
Dores de cabeça, alterações na pressão, “moleza” no corpo e tantas outras queixas são trazidas diariamente, até os cuidados de Ana Rodrigues da Silva, 76 anos, que é benzedeira desde os 12.
Moradora de Planaltina-DF, Dona Ana -como é chamada- atende pessoas de todo canto do DF, como de outros estados. Ela conta que a avó, descendente de índios, era benzedeira, e parteira, de quem ela acredita que herdou a sensibilidade e o dom para ajudar as pessoas por meio da fé e conhecimentos sobre o poder curativo de plantas e chás. “ Fui até ela, comecei a orar com meu rosário e fiz o parto.”, conta sobre um dos partos que fez, nos quais sempre acompanhava mãe e filho para exames posteriores nos hospitais, onde era elogiada pelo trabalho.
Sabedoria
Responsáveis por curas e alívio das mais diversas aflições em crianças e adultos e animais, as benzedeiras ou rezadeiras são também guardiãs de uma tradição que contraria o tempo e o esquecimento da memória popular, trazendo consigo um conhecimento riquíssimo, acerca de propriedades curativas das plantas, originário das culturas africana e indígena. A prática independe do posicionamento religioso.
Donas de um saber único, as rezadeiras priorizam a concentração na oração e na pessoa ou animal por quem se está rezando. O ofício é praticado tanto por homens quanto mulheres, independentemente da idade, e trata-se basicamente de uma oração, a ser determinada pelo benzedor e de acordo com a queixa do assistido, além do acompanhamento com ervas e chás medicinais e orientações quanto ao bem-estar . Há dias e horários ideais para os procedimentos, como os fins de semana, que a benzedeira explica serem reservados às “criação”, e os pedidos pela saúde dos animais são feitos junto a São Lázaro.
O Rosário, da fé católica, e as ervas são instrumentos nas orações de Ana. Folha santa, hortelã, arruda, sabugueiro e sucupira estão entre as principais plantas utilizadas no preparo dos chás que auxiliam no tratamento, até a cura desejada.

Gratidão
Ao ter a primeira filha, a paraibana Maria de Fátima, 56 anos, sempre levava a bebê, Tâmara, para ser benzida por Dona Ana, a quem conheceu 29 anos atrás. A queixa mais frequente era o famoso “quebranto” ou quebrante, um tipo de mal estar e torpor físico, comum em crianças de colo, mas que não escolhe idade e, segundo a crença popular, é causado por mau-olhado e pela proximidade a pessoas que trazem consigo energias negativas. Para esse e outros problemas, as rezas da velha amiga sempre davam solução. “ Com cinco anos de idade a Tâmara adoeceu e os médicos não entendiam o que ela tinha, e a menina não melhorava.” preocupada, a mãe levou-a para a rezadeira, que explicou : a pequena estava “aguada” (por ter um “desejo” de cunho alimentar não satisfeito, a pessoa apresenta indisposição e diarreia) e orientou a mãe a como tratar a pequena, que logo apresentou melhora.
“Tenho muita fé no poder da oração”, conta Maria, que hoje tem três filhos e três netos, todos acompanhados pelas rezas de Dona Ana, a quem consideram como avó.

Sobre a paga por esse verdadeiro ato de doação, Maria explica que vê a benzeção como uma forma de abençoar com a permissão de Deus e ajuda dos santos (no caso da fé católica), e que uma pessoa que benze por dinheiro não tem o verdadeiro dom, e não serve à comunidade.
Dona Ana nunca aceitou nenhum tipo de pagamento pelas rezas, mas todos a quem já atendeu se tornaram amigos, que também sempre ajudaram quando ela mais precisou. “Mesmo que eu fosse só neste mundo, teria amigos o suficiente para ser feliz. Sou muito agraciada, como em meu aniversário, quando lembram de mim e me fazem surpresas.”

O livro “O poder de cura das coisas simples”, do médico Larry Dossey aborda a relação entre o inconsciente e a saúde, e explica que “É possível que os corpos humanos atuem como receptores de informação disseminada pelo universo (…) certas partes do corpo humano -sobretudo o cérebro- estão bem preparadas para absorver informação, embora o motivo disso seja um mistério.”
Por Tuíla Rodrigues