O filme “O Dia que te conheci”, de André Novais Oliveira, acompanha Zeca (Renato Novaes), um bibliotecário que enfrenta desafios relacionados à saúde mental, em uma narrativa que se desenrola em Belo Horizonte.
O filme revela como pequenas situações cotidianas podem se transformar em discussões significativas.
Zeca não se encaixa no molde dos protagonistas típicos de comédias românticas.
Ele é um homem negro, com cerca de 40 anos, que lida com estigmas sociais, como a depressão e o preconceito.
A forma como Zeca é retratado subverte esses julgamentos que a sociedade frequentemente impõe por meio de cenas engraçadas e sinceras.
Confira o trailer
A abordagem estética de André é destaque do longa.
O diretor utiliza tomadas longas e estáticas, permitindo que o público se envolva na rotina de Zeca. Esse estilo pode parecer enfadonho à primeira vista, mas cada cena, mesmo as mais simples, contribuem para a construção da complexidade do protagonista, refletindo a luta interna que ele enfrenta.
Saúde mental
O filme aborda questões sociais relevantes, como a desigualdade no transporte público e a ausência de profissionais negros em ambientes educacionais.
Os diálogos são repletos de críticas sutis que revelam a ignorância sobre figuras históricas importantes e o desconforto em discutir saúde mental em uma sociedade onde apenas 7,6% dos negros procuraram tratamento para depressão, de acordo com um artigo da Psych Central.
Essas camadas tornam a narrativa rica e multifacetada.

A dinâmica entre Zeca e Luísa (Grace Passô) é uma das principais forças do filme.
As conversas e os silêncios que trocam nos fazem torcer pela aproximação dos dois, criando uma conexão genuína. Zeca é tímido e desengonçado, mas possui um carisma oculto que se destaca ao lado de Luísa, que é mais espontânea e confiante.
O filme envolve o público nesse elo dos protagonistas, que já são conhecidos de longa data em outros filmes da Filme de Plástico.
Inclusive, Renato Novaes é irmão mais velho de André Novais. “É mais um filme família onde eu me sinto muito seguro e acolhido. Meu irmão é meu ídolo e eu sabia que um dia ia protagonizar um filme dele. Acho que é o principal filme da minha vida até agora”, diz Renato Novaes sobre admiração pelo irmão. O próximo filme de André Novais trará o pai deles como protagonista.
Cultura hip hop
A obra ainda conta com a participação especial do célebre rapper mineiro FBC. É a primeira aparição dele nos cinemas como ator e a trilha sonora também tem músicas de sua autoria.
A trilha sonora, aliás, traz Djonga como mais um artista do movimento hip hop para o plantel. Além de outras referências presentes no mise en scène, como a camisa de Zeca que é a capa de um álbum do rapper BK e os diálogos que citam Matuê, Mc Rick, entre outros.

É curioso como, apesar de o filme ser rotulado como uma comédia romântica, a história do casal é breve e deixa o público desejando mais. Essa escolha pode frustrar alguns, mas também instiga a reflexão.
É uma narrativa simples, mas isso não quer dizer que é vazia, pelo contrário, é profunda. Cada cena nos prende com tão pouco, desde uma conversa sobre o trânsito na estrada de Belo Horizonte, até um relato sobre uma personagem que sequer aparece em tela.
Cinema político disfarçado de comédia romântica
Dessa forma, “O Dia Que Te Conheci” vai além das convenções do gênero. Ele aborda temas como saúde mental, racismo e a jornada do trabalhador com sensibilidade e profundidade. É um cinema político disfarçado de comédia romântica.
O filme semeia essas questões importantes, permitindo que germinem na mente do público, e incentivem diálogos que ultrapassam a experiência da sua curta duração de 71 minutos.
É uma obra que, ao final, cumpre seu papel de provocar reflexão e empatia, marcando a jornada de Zeca como um espelho das realidades enfrentadas por muitos.
Por Diller Abreu (o repórter assistiu à pré-estreia do filme a convite da Sinny)
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira