Conheça como foi construída a primeira escola na capital do país

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O ano era de 1957. Em um terreno localizado na Cidade Livre, atual Candangolândia, Brasília inaugurava a primeira escola primária da Novacap no Distrito Federal, nomeada Grupo Escolar 1 (GE-1) e posteriormente, Escola Júlia Kubitschek. A escolinha primária foi projetada pelo Arquiteto Oscar Niemeyer e sua construção durou apenas 20 dias atendendo a necessidade vigente da época. Hoje, no local da escolinha, encontra-se o Centro de Ensino Médio Júlia Kubitschek e logo ao lado há um terreno de dois hectares que foi concedido ao Museu da Educação do Distrito Federal pelo Instituto Brasília Ambiental, para a instalação da sua sede física.  

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Inclusive, neste momento, existe um projeto de criação do Museu da Educação do Distrito Federal no local onde ficava localizada a escola primária Julia Kubitschek. De acordo com a professora da Secretaria de Educação do DF e pesquisadora do Museu da Educação do Distrito Federal, Maria Paula Vasconcelos Taunay, em 2011 foi assinada uma Carta de Intenções junto com instituições parceiras: Universidade de Brasília, Secretaria da Educação do Distrito Federal, Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – DF, Instituto Brasileiro de Museus, Fundação Darcy Ribeiro e Administração da Candangolândia. 

“Atualmente um grupo de professores da Secretaria de Educação desenvolve ações institucionais, educativas, de comunicação e tecnologia, de pesquisa e o programa de história oral do Museu”, diz a pesquisadora Maria Paula Taunay. 

O projeto arquitetônico foi aprovado para a reconstrução da escola e o projeto executivo foi submetido à avaliação da Novacap. Desde 2011, a equipe do Museu procura meios de financiamento para viabilizar a reconstrução do edifício, através da captação de emendas legislativas e outras fontes. 

A escola

  Com a chegada dos primeiros trabalhadores junto às suas famílias, foi necessário iniciar o projeto de criação de escolas provisórias que pudessem acolher crianças. Em 15 de outubro de 1957, a escola Grupo Escolar 1 (GE-) foi inaugurada pelo presidente Juscelino Kubitschek e Israel Pinheiro, logo após foi denominada Escola Julia Kubitschek em homenagem à mãe do presidente.

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       A escola contava com aproximadamente 300 alunos matriculados, quatro salas de aula, uma biblioteca, uma cozinha, um refeitório, um almoxarifado, um gabinete dentário, um consultório médico e um recreio coberto. A escola Júlia Kubitschek era bem mobiliada, possuia mesas de fórmica do refeitório, geladeira na cozinha, muitos livros na biblioteca e um play-ground. A escola era feita de madeira, com varandas e treliças e a fundação era de cimento. O traçado era muito semelhante ao do Palácio do Catetinho e diante dessa semelhança, a escola ficou conhecida como “Catetinho da Educação” pela população.

       O até então presidente Juscelino Kubitschek tinha uma preocupação com a qualidade e o ensino, diante disso, queria as melhores professoras para lecionarem as turmas. Conforme apresentado em um documento presente no site do Museu da Educação, o corpo docente inicialmente foi escolhido entre as esposas e filhas de funcionários, portadoras de diploma de professor primário. Foram escolhidas 8 professoras e dentre essas 8 professoras, foi escolhida a diretora. Houve dificuldade para escolher a diretora e por conta disso, foi feito um rodízio.

Escola Júlia Kubitschek

Cada professora dirigiu a escola durante 15 dias, após isso, elas próprias fizeram uma votação para assim, eleger a diretora. A professora Santa Alva Soyer foi a escolhida. Soyer realizou trabalho fatigante durante a fase pioneira de Brasília, não apenas na direção do Grupo Escolar 1, mas também, futuramente, na organização de outras escolas que foram construídas em Brasília.

Outros nomes de professoras também fizeram parte do trabalho pioneiro: Amabile Andrade Gomes, Maria Helena Parreiras, Stela dos Cherubins Guimarães, Célia Cheir, Carmen Daher, Maria Antônia Jacinto, Maria do Rosário Bessa, Maria de Lourdes Brandão, Ana Leal, Maria de Lourdes Moreira dos Santos e Maria Helena de Lana Torres. Outras professoras chegaram em 1958 e 1959 para contribuir com esforço, solidariedade e sacrifício nessa fase que representou a construção de Brasília. 

       O Grupo Escolar 1 (GE-1) funcionava em dois turnos. Cada um deles contabilizava sete horas de duração. O primeiro turno funcionava de 7h30 e finalizava às 15h, já o segundo turno começava às 9h e terminava às 17h30. As crianças permaneciam também em atividades sociais por mais três horas extras. As crianças de ambos os turnos recebiam a merenda às 10h, depois vinha o almoço e às 15h faziam mais uma refeição.

Todas as refeições para as crianças eram oferecidas pelo SAPS, o até então responsável em Brasília era Francisco Manoel Brandão. De acordo com um documento disponível no site do Museu da Educação, o primeiro Grupo Escolar abrigou muitas crianças, aproximadamente 300 alunos. Muitos iniciaram os estudos em 1957 e ali mesmo, terminaram o curso primário. 

       A educação então passou a não ser só aos alunos, mas também, das famílias dessas crianças, buscando melhorar as condições de vida. Os pais dos alunos passaram a ter aulas de costura, culinária, entre outros, de acordo com as disponibilidades da escola e as necessidades da comunidade. 

        Em 1966, a escola foi incluída na rede oficial de ensino da Secretaria de Educação e Cultura. No fim de 1969, foi desativada por conta das precárias condições físicas e passou a ser ocupada por famílias sem moradia que ocuparam o local e se instalaram nas dependências da escola, onde permaneceram até 1980, quando aconteceu um pedido de retirada. De acordo com relatos, a escola foi destruída por um incêndio.

Reerguer a memória

         Após a destruição da escola, em maio de 1989 foi criado um projeto de reconstrução da Escola Julia Kubitschek. Esse projeto fazia parte do programa de preservação e revitalização do patrimônio físico ambiental, no âmbito do projeto Cidade Livre. Essa reconstrução não foi só justificada pelo valor de referencial histórico e como monumento do contexto sociocultural de Brasília, mas também para ser desfrutada pela população local. Mesmo com muitos esforços, principalmente de Ernesto Silva e outros pioneiros, o projeto não se concretizou. 

 

     Em entrevista publicada no site do Museu da Educação, a professora Amábile Andrade, primeira professora contratada, conta como foi a sua experiência como professora em Brasília. Amábile deixou Goiânia em 1957 para lecionar as turmas em Brasília. Começou dando aulas na NOVACAP e logo após foi lecionar as aulas do Grupo Escolar 1 (GE-1). Amabile conta que a escola foi construída sem o conhecimento de Israel Pinheiro e que a comunidade sempre esteve presente na escola, ajudando nas confecções de uniformes, por exemplo. Amabile criou um carinho pela escola e afirma que a época em que lecionou as turmas, foi um tempo muito bom para ela.

 

Museu da Educação

    A professora Maria Paula Vasconcelos Taunay explica que o projeto teve início com pesquisas sobre a história e a memória da educação no Distrito Federal. “Iniciaram-se no ano de 2.000, por iniciativa de um grupo de professores da Faculdade de Educação, da Universidade de Brasília que, gradativamente, teve sua composição ampliada pela participação de outros docentes e estudantes, inclusive de outras unidades da Universidade de Brasília, de professores da rede pública de ensino do Distrito Federal, além de contar com pesquisadores de diversas instituições universitárias”, afirma a professora Maria Paula Taunay.

      Essas pesquisas se desenvolveram com trabalho coletivo, envolvendo pesquisadores de diferentes níveis de formação acadêmica e de várias áreas disciplinares como: pedagogia, história, artes plásticas, música, educação física, matemática, comunicação, psicologia, arquitetura e direito. Maria Paula ressalta que no processo de pesquisa foram realizados encontros sistemáticos, visando garantir a organicidade e o encadeamento dos temas. Essa dinâmica contribuiu para o fortalecimento de vínculos entre grupos de investigação no âmbito da Universidade de Brasília e de outras instituições de ensino superior, e gerou significativa produção acadêmica, em nível de graduação e de pós-graduação. 

     Os estudos realizados envolveram muitas interpretações sobre os temas, envolvendo políticas educacionais, professores, instituições escolares, alunos, métodos, técnicas de aprendizagem, e campos disciplinares. A professora conta que uma das primeiras iniciativas do grupo de pesquisa consistiu em localizar fontes documentais sobre o objeto da pesquisa.  A busca e a coleta de documentos resultaram na constituição de um acervo documental valioso, composto por documentos de diferentes formatos escritos, sonoros e audiovisuais, além de objetos escolares. “Os documentos foram, posteriormente, classificados e inventariados, segundo as Normas Brasileiras de Descrição Arquivística (NOBRADE). A referida documentação encontra-se, atualmente, no Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (CEAM), no Campus Universitário Darcy Ribeiro, na Universidade de Brasília e, futuramente, será destinada ao Museu da Educação do Distrito Federal”, afirma a pesquisadora Maria Paula Taunay.

      Com o intuito de possibilitar acesso remoto ao acervo, criou-se um banco de dados denominado Sistema Arquivístico do Museu da Educação do Distrito Federal, (SAMUDE), que permite interatividade entre o público interessado e o acervo. Ao assegurar a preservação dos bens e torná-los disponíveis aos diferentes públicos, busca desenvolver a percepção do arquivo como um espaço de produção de conhecimento relevante para a transformação da realidade. 

As pesquisas que foram realizadas fortaleceram a ideia da criação do Museu da Educação do Distrito Federal, como espaço apropriado para a preservação e a disseminação da memória e da história da instituição educativa, de seus protagonistas e das práticas nela desenvolvidas. De acordo com a pesquisadora Maria Paula, o plano museológico e o projeto museográfico deram ênfase ao Plano de Construções Escolares de Brasília, elaborado por Anísio Teixeira, que sinalizou uma situação favorável à inovação pedagógica.

 “Educadores de várias partes do país apresentaram-se para o concurso nacional de seleção de docentes e vieram para Brasília atraídos pelas possibilidades de realização de suas utopias pedagógicas. Recuperar a memória desse período amplia as possibilidades de realização de projetos inovadores, capazes de promover a qualidade na educação pública em nosso país. Essa iniciativa contribui para reforçar novas utopias pedagógicas e dar sentido ao cotidiano dos educadores no Distrito Federal”, conta Maria Paula. 

 

A pesquisadora enfatiza a necessidade de proteção de uma memória fundamental para a capital do país. “O resgate da memória e a escrita da história da educação da capital brasileira têm como premissa que o cidadão brasiliense necessita se reconhecer no passado educativo de Brasília, para compor sua identidade individual e coletiva. Nessa perspectiva, recorrer às memórias como instrumento de formação e qualificação de professores é fundamental para a construção e o desenvolvimento de sua identidade profissional”.

 Essa preservação da memória também se reflete na própria identificação do que é ensinar.  “O processo de formação identitária do professor requer o conhecimento de suas raízes, para que ele se reconheça como protagonista de um processo histórico de mudanças criativas na educação. Sentir orgulho de ser professor e ter valorizada a sua identidade profissional é condição que dignifica a trajetória de todo educador no seu fazer pedagógico cotidiano”, enfatiza Maria Paula Taunay. 

 De acordo com a professora e pesquisadora, a criação do Museu da Educação do Distrito Federal pretende contribuir para ampliar a reflexão em torno da história e memória dos professores e estudantes pioneiros de modo a subsidiar a formulação de políticas educacionais no tempo presente. A expectativa é de que o olhar investigativo ao passado renove e fortaleça os ideais voltados para uma educação pública de qualidade, perpassados por uma consciência realista das possibilidades de mudança, no contexto da luta pela construção de uma sociedade mais humana e fraterna.

Por Marina Tuchal
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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