Imposta pela ditadura há 50 anos, Constituição de 1967 deixou “heranças” na democracia

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Março de 1967. O país conhecia a mais nova constituição, outorgada três anos depois do golpe civil-militar que derrubou o presidente João Goulart e um ano antes da instauração do Ato Institucional número 5 (AI-5), a mais dura restrição dos direitos individuais do período. A constituição de 1967 foi substituída apenas em 1988. Mesmo com a redemocratização, normas do regime militar sobreviveram ao tempo, analisam especialistas.

O historiador  Frederico Tomé explica que o governo militar, que teve apoio midiático e de setores civis, como o empresariado, precisava de alguma legitimação constitucional de forma a fazer valer o uso da força. Ele contextualiza que, em dezembro de 1966, na publicação do Ato Institucional número 4 (AI-4), os parlamentares foram convocados  para elaborar uma constituição que substituísse as leis do pós Estado-Novo (Constituição de 1946).

“A constituição de 1967 se caracteriza, por um lado, por legalizar instrumentos de repressão e, por outro, centralizar as decisões no Executivo. É uma constituição que faz uma reforma administrativa do Estado brasileiro”. Para o professor, essa “reforma” é uma herança adotada também em 1988. Tomé enfatiza que se trata de uma constituição nada debatida com a sociedade e é feita rapidamente, em pouco mais de dois meses. “Foi escrita a toque de caixa com essa finalidade específica de atender aos interesses de um país cada vez mais repressivo e que publicaria no ano seguinte o AI-5”. Em dezembro de 1968, o ato institucional número 5, por exemplo, dava poder arbitrário de prender qualquer pessoa que fosse considerada inimiga do Estado.  

De acordo com o jurista John Razen, a constituição de 1967 legitima o estado de direito, mas sem espírito democrático.  “Certamente, a participação de vários juristas teve papel importante na manutenção dessa faceta institucional. Nós tivemos uma mudança na política de segurança institucional, por exemplo, onde muita coisa acabou sendo recepcionada pela constituição atual de 1988”. Uma consequência disso é o aumento do poder para as polícias e outras instituições de repressão do Estado, além de maior legitimação da violência.
“Também tivemos um aumento no início do governo militar (pelo AI-2) no número de ministros da Suprema Corte (para 16) a fim de aumentar o poder do governo militar. A Constituição de 1967 aumentou o espaço de arbítrio do estado, permitiu que vários dos direitos individuais fossem relativizados”. Para Razen, a instauração do AI-5 (que só deixou de existir em 1978) também está inserida dentro do contexto de um crescente recrudescimento da repressão do Estado.

Por Lucas Valença e Luiz Claudio Ferreira

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