A Copa do Mundo deixou para os brasileiros 12 estádios novos em folha, no “padrão FIFA”. Uma estética sofisticada, material de primeira qualidade, maior capacidade e a promessa de mais segurança são elementos que entram nesse padrão. Entretanto, o professor de sociologia do esporte Luiz Otavio, de 57 anos, acredita que algumas das características do Estádio Nacional Mané Garrincha pensadas para a Copa acabam favorecendo os atos violentos. “Não existe uma dinâmica na movimentação de pessoas dentro do estádio, assim como faltam divisões físicas entre as torcidas e a pouca vivência com jogos de massa por parte das equipes de segurança”.
Para o sociólogo Antônio Testa, de 65 anos, as organizadas são grupos sustentados pelos cartolas que os protegem. O sociólogo acrescentou que as torcidas locais do DF ainda não atingiram o grau de agressividade das de outros estados, entretanto, seria uma questão de tempo. “Os clubes devem ser responsabilizados sim e podem tentar ajudar o problema por meio de decisões das diretorias que fomentam e financiam as organizadas”.
Testa acredita que a solução seria o mesmo tratamento que o governo inglês deu aos Holligans, nome designado a torcidas organizadas e violentas, nos anos 80. “Os torcedores violentos deveriam ser impedidos de entrar aos estádios”.
O professor de sociologia do esporte Luiz Otavio disse que a violência está presente nos estádios por vários motivos. Segundo ele, o ambiente de um estádio durante uma partida se torna propenso à violência por se tratar de uma situação onde milhares de pessoas estão juntas no mesmo espaço, envoltas por uma excitação e por um estado de êxtase coletivo, que deixam as pessoas com a emoção a flor da pele. “Existe uma situação de construção de uma identidade coletiva muito forte. A violência tem muito disso, você nega o outro e busca se afirmar.”
O sociólogo apontou um esvaziamento cultural e coletivo muito grande por parte dos torcedores e lembrou uma declaração de um membro de torcida organizada que o impressionou. “Questionaram ele sobre pessoas que se machucam ou morrem em brigas de torcidas; ele disse que se não for amigo dele não tem problema não” . Segundo Otavio, o problema é que os agentes presentes em um estádio de futebol não são capazes de controlar torcedores em ebulição.
Policiamento, barreiras físicas e até prisões são atitudes que buscam resultados a curto prazo, para o sociólogo, que enxerga a utilidade de tais ações e reconhece, ainda, a necessidade delas. “Claro que a curto prazo a repressão é a melhor saída, mas devem existir também ações de médio e a longo prazo.”
Entretanto, defende também que deveriam existir planos estratégicos para evitar ações violentas. Para isso, a melhor saída seria uma boa comunicação entre todos os envolvidos no funcionamento de uma partida. “Vários agentes sociais devem se reunir com o ministério público, os clubes, secretaria de segurança, federações e confederações, as organizações das torcidas organizadas”, ratificou o especialista. De acordo com o especialista, um aspecto importante para a solução do problema seria buscar o apoio das lideranças das organizadas. “Esses líderes tem certa autoridade sobre os membros de uma torcida, então trazê-los para a discussão é uma forma de incentivar mudanças influenciadas pelas próprias torcidas”.
Associação
O presidente da Associação Nacional de Torcidas Organizadas (ANATORG), André Azevedo, de 36 anos, afirmou que a organização não tem o intuito de ditar regras e que as punições cabem a cada liderança das torcidas. “Promovemos a conscientização e a fomentação de diálogo. Abrimos discussões sobre o que pode ser melhor para todos diante de alguma situação”.
A ideia de acabar com as torcidas organizadas irrita o presidente da associação. Para ele, ao invés de resolver o problema, estaríamos empurrando para outro setor. “A torcida organizada também é extensão da violência social que presenciamos hoje no Brasil. O mau torcedor é o mau cidadão”, alegou.
Proibir a entrada de organizadas no estádio não é uma boa decisão, segundo André. Ele cita a prestação de um serviço para as autoridades e a referência de responsabilizar alguém como tarefas proporcionadas pelas organizadas. “A violência não acabará se proibirem as organizadas. Quem o poder público vai culpar depois? Quem briga não é o torcedor organizado, é o torcedor”.
Torcedor
O estudante e participante de torcida organizada Breno Monteiro, de 21 anos, acha que banir as organizadas não vai melhorar a segurança nos estádios. “A partir do momento que se bane uma torcida, proíbe-se essa torcida de levar seus materiais. Mas o torcedor que briga ainda vai estar lá, porém descaracterizado”, argumentou.
Breno já presenciou conflitos dentro de um estádio e destacou o papel da própria equipe de segurança do jogo na ocorrência de brigas, como na falta de demarcações e de divisões entre as torcidas. “O Mané Garrincha é ‘padrão FIFA’, todo monitorado por câmeras e, mesmo assim, os baderneiros conseguem dar a volta no estádio e a segurança não faz nada”.
O torcedor realçou que os torcedores organizados que brigam em jogos de futebol são uma minoria e disse que eles usam a torcida para praticar atos ilícitos. “Não os vemos como torcedores, mas como bandidos”.
Por João Victor Bachilli e Arthur Menescal