programas e ações de cuidado que são desenvolvidos nas três esferas de governo. Os programas criados incluem: serviços educacionais (creches, pré-escolas e escolas de ensino básico); instituições que atendem pessoas idosas ou com deficiência; serviços de saúde; benefícios monetários: salários maternidade, regras diferenciadas na aposentadoria.
O Ministério afirma que existe uma proposta que ainda está sendo elaborada de Política e de Plano Nacional de Cuidados em parceria com o Ministério do Desenvolvimento e da Assistência Social, Família e Combate à Fome que visa reduzir a sobrecarga de trabalho enfrentada pelas mulheres, garantindo condições para que possam conquistar sua autonomia econômica. Os dois projetos devem compreender tanto as necessidades de quem recebe cuidados, quanto de quem cuida.
Extensão
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmou que, em 2018, no país, as mulheres ainda são maioria em ocupações consideradas como uma extensão das tarefas domésticas e de cuidados, como saúde, educação e trabalho doméstico. Segundo o levantamento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), cerca de 70% das mulheres no país estão ocupadas nessas atividades.
Além disso, foi divulgado que as mulheres recebem, em média, salários menores do que os homens para as mesmas funções ou ocupações. Embora o Brasil tenha uma legislação que assegura a igualdade salarial, as estatísticas mostram que, ao longo das últimas décadas, praticamente se manteve inalterada as diferenças salariais.
Fiscalização
A intensificação das fiscalizações têm gerado um debate acalorado entre comerciantes e autoridades, com opiniões divididas sobre a melhor forma de conduzir o processo.
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF), todos que desejam comercializar seus produtos devem seguir as regras. “Nosso objetivo é garantir que todos os comerciantes, tanto formais quanto informais, sigam as mesmas regras. Isso não apenas preserva a segurança dos consumidores, mas também promove a justiça entre os comerciantes”, explica a secretária.
De acordo com dados da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis), mais de 150 vendedores ambulantes foram abordados até o final de maio, resultando em 45 autuações e 10 apreensões de mercadorias irregulares.
As principais infrações encontradas foram a falta de licença para atuação, produtos alimentícios sem condições adequadas de higiene e ocupação irregular de espaços públicos. A vice-presidente do Sindvamb-DF, Cristiane Carvalho Mendes, se preocupa com a forma como as fiscalizações estão sendo conduzidas. Ela acredita que se mal feita, a fiscalização pode prejudicar pessoas no sustento de casa.
“Entendemos a necessidade de regulamentação, mas muitos dos nossos associados estão sendo penalizados de forma desproporcional. Precisamos de mais apoio para regularizar nossas atividades e menos ações punitivas”, argumenta.
O DF Legal também atua na legalidade de documentos e dados do empreendedor. “Basicamente o trabalho funciona da seguinte forma: aborda o ambulante e pede a licença. São verificados os dados e, se tudo estiver de acordo, a fiscalização termina”, explica a pasta.
É crucial que iniciativas governamentais como as propostas pelo Ministério da Mulher e parcerias com outros órgãos se desenvolvam efetivamente, oferecendo suporte real às mulheres que sustentam seus lares com tanto esforço. A regulamentação adequada, como enfatiza o DF Legal, deve equilibrar a fiscalização necessária com o apoio para regularização das atividades comerciais, evitando penalizações desproporcionais que possam prejudicar quem busca apenas sustentar suas famílias de forma digna.
Assim, a história de Rodilene e João Leandro não é apenas um testemunho de resiliência pessoal, mas também um chamado à reflexão sobre a importância de políticas públicas que apoiem e valorizem o trabalho árduo e dedicado das mulheres brasileiras.
Por Caio Figueiredo, Danilo Bergamini e Diogo Medeiros
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira