No Brasil, estudar ainda é um privilégio. A cada edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), milhões de jovens enxergam na prova uma chance de mudar de vida, o passaporte possível para a universidade, o primeiro degrau de uma carreira, a promessa de ascensão social.

Mas essa promessa, para muitos, continua distante. Em escolas públicas de todo o país, faltam professores, materiais didáticos e até cadeiras; sobram salas lotadas, jornadas duplas e um sistema que exige esforço desproporcional de quem parte atrás.
De acordo com o Censo da Educação de 2023, apenas 30,5% dos brasileiros entre 18 e 24 anos estão matriculados em algum curso formal. A estatística esconde histórias de desistência silenciosa, de jovens que abandonam os estudos por falta de tempo, dinheiro ou motivação.
Outros, mesmo permanecendo na escola, enfrentam um cotidiano em que aprender se torna um desafio: a distância entre o conteúdo ensinado e a realidade vivida é grande, e o apoio individual é quase inexistente.
O resultado aparece nos números do Enem: a média de desempenho dos alunos da rede pública segue muito abaixo da dos estudantes da rede privada, o que reproduz e aprofunda desigualdades históricas.
Diante desse cenário, a tecnologia surge como promessa e dilema. De um lado, representa uma possibilidade de democratização do acesso ao conhecimento; de outro, enfrenta o obstáculo concreto da desigualdade digital, falta de internet, de dispositivos, de tempo. É nesse espaço entre o ideal e o real que surgem iniciativas que tentam aproximar a educação das novas gerações. Entre elas está a SimpleStudy, plataforma irlandesa que chega ao Brasil com a ambição de tornar o estudo para exames mais acessível e eficiente.
Uma escola no bolso
Fundada em Dublin, a SimpleStudy nasceu em 2018 com o objetivo de simplificar a preparação para exames nacionais na Irlanda. Em poucos anos, tornou-se uma das plataformas educacionais mais populares entre estudantes do ensino médio, combinando resumos, quizzes, simulados e trilhas de estudo personalizadas. Agora, o desafio é traduzir essa experiência para um país de dimensões continentais, desigualdades profundas e um dos maiores exames padronizados do mundo: o Enem.
Para o cofundador Philip McKenna, a chegada ao Brasil é tanto um passo de expansão quanto um compromisso social. “Queremos oferecer ferramentas de estudo de alta qualidade para todos, independentemente da condição econômica. Um estudante da rede pública deve ter a mesma oportunidade de se preparar adequadamente para o Enem que um aluno de escola particular”, afirma.
A proposta é que o estudante tenha, literalmente, “uma escola particular no bolso”. O aplicativo oferece planos de estudo dinâmicos, adaptados ao ritmo e às necessidades de cada aluno. A tecnologia de inteligência artificial identifica os temas em que o usuário apresenta maior dificuldade e reorganiza os conteúdos com base nesse desempenho. A gamificação, sistema de recompensas e desafios, busca manter o engajamento, transformando o estudo em uma sequência de pequenas conquistas.
Preparação adaptada ao Enem
A adaptação da SimpleStudy ao contexto brasileiro envolveu a revisão completa do currículo e a inclusão de materiais específicos para o Enem desde questões anteriores até simulados alinhados à Matriz de Referência do Inep. A equipe de conteúdo trabalha com educadores locais para ajustar a linguagem, referências culturais e até mesmo o tipo de exemplo usado nos exercícios.
“O Enem não é apenas uma prova de conteúdo, mas de interpretação e aplicação prática do conhecimento”, explica McKenna. “Nosso foco foi criar uma experiência que valorize o raciocínio e o contexto, e não apenas a memorização.”
A plataforma também busca dialogar com as condições reais de estudo de milhões de brasileiros. Para quem divide o dia entre o trabalho e a escola, estudar no celular pode ser a única opção. Por isso, o aplicativo foi projetado para funcionar em conexões instáveis e permitir que o aluno baixe conteúdos para acessar offline.
A aposta é que, ao oferecer flexibilidade e estrutura, a SimpleStudy se torne uma aliada de quem quer estudar, mas não tem acesso a aulas de reforço ou materiais completos. O formato de microlições, blocos curtos de conteúdo com objetivos claros permite que o estudante avance mesmo com pouco tempo disponível.
MEC Enem
Paralelamente, o Ministério da Educação (MEC) lançou o aplicativo “MEC Enem”, que permite aos estudantes realizar simulados completos do exame, com correção automatizada das questões objetivas e da redação.
A ferramenta oferece experiência real de prova, cronômetro, possibilidade de enviar redação manuscrita e receber feedback instantâneo da inteligência artificial em até 60 segundos. Segundo o MEC, o aplicativo é destinado a todos os estudantes, especialmente egressos do ensino médio, participantes de cursinhos populares e beneficiários do Pé-de-Meia.
O funcionamento do MEC Enem é simples e direto: o aluno acessa o site ou aplicativo, faz login com uma conta Gov.br, escolhe a área de conhecimento que deseja praticar e realiza o simulado.
A inteligência artificial corrige automaticamente e oferece sugestões de melhoria, permitindo que o estudante acompanhe o progresso em tempo real. A iniciativa mostra que o governo também aposta em soluções digitais para democratizar a preparação para o Enem, embora de forma mais padronizada e voltada à prática de provas.
Desafios e resistências
Entrar no Brasil, no entanto, significa enfrentar um ecossistema educacional complexo, marcado por políticas públicas fragmentadas, diferenças regionais e realidades socioeconômicas contrastantes. Enquanto em grandes centros o acesso à tecnologia avança rapidamente, regiões rurais e periféricas ainda sofrem com a falta de infraestrutura básica.
Para McKenna, compreender essa diversidade é parte essencial da estratégia. “A educação não é uniforme, e o Brasil é um país de muitas vozes. Nosso desafio é escutar e adaptar trabalhar junto a escolas, professores e estudantes para entender o que realmente funciona.” Parcerias com instituições locais, públicas e privadas, estão no horizonte da empresa como forma de legitimar e ampliar o alcance da iniciativa. “Não queremos substituir o trabalho de ninguém. Nosso papel é somar, oferecer um apoio que complemente o que a escola já faz”, afirma.
Mesmo assim, há resistências. Parte dos educadores teme que a popularização de plataformas digitais reforce a lógica da automação e da individualização extrema, afastando o aluno da convivência escolar. Especialistas ponderam que, embora a tecnologia seja ferramenta valiosa, ela só produz resultados duradouros quando combinada a políticas de inclusão digital e formação docente.
Caminhos para uma educação mais justa
Tanto a SimpleStudy quanto o MEC Enem refletem a crescente aposta na tecnologia como caminho para ampliar oportunidades e democratizar o acesso à educação. Enquanto a SimpleStudy aposta na personalização e engajamento contínuo, o MEC oferece simulados estruturados e feedback instantâneo, combinando práticas tradicionais com inteligência artificial.
Ainda que a tecnologia não seja solução completa, ela representa uma ferramenta estratégica para apoiar estudantes que enfrentam desafios no percurso escolar e sonham com o ensino superior. Como diz McKenna: “Se conseguirmos ajudar uma parcela desses jovens a alcançar o ensino superior, já teremos cumprido parte da nossa missão.”
Por Natália Santos
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira