O sociólogo Jessé de Souza criticou, em palestra na cidade de Brasília, a elite brasileira. Para o autor de “A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato”, os problemas brasileiros têm múltiplas explicações, mas é a exploração do trabalho escravo, durante séculos, que deve ser destacado. O cientista defende que a escravidão está presente nos dias atuais, onde, segundo ele, os menos favorecidos economicamente têm de lidar com uma invisibilidade social. “Na escravidão, você tem gente e não-gente (representados socialmente). É o que nós temos hoje”, afirma.
Para o pesquisador, o ódio ao escravo continua no ódio ao pobre. Ele conta que o número de assassinatos no país, que ultrapassam 60 mil por ano, reflete o preconceito ao pobre e ao negro, que são maioria na estatística. Segundo o professor, foi nos últimos 100 anos que se criou um bloco anti-popular formada pela “elite do dinheiro” e a classe média (detentora de formação intelectual). Ele explica que a elite é muito pequena, por essa razão, a classe média passou a servir aos interesses dos poderosos. “É isso o que a classe média faz. Todos os empregos dela têm relação com a supervisão do Estado e do mercado. A classe média é o capataz moderno”, defende.
O pesquisador acredita que o pobre não tem saído às ruas para ir de encontro com o bloco anti-popular por terem menos condições de perceberem a dominação que os atingem. Para ele, a nossa elite é de “latrina” e tem explorado o povo ao extremo, além de “vender” o país às potências estrangeiras. “Existem elites e elites. A elite da Alemanha, por exemplo, não vende o país”.
Na visão de Jessé Souza, a democracia europeia tem sido mais benéfica à população pelo contexto histórico. “A elite respeita o sangue. A Europa viveu em guerra, teve muito sangue, muita morte. Esse não é o único ponto, mas é uma forma no qual você ameaça os ricos e proprietários. Mostra que o pobre também tem direitos”, acredita.
“Mídia é canalha e venal”
“ Vivemos o pico da mídia manipuladora. A imprensa nunca foi tão canalha, venal e mentirosa como agora”, diz o autor. Ele entende que, a partir do movimento Tenentista, da Revolução de 1930 e do surgimento da classe média brasileira mediante a expansão da indústria, a mídia, agora com uma classe cada vez mais heterogênea, passou a ganhar um poder de manipulação crescente na sociedade brasileira. Um exemplo dado por Jessé, também retratado em seu lançamento, é a constante criminalização da esquerda e o surgimento de movimentos que apoiam candidatos com valores “antidemocráticos”.
Outro fator fortalecedor da manipulação midiática citado pelo sociólogo é o surgimento de intelectuais como Sérgio Buarque de Holanda (autor usado como exemplo em grande parte das críticas de Jessé). Segundo o pesquisador, esses estudiosos deram uma narrativa para a mídia ganhar o poder de adentrar o imaginário das pessoas à medida que disseram que o grande problema brasileiro é a corrupção apenas do Estado.
Por Lucas Valença e Aline Lopes
Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira