Síndrome de Burnout: “achamos que perdemos o valor”, diz ex-professora

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A Síndrome de Burnout é um distúrbio psicológico que tem se tornado cada vez mais comum em diversos ambientes profissionais. Caracterizada pelo esgotamento físico e emocional, a síndrome pode afetar seriamente a saúde mental e o desempenho dos profissionais.

A sala de aula virou um pesadelo, por exemplo, para a professora Fernanda Jacob, de 48 anos. “Depois que temos Burnout, achamos que não temos valor, nem mesmo para a nossa própria família.”

Os sintomas da Síndrome de Burnout incluem desde fadiga constante e insônia a irritabilidade e perda de interesse no trabalho.

Embora os fatores que contribuem para o desenvolvimento da síndrome ainda não sejam completamente compreendidos. A conscientização sobre a condição tem aumentado, assim como a busca por medidas preventivas e tratamentos eficazes.

Números de afastamentos

Segundo dados mais recentes da International Stress Management Association (ISMA-BR), houve um aumento de 40% no número de afastamentos por Burnout no Brasil em 2020 com relação a 2019.

Foram registrados cerca de 50 mil pedidos de afastamento em 2020. O que representa um aumento significativo em comparação aos cerca de 35 mil afastamentos registrados em 2019. 

Outros dados indicam que 72% dos brasileiros inseridos no mercado de trabalho sofrem de alguma sequela do estresse, com 32% deles sofrendo por Burnout e 92% com a síndrome continuam trabalhando. 

Esses números alertam a importância da prevenção e tratamento adequado da Síndrome de Burnout no ambiente de trabalho. Especialmente em um contexto de pós-pandemia, que pode ter contribuído para o aumento do estresse e da carga de trabalho dos profissionais.

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Ex- professora

Fernanda Jacob, 48 anos, foi diagnosticada em 2018 com a síndrome. Entretanto, a escola não quis demiti-la por esse diagnóstico, mas pediu que ela reduzisse a carga horária de trabalho.

Ela seguiu trabalhando e sofrendo com os sintomas até o dia 11 de dezembro de 2019, o dia em que saiu do emprego e se sentiu em “liberdade”,

Professora há mais de 26 anos, passou por um turbilhão de emoções, sendo diagnosticada inicialmente com a Síndrome do Pânico e esgotamento, recebeu o prognóstico de antidepressivos, calmantes e terapia.

Mas seguia experienciando sintomas como perda de memória, confusão mental, sentimentos de inutilidade, taquicardia, perda de cabelo, falta de ar, náuseas, fome exacerbada e quadro de psoríase. Seus maiores medos durante esse período foram a paranóia, morrer antes de sua mãe e se tornar um problema para a escola em que lecionava. 

A ex-educadora complementa que o problema dos professores não está na sala de aula, mas nos bastidores da profissão. Que a síndrome chega em um nível que acaba com toda a felicidade que tinha ao ir trabalhar.

“Você acaba gastando todo o dinheiro que você ganha para comprar a felicidade que te falta.”

Ex-professora, Fernanda Jacob

Ela relata que, fora o cotidiano comum de um professor, com as novas tecnologias surgindo e aprimorando o aprendizado, muitos dos educadores sofrem por não conseguirem acompanhar e aprender com facilidade e no ritmo exigido.

Atualmente, ela atua como empreendedora no ramo da venda de roupas plus size no Sudoeste e conta que o seu maior gatilho para a sua síndrome é a escola e evita qualquer tipo de envolvimento com o assunto.

Sinais de alerta

A ex-consultora de produtos de beleza Márcia Assis Cunha Pedrosa de Sousa, 61 anos, foi diagnosticada com a síndrome entre 2018 e 2019. Ela recorda que tudo começou pela decepção e sentimento de fracasso. Atuando por 9 anos e 6 meses como consultora Mary Kay, não esperava que sua equipe teria uma grande baixa e uma alta descredibilização de seu negócio.

Ao realizar exames para investigar vertigens inexplicáveis seguidas de dores de cabeça incapacitantes, foi examinado que o índice de lítio no corpo estava zerado. Ligou um sinal de alerta. 

O lítio é um elemento químico que pode ser medido em testes de sangue, sendo um parâmetro para o diagnóstico de transtornos mentais, como transtorno bipolar e depressão. 

Com isso, diagnosticada com depressão, mas ao fazer um apanhado sobre sua vida e rotina, não havia indícios justificáveis para a doença, pelo menos, não inicialmente. 

“Tudo funcionava bem na minha vida, menos essa área (o trabalho). Era uma situação que deixou muita mágoa e muita decepção. Eu sabia que tinha feito o meu melhor e nada daquilo adiantou.”

Ela relata que depois que percebeu que na verdade era a Síndrome de Burnout, agravou a ansiedade e de 80 kg, passou a pesar 100kg.

“Eu comecei a comer angústia, porque você não come comida, come angústia. Não era nem aquela fome emocional que quase todo mundo tem de comer a noite, era o comer para se empanturrar.” 

Ex-Mary Kay, Márcia Pedrosa

Ao tomar consciência de sua situação, buscou terapia, mudou sua alimentação e praticou exercício físico. Rompendo com a empresa que já não acreditava, buscou uma nova onde pudesse trabalhar com o bem-estar e o uso de produtos naturais.

Márcia sinaliza que o Burnout é um problema que acomete profissionais que se exaurem em suas profissões devido sua intensa dedicação. Custou até mesmo a saúde para entregar seu trabalho.

“Acredito que é muito mais propenso a sofrer de Burnout quando é seu coração que está dentro daquilo que você faz. É diferente para aqueles que veem o trabalho com distância, fazendo isso apenas para o ganho do salário.”

Visão especialista

O psicólogo clínico Rafael Dotto Bianco, 34 anos, explica que existe um padrão de comportamento daqueles que sofrem com a Síndrome de Burnout. 

Geralmente, são pessoas que estão em algum tipo de trabalho em que não se sentem realizadas ou não possuem gratificação. Estão com estilos de vida mais desequilibrados e muitas vezes sofrem uma relação abusiva dentro do trabalho. 

Com a tecnologia cercando a tudo e a todos, ele explica que o excesso de informação e a falta de delimitação de espaços pessoas e de trabalho causam a sobrecarga mental. Consequentemente, podendo engatilhar a síndrome. 

“Não existe mais aquele deslocamento, aqui é minha casa e aqui é meu trabalho, estou sempre no celular o tempo inteiro. Então isso faz parte da minha rotina e meu cérebro não consegue desligar.”

Psicólogo clínico, Rafael Bianco

Rafael Bianco aconselha que, para um ambiente de trabalho onde os colaboradores possam superar quaisquer desafios quanto ao esgotamento, é necessário o acompanhamento com terapias e junto disso criar uma relação saudável quanto ao trabalho, delimitando espaços, buscando entender qual o papel de si e o quanto de fato deve dedicar-se a ele. 

Além disso, complementa que mudar o estilo de vida criando rotinas estimula a relação de bem-estar como um todo.

“Ter um horários para acordar e dormir mais estabelecidos, uma relação melhor com a alimentação, comer em horários pré-estabelecidos e exercitar-se.”

O psicólogo explica que, para ele, não existe um protocolo fixo para seguir. Os pacientes diagnosticados com o quadro precisam ser avaliados em seus contextos de vida. Desde como é a rotina dela até a questão de como é a percepção que ela tem do próprio trabalho  e a relação dentro.

Por Ana Beatriz Cabral Cavalcante
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira 

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