Mães e psicólogos repudiam pressão sobre estilo de cabelo de crianças

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Rosana Costa, 36 anos, começou a alisar os cachos aos 14 anos. Hoje, ela diz não ter como retomar os cabelos naturais e por isso incentiva as filhas de 8 e 11 anos a preservarem os delas. A mãe explica que só continua a alisar por que passou muito tempo na convivência da química, sua estrutura capilar mudou, mas que não quer que a história se repita com as filhas. “O alisamento tira a massa e abre a cutícula do cabelo, é preciso de mais hidratação para recuperar e ter resistência”.

Na hora de apoiar as meninas, a maior dificuldade é encontrar produtos brasileiros específicos para cachos e o grande número de salões para cabelos lisos. E teme que cabeleireiros de salões convencionais tentam induzir as clientes a usar produtos para alisar, com a justificativa de que o cabelo liso “transmite uma imagem de ser melhor”.

Atrizes como Sharon Menezes e Tais Araújo, que assumiram os cabelos crespos recentemente são referências para as mulheres cacheadas. Adriana Nascimento, 32 anos, dona do salão afro Rainha de Sabá no Conic, acha ótima a possibilidade de encontrar novas influências na mídia, e destaca o trabalho das pessoas que postam dicas de cuidados e penteados em canais do YouTube. “São pessoas que já passaram pela transição de cabelo, que já entendem melhor, e estão ensinando para todas as pessoas que já tiveram dificuldade.”

Para Adriana, por mais que o afro esteja em alta, o importante é que a pessoa saiba que pode alisar, cachear, trançar sem ser julgada pelas escolhas. Ela já alisou o cabelo da filha de 11 anos, mas acredita que isso não fez dela menos negra. A cabeleireira aconselha que as mães ensinem desde cedo que os crespos ou cacheados também têm seu valor.

“É muito complicado para as adolescentes. Eu queria orientar as mães que tem cabelo liso que não orientassem as filhas a fazerem progressivas.” Adriana ressalta a importância de conhecer e aprender a cuidar dos cabelos desde cedo, pois a prática pode tornar o hábito mais fácil. “Só o que precisam é um pouco de paciência”, afirma.

VALORIZAÇÃO

Aos 10 anos, a estudante Samara Brandão começou a trançar o cabelo. Apesar de sempre mantê-lo natural, enfrentava dificuldades para arrumar os cachos: a quantidade de produto utilizado para domar os fios e o tempo gasto. “Até para lavar dava trabalho. Agora ela tem mais tempo para outras coisas. Torna ela mais independente”, afirma Rosana Brandão, 46 anos, mãe de Samara.

Rosana considera o trabalho de salões especializados como incentivo para que a filha se reconheça e descubra mais sobre o próprio cabelo. Parte da rotina mudou já na primeira vez que começou a usar as tranças, agora não é apenas prender o cabelo e sair de casa, ela diz que os penteados afro deu novas alternativas de ousar para a filha.

Ela contou que a filha já chegou a pedir para alisar, mas considera um processo muito agressivo para crianças. Ela diz que é pior ainda com as imagens do padrão de beleza que a mídia apresenta e a influência da indústria de brinquedos, pois as prateleiras sempre estão lotadas por bonecas brancas e de cabelo liso.

A psicóloga infantil Priscila Chiari esclarece que socialmente e culturalmente existe uma visão padrão divulgado pela mídia que pode trazer a tendência de pessoas que não estão satisfeitas com o corpo, com o padrão dela mesmo. “A gente vê as pessoas com uma luta interna muito grande. É questão de uma transmissão cultural e muito divulgada pelos meios sociais”, esclarece.

Ouça entrevista com a psicóloga

A mãe de Samara conta que a filha já chegou em casa aos prantos por causa de apelidos dados por colegas. Esse preconceito já na infância pode ser prejudicial. “A criança vai deixando os estudos de lado, ela vai se excluindo e isso pode gerar tanto como um quadro depressivo como várias outras coisas. Ela vai se afastando, ficando sem contatos, ela vai criando um trauma com a forma dela mesmo”, explica a psicóloga.

Chiari destaca que isso pode acontecer até mesmo por causa dos pais. A criança se constitui pelo olhar dos outros, e o pai e a mãe são os personagens principais. “Muito pais colocam essa questão de estética deles para os filhos. Mesmo que não verbalmente, de alguma forma os pais podem trazer essa preocupação para a criança”.

Ouça aqui entrevista com a psicóloga

Por Mellyssa Eduardo

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