“Há um despreparo do psicólogo em relação à avaliação psicológica para avaliação de portes de armas. Percebemos erros relacionados à aplicação e correção dos testes e ao cumprimento da bateria mínima”. A informação é da psicóloga e fiscal da Polícia Federal Adecy França Bento. Ela relata que há irregularidades encontradas nas clínicas e consultórios principalmente por conta de deficiência na capacitação dos profissionais. A fiscal esteve no Congresso Brasileiro de Psicologia Organizacional do Trabalho, realizado neste mês em Brasília.
A “comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica” é um dos requisitos para um cidadão adquirir o direito ao manuseio de arma de fogo, atestado pela Lei 10.826, de 2003. Nesse sentido, o trabalho de psicólogos se faz essencial para o controle do acesso a armas no Brasil. Os testes psicológicos são a balança dos profissionais, que são credenciados pela Polícia Federal. A lista dos psicólogos está no site da PF, separada por estado. Em Brasília, são 50 profissionais cadastrados, com endereço e telefone para contato disponíveis na página.
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Os testes são orientados pela Instrução Normativa de número 78, definida pela PF, em que a bateria mínima de exames exigida é: um teste projetivo; um teste expressivo; um teste de memória; um teste de atenção difusa e concentrada; e uma entrevista semi-estruturada. Segundo Adecy França Bento, é raro encontrar o total cumprimento da norma. “O psicólogo tem que se ater à instrução normativa, onde tem tudo bem claro, qual a bateria que ele deve seguir. É bem pouco, mas nem sempre nós encontramos esse mínimo”.
A culpa
O preparo dos profissionais é ponto que preocupa a fiscal. Apesar de a capacitação ser exigida pela Polícia Federal a todos os credenciados, a qualidade dos cursos para a área deixa a desejar. “A carga horária dos cursos é muito baixa, geralmente de quatro a oito horas para ensinar técnicas complexas. Além disso, raramente esses cursos têm supervisão. Então muitas vezes, a culpa não é do psicólogo e, sim, de quem ministrou o curso”, completou.
A psicóloga Elza Maria Gonçalves destaca a importância de que os testes psicológicos sejam realizados da melhor forma possível, uma vez que o tema traz consequências não só para a classe de policiais e vigilantes, mas também à população. “Essa questão do porte de armas de fogo vem com uma preocupação sobre a violência urbana, que está cada vez mais cercando o cidadão, então as pessoas têm um interesse pela posse e aquisição de armas de fogo, em função de se colocarem seguras”.
Elza é autora do estudo “Atuação prática e desafios do psicólogo credenciado para avaliação psicológica para porte de arma de fogo”, que mostra, entre outros resultados, o quão próximo da população está o manuseio de armas. Das profissões mais presentes na avaliação de porte de arma de fogo, em primeiro lugar estão empresários – entre eles, autônomos – e, em seguida, a vigilância privada. “Isso surpreende porque a primeira ideia que a gente tem é dos vigilantes, e não de empresários. São pessoas que possuem sítio ou algum estabelecimento e têm o entendimento da necessidade do porte de armas”.
Ela conta que existem dificuldades de realizar a pesquisa, mesmo dentro da própria área. O estudo foi realizado com todos os profissionais credenciados pela PF, totalizando 1060. O objetivo era fazer com que todos eles respondessem a um questionário online. “Eu liguei para todos estes psicólogos, a um total de 1.060 profissionais. Desses, eu consegui fazer uma entrevista individual com seis. E, para o nosso espanto, dos 1060 psicólogos, apenas 83 responderam ao nosso questionário”.
Polícia Federal
O vazamento dos testes psicológicos para a internet é ponto de preocupação para o delegado da Polícia Federal, Andersson Pereira dos Santos. Para ele, a fácil obtenção dos testes cerceia as possibilidades do psicólogo que aplica a avaliação, além de elevar as chances de aprovação do candidato. “Ano a ano, a porcentagem de aprovação nesses testes vem aumentando. Poucos são os instrumentos de avaliação psicológica que são validados para serem utilizados na seleção da Polícia Federal. E existem até psicólogos que dão cursos sobre como passar nos testes”.
Por Bruna Maury
Foto: Pixabay