Em 2015, segundo o IBGE, há comprovação de que a maior parte das agressões físicas e verbais foram em razão da aparência do corpo.
É o caso de um estudante de 15 anos que mora em Águas Claras. O adolescente preferiu não ser identificado, mas revelou as agressões físicas e morais que sofreu dentro de um colégio em Taguatinga em 2009. Em um dia, em horário de intervalo, três alunos levaram o garoto para um local isolado e lá o atacaram. A vítima tentou reagir, mas um quarto agressor surgiu e imobilizou o menino que, na época, tinha 8 anos, com um pneu. As crueldades foram além. O grupo obrigou a vítima a abrir a boca e a encheram de pedras artificiais para que ele não conseguisse pedir socorro. “Eu só não morri porque o sinal do fim do intervalo tocou”, relembra. “Eu não tinha muitos amigos e era o querido pelo professor. Por causa disso um pessoal da minha sala não gostava nenhum pouco de mim”, explica.

Ao chegar em casa, a mãe notou os roxos no corpo do filho. Preocupada, ela procurou a escola. Os agressores, no entanto, só foram punidos com advertências. Desde então a luta contra o bullying tornou-se constante na casa do menino. No ano seguinte, em2010, ele mudou de escola e tomou fôlego para enfrentar os novos desafios. “Minha mãe esqueceu com o tempo. Acho que ela não se lembra de mais nada, mas eu me lembro de tudo, porque é o que uso para criar forças para tudo que ainda vai acontecer na minha vida”.
A capital do país foi considerada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como a capital do bullying em 2010. Em razão dos altos índices de ocorrência, principalmente em escolas particulares, as humilhações e provocações revelam uma estatística crescente nos últimos anos. Cenário que aterroriza crianças, adolescentes e jovens. Segundo a pesquisa, em 2012 os casos de bullying foram mais frequentes em pessoas do sexo masculino, tanto como agressor quanto como vítima.

Segundo a psicóloga Caroline Martins, muitas vezes o lugar em que mais ocorrem casos de bullying é o próprio ambiente social de trabalho, escola, amizades e família. Segundo ela, mulheres acima do peso na fase da adolescência, entre 13 à 16 anos, são as principais vítimas. “O padrão estético imposto pela sociedade afeta a autoestima e provoca o aumento dos índices de bullying, principalmente no sexo feminino”, esclareceu.
A psicóloga ainda afirma que o trauma do bullying é o início de um processo dolorido que envolve autoestima baixa, alterações comportamentais, isolamento, depressão, anorexia, bulimia, distúrbios de imagem e dores no estômago. Na visão da especialista, a ajuda de um psicólogo é fundamental para a reconstrução da imagem da vítima, além do auxílio no aprendizado das formas de crianças e adolescentes lidarem com o bullying e retornarem à interação social. “Ao observar meus pacientes percebi que quanto mais frequente é a presença em terapias maiores resultados são obtidos”, destacou.
A educadora Ana Maria Miranda observou a quantidade de casos de bullying em escolas. Segundo ela, as ocorrências não distinguem os sexos das vítimas, mas ocorre com mais frequência na adolescência. Na visão dela, o colégio também é fundamental na luta contra o bullying “Quando a escola é comprometida, ela faz projetos e movimentos de estratégia para alertar e conscientizar os alunos”, explica. Para Ana Maria, o cuidados dos professores também é importante “Muitas vezes eles acabam omitindo cuidado por achar que tudo é brincadeira”, alerta.
Cyberbullying
Com o crescimento da tecnologia cresceu, também, os casos de cyberbullying. Ele é um tipo de bullying praticado contra alguém virtualmente. A violência virtual se torna ainda mais ameaçadora por ser silenciosa. Como existe a possibilidade de fazer agressões virtuais de forma anônima, fica mais difícil encontrar o agressor.
Uma estudante de 20 anos de Valparaíso (GO), distante aproximadamente 40 quilômetros de Brasília, enfrentou o caso em 2010 na antiga escola. Aos 13 anos ela cursava o 8° ano do ensino fundamental e começou a ter um relacionamento com outro estudante do colégio. Por causa da popularidade do adolescente na escola, ela passou a ser perseguida. De início algumas colegas praticavam bullying por meio de ofensas verbais.
A situação, no entanto, chegou ao limite quando ela foi convidada a participar de uma rede social criada para publicar fotos ofensivas a ela. Foi quando a estudante criou coragem para compartilhar com a família. “Minha mãe ficou logo irritada com a agressão mas, a princípio, não demos importância, pois enxergamos, inicialmente, como coisa de criança”, relata.
Mas as perseguições continuaram a ponto de os suspeitos tentarem agredi-la fisicamente. “Eu tinha receio de ir a escola”, relembra. Por causa do medo, ela tomou coragem de, junto à mãe, registrar ocorrência na delegacia de polícia. A família também procurou o Conselho Tutelar.
A polícia iniciou uma investigação até descobrir quem eram as pessoas que tinham feito a página na rede social com ofensas e fotos da vítimas. Após reunir os responsáveis, foi determinado que eles mantivessem distância da menina e que parassem com as perseguições. “Essa situação me ajudou a ver que nem tudo são flores. Me deixou uma marca, porque, querendo ou não, as agressões vieram de ‘amigos’. Aprendi que não podemos confiar em todos”, ressalta.

As psicólogas Patrícia Rosa e Ursula Alves se assustaram com uma pesquisa que fizeram em uma instituição de ensino. “Fizemos uma palestra sobre bullying em uma escola e os alunos eram do ensino fundamental. Perguntamos a eles quem praticava bullying e ficamos surpresos com o número de pessoas que levantaram a mão”, conta Patrícia. As especialistas confirmaram que o maior número de casos acontece entre os adolescentes. Segundo elas, o tratamento é fundamental para que a vítima não entre em depressão e não se sinta culpada.

Outro caso de cyberbullying aconteceu com um homem de 36 anos que também mora em Valparaíso e preferiu não ser identificado. Ele conta que foi alvo de críticas destrutivas e difamações de pessoas que estavam junto à ele em um encontro religioso. Após ministrar um momento de louvor, algumas pessoas, insatisfeitas com a forma com que o homem conduziu a oração, passaram a usar um grupo de mensagens instantâneas no celular para atacá- lo direta e indiretamente. “Falavam tudo nas entrelinhas para não agredir diretamente, mas sabia que era para mim, até porque, fora do grupo, outras pessoas foram mais duras e confirmaram que as indiretas eram, de fato, relacionadas a mim. Mas preferi silenciar”, destaca.
As trocas de mensagens difamatórias impactou a vida dele. O homem desenvolveu um trauma que, com o apoio de amigos e pessoas próximas, ainda tenta lidar com o sofrimento. “Isso abalou minha estrutura emocionalmente. Tive sonhos ruins a noite, não conseguia dormir e, socialmente, foi muito difícil reencontrar essas pessoas na comunidade”, conta.
Por Paula Beatriz, Alice Vieira e Lizandra Costa
Sob supervisão da professora Isa Stacciarini