A rapper brasiliense Emanuelly Mendonça, de 18 anos, que tem nome artístico de Mary Jane, defende a necessidade de que as mulheres tenham protagonismo nas batalhas de rima. A arte, no entender dela, deve ser ferramenta a todo tipo de opressão.
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Ela começou nessa modalidade quando estava no início do ensino médio. A rapper Mary Jane começou na “Batalha do Setor”, no setor leste da L2 Sul, na Asa Sul
Como recorda a jovem, o evento continha a presença de rappers de diversas cidades e até mesmo de outros estados, algo que explica ter incentivado diversos colegas da escola. “E um dos alunos acabou sendo eu”.
Desde então, Emanuelly participa de competições de rap há três anos. Com os cabelos ruivos, e uma aparição viral na internet no cosplay de Homem-Aranha, surgiu o nome artístico: Mary Jane.
“No quesito treinamento, é realmente sobre aparecer na batalha, entender como é que funciona e colocar o beat em casa.”
Há quem pense que fazer rap é algo simples, mas Mary Jane deixa claro que no começo “não conseguia fazer um verso”. Foi apenas com a experiência ao longo dos anos em competições que melhorou no improviso.
Representatividade
O impacto é observado diretamente no público que frequenta tais eventos culturais. “90% [do público] é masculino, as mulheres não ocupam quase nem 10% em nenhuma batalha [de rima] do DF a não ser a que elas mesmas organizam com as garotas”, relata.
De acordo com a pesquisa mais recente sobre as estatísticas da representatividade feminina no rap brasileiro, “O funk e o rap em números: participação na indústria cultural” realizada em 2022 com dados da distribuidora musical ONErpm, e publicada na revista Itaú Cultural, a representatividade de mulheres é de apenas 8%, aponta a pesquisa.
Preconceitos
Emanuelly também confessa que já experienciou preconceitos de gênero por “pessoas de fora que acham que batalha é por hype (maior tendência) e acabam se inspirando em gente que fala algum tipo de preconceito de forma engraçada, como se fosse gastação”.
No rap, contudo, esse tipo de má conduta não é menosprezada.
“Punições são aplicadas a quem desrespeitar o oponente, podendo ser banido de toda cena independente da batalha e de onde seja”, reforça.
Mesmo com todos os desafios e episódios de discriminação, Mary Jane não deixou com que essas adversidades definissem sua trajetória nas batalhas, onde se sente mais acolhida.
Inclusão
Atualmente, Emanuelly se mantém bastante ativa na Batalha do Galdino, que ocorre na Praça Índio Pataxó Galdino Jesus dos Santos, na quadra 704 da Asa Sul, todas as quinta-feiras, a partir das 19h.
O grupo é um dos que oferecem vagas de participação garantida para as mulheres que desejam trocar raps ou apenas recitar poemas.
Durante a troca de rimas, é normal que o MC (acrônimo para Mestre de Cerimônia) acrescente “ensinamentos” nas letras com o intuito de denunciar as questões políticas e sociais vividas por eles ou não.
Assim, a jovem reflete que há uma diferença entre as abordagens feitas durante as competições por mulheres e homens. “As perspectivas, os ensinamentos e as vivências que nós trazemos não são vividas na pele pelos homens”, diz
A rapper também reforça que qualquer indivíduo é bem-vindo a participar do movimento artístico independente de seus status social, formação acadêmica, raça, gênero ou sexualidade. “É algo que você vai aprender além da batalha em si”, incentiva.
Emanuelly também ressalta que, apesar do rap ser um hobbie de expressão livre, para algumas pessoas, as rimas carregam um significado muito mais profundo – a luta contra discriminações e vícios.
“Tem gente que se livrou das drogas, ou buscou uma forma de trabalho e não foi julgado pela sua cor de pele, sua aparência, sua estatura social.”
“Tem gente que nunca conseguiu ser abraçado em lugar nenhum e encontrou um abrigo aqui [nas batalhas de rima]”, diz Emanuelly.
Batalha do Galdino na Praça Índio Pataxó Galdino Jesus dos Santos / Crédito: Maria Paula Valtudes
Divulgação de rapper
Uma forma que os grupos de rap encontraram de expandir as atividades que realizam, como explica Emanuelly, foi por meio do uso das redes sociais como estratégia para divulgação de ambos projetos e artistas.
“Toda batalha tem a sua rede social para poder divulgar e todo MC tem seu flyer, como se realmente fosse um show.”
A Batalha do Galdino, como diversas outras ao redor do DF, conta com instagram e canal no youtube. Logo, mesmo que alguém não possa comparecer presencialmente às batalhas, essa pessoa pode assistir às gravações do evento.
Para os amantes do rap que desejam acompanhar mais de uma batalha de rima, a MC tranquiliza ao informar que o evento cultural ocorre diariamente no DF devido a variedade de grupos de rap.
“Todos os dias da semana: segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo, vai ter alguma batalha”.
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Por Maria Paula Valtudes e Maria Clara Batista
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira