“Não somos poucos nem invisíveis”, diz Milene Orifisi, funcionária da Associação de Deficientes Visuais e Amigos, em São Paulo.
Há um ano, estudantes e professores têm aulas de Língua Brasileira dos Sinais (Libras) no colégio 28 de Fevereiro, em Santos, litoral paulista. O objetivo é facilitar a rotina de deficientes auditivos como Marcelo Lopes, 13. “Chego na escola com o celular na mão para me comunicar sem a ajuda da minha intérprete”. Ele usa o Hand Talk, aplicativo em que as traduções para Libras são feitas por Hugo, um intérprete virtual 3D. Marcelo é um dos 9,7 milhões de pessoas com deficiência auditiva no país, segundo o último censo do IBGE.
O termo “Tecnologia Assistiva” foi proposto em 2006 pelo Comitê de Ajudas Técnicas (CAT). Ivana de Siqueira, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi) do MEC, defende a importância da tecnologia para a vida diária, embora, para ela, nada possa substituir a interação humana. “Inovações digitais não serão o suficiente para resolver toda situação”, alerta. Ela lamenta que a acessibilidade no meio virtual ainda seja algo pouco explorado no Brasil.
Isso é perceptível no dia a dia de pessoas como Milene Orifisi, 39, que nasceu com glaucoma congênito. Ela não conseguiu comprar uma passagem de avião pela internet por falta de acessibilidade do site da empresa. Instrutora de informática e gestora de mídias sociais na Associação de Deficientes Visuais e Amigos (ADEVA), Milene gerencia a parte de tecnologia e web da entidade com um leitor de tela para smartphones (TalkBack) e para computadores (NDVA). “Nós, cegos, não somos poucos nem invisíveis. O comércio, principalmente o virtual, está começando a perceber que somos consumidores potenciais”, acrescenta.
Há quatro anos, Carlos Wanderlan, Diretor Técnico da Hand Talk teve essa percepção e decidiu trabalhar com soluções em acessibilidade digital para transpor barreiras entre surdos e ouvintes. “Como empreendedor de um negócio social, tenho a consciência de que muitas pessoas dependem desta comunicação, e o que me move é poder fazer a diferença na vida delas”, afirma. Hoje, o app possui uma parceria com o Ministério da Educação (MEC).
O técnico de informática da Associação Brasiliense de Deficientes Visuais (ABDV), Klaus Braga, 37, começa o dia com o Uber, aplicativo de transporte urbano privado. “Com o app não corro o risco de ser enganado na hora de pagar pela viagem”. Para ele, o mundo digital encurta a distância entre quem enxerga e quem não enxerga. Klaus nasceu com Retinose Pigmentar, doença degenerativa e, por falta de acessibilidade e tecnologia, não terminou a graduação. “Ser deficiente visual há 10 anos significava viver de uma forma muito mais restrita”.
O principal atributo das inovações tecnológicas, na visão do especialista em tecnologias da educação, Gilberto Lacerda, é dar voz aos indivíduos. “Para aqueles que estão em um contexto de educação inclusiva, as inovações tecnológicas promovem qualidade de vida”. O professor da Universidade de Brasília (UnB) entende que o caminhar tecnológico é lento, mas enxerga um futuro promissor.
Por Mariana Areias, de São Paulo