Presidente da Federação Nacional de Jornalistas diz que machismo ameaça profissionais

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A violência se apresenta para as profissionais da notícias em várias faces, do assédio pelas redes às ameaças físicas. Segundo a presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Samira de Castro, a situação preocupa a categoria.

 fonte: arquivo pessoal

Paradigmas

Samira conta que, no início de sua carreira como repórter, o caminho não foi nada fácil. Além dos riscos da exposição, era também uma mulher, nova, num ambiente predominantemente masculino, a editoria de economia.

“Algumas fontes, principalmente, até alguns colegas e chefes, sempre questionavam qual era a minha capacidade de estar nesse espaço pelo fato de eu ser mulher, não por formação profissional Por ser mulher e jovem”, diz.

O relato de Samira não é algo isolado.

De acordo com uma pesquisa conduzida, entre junho e agosto de 2017, pelo portal Mulheres no Jornalismo, uma iniciativa conjunta entre a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e a Gênero e Número, aponta que 65,7% das jornalistas que responderam à pesquisa, afirmaram ter tido sua competência questionada ou visto uma colega ter sua competência questionada por colegas ou superiores.

Também é válido ressaltar que a maioria desses ataques ocorrem em editoriais majoritariamente masculinos, como: esportes, economia, política.

Pessoal ou profissional

As críticas são partes de qualquer trabalho, principalmente na comunicação. Entretanto, quando se trata de jornalistas mulheres, a linha entre o profissional e pessoal é cruzada, onde as críticas acabam se tornando ofensas pessoais, como o caso da jornalista Gabriela Biló.

Para Samira, além de estar ligado ao viés político, esse comportamento também traz consigo um alto grau de misoginia e machismo.

“A mulher jornalista não é desqualificada única e exclusivamente se ela errar numa matéria. Se ela fizer uma apuração que deixe margem para algum tipo de crítica ­— crítica é diferente de violência. Mas ela é sempre inferiorizada pelo fato de ser mulher. Então, ela é chamada de burra, ou ela é chamada de incompetente, sem que seja apontado qual é a incompetência dela”, explica a presidente.

Justiça

Atualmente, os meios de comunicação e as redes sociais, permitem uma denúncia e uma exposição um pouco mais independente, diferentemente da década de 90 e o início dos anos 2000.

Os casos de denúncia não obtinham resultados positivos em sua maioria, segundo Samira, que compartilhou sua experiência pessoal como testemunha.

“Dentro das redações, os casos de mulheres que denunciaram, minhas colegas que denunciaram, já nos anos 2000, assédio, inclusive sexual, elas é quem foram demitidas. Teve um caso de uma colega que teve fotos íntimas expostas por um colega da redação. Eles tiveram um relacionamento, o relacionamento terminou, ele mandou as fotos para os outros colegas da fotografia pelo celular”.

O profissional foi denunciado. Ela foi demitida e o homem continuou na empresa.

QUIDADE?

Os movimentos dedicados a mitigar a violência de gênero, e conscientizar acerca da pauta, evidenciam o seu interesse em atingir um patamar de equidade dentro do jornalismo.

Porém, segundo um levantamento conduzido pela Reuters Institute, o número de mulheres em posições de chefia em redações, no Brasil, não passava de 23% em 2024.

“A nossa atuação é muito é com medidas internas. Por exemplo, a Fenaj aprovou uma cota de 30% das suas dirigentes serem mulheres. Antes não tinha essa cota. A FENAJ tem mais de 70 anos, e eu sou terceira primeira mulher a presidir a Federação”.

Ela diz que é preciso que mais mulheres ocupem esses espaços dentro do movimento sindical. O estímulo veio da própria federação, da sua cota para mulheres na direção, da sua cota para negros e negras, para indígenas.

“A gente tem investido muito em capacitar mulheres para atuar no movimento sindical, para atuar em cargos de liderança e de chefia dentro das suas próprias redações”, adiciona.

Violência de gênero

Dados do projeto “Violência de gênero contra jornalistas”, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), apontam que 71 ataques foram registrados até novembro de 2023. Dentro desses ataques, 91.5% das vítimas eram mulheres. Assim como em 36.6% dos casos, os jornalistas estavam cobrindo política.

Ainda apontado para a política, os dados fornecidos pela Abraji mostram o aumento de 250% nos ataques contra mulheres jornalistas em setembro de 2022, registrando 28 alertas ao longo do mês, totalizando a marca de quase um alerta por dia. O aumento ocorreu no período eleitoral, onde havia grande tensão e comoção, na disputa pela presidência.

Para Samira, o cenário hostil para mulheres na política está, majoritariamente, associado aos discursos de ódio propagados pela vertente de extrema-direita. “Todas essas camadas fazem com que a extrema-direita, que utiliza as redes sociais para atacar em massa, prefira atacar mulheres jornalistas. Eles atacam as feministas, atacam as professoras, as professoras universitárias, as cientistas, e atacam as mulheres jornalistas, se valendo do pseudo-anonimato das redes sociais”, expõe a profissional.

Também em cenário político, Samira exemplifica seu ponto de vista com a situação ocorrida entre o ex-presidente Jair Bolsonaro, e a jornalista Patrícia Campos Mello.

O político insinuou que a jornalista oferecia sexo em troca de informações para a reportagem, acusação esta que o condenou a indenizar a jornalista em R$ 20 mil.

Luta constante

Samira de Castro reforça que é uma luta constante, feita não somente para a geração atual. Ela também reforça a importância das boas práticas por todos os colegas de profissão, não somente pelas mulheres e integrantes destes movimentos.

“Quem está dentro de qualquer espaço de produção de jornalismo e de comunicação, tem que ouvir uma mulher falar deixar ela falar, não interromper e não explicar tudo que ela disse com as suas próprias palavras.” explicou. 

Por Maria Eduarda Barros

Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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