Uma infância marcada pela vivência de variadas formas de violência pode gerar traumas que impactam o futuro.
O alerta é de psicóloga e psicopedagoga Karoline Miranda de Oliveira.
Ela explica que a violência psicológica provoca marcas profundas em crianças que presenciam cenas de violência doméstica em seus lares.

“A violência psicológica não traz cicatrizes físicas, mas, ecoa nos pensamentos e escorre para os sentimentos de quem vive”, afirma Karoline
Comportamentos
Um ambiente onde comportamentos agressivos dos cuidadores são normalizados e violências fazem parte da rotina, fazem com que o indivíduo que ali se desenvolve, internalize aquele modo de vida como um padrão.
A psicóloga afirma que crianças que crescem nesses espaços apresentam uma probabilidade maior de desenvolver comportamentos agressivos ou abusivos na vida adulta.
“Ela pode crescer acreditando que o poder e o controle são elementos normais em um relacionamento, ou que a violência é uma ferramenta aceitável para lidar com frustrações”, afirma.
Segundo ela, a criança pode reproduzir os comportamentos do pai, por ser a figura que reproduz a agressão, ou até mesmo os comportamentos de submissão da mãe, se esse for o seu papel de opressão no ciclo de violência.
Sinais
Segundo Karoline, crianças que presenciam a violência podem expressar seu sofrimento de diversas formas e é importante que “o adulto cuidador, sejam pais, professores, rede de apoio, estejam presentes na rotina da criança de forma a observar seus comportamentos usuais e destacar aqueles que saem do que é comum”.
Sinais como depressão, ansiedade, constrangimento excessivo, aumento da agressividade e irritabilidade ou isolamento são alertas.
Sintomas físicos como dores sem causa médica aparente, alergias ou incômodos no corpo também devem ser sempre observados pelos responsáveis.
Escola
A profissional reforça o papel da escola na identificação de crianças que estejam passando por essa situação, de forma, a ser também uma aliada e protetora da criança.
Para além do desempenho acadêmico, prestar atenção na forma como a criança se comporta ou socializa com os demais alunos permite que a instituição possa intervir para dar suporte ao aluno.
“A escola hoje como absorve um grande espaço de tempo da vida da criança precisa ter formas de medir. Como que essa criança se comporta? Como ela se dirige aos colegas, às autoridades? Ela se retrai? Ela está chorando pelos cantos? Ela chega alegre, ela chora na hora de ir embora?”, questiona Karoline

Acompanhamento
A especialista explica que crianças que são expostas a lares violentos e não tem acesso à uma assistência psicológica tendem a carregar traumas que resultam, em sua maioria, em problemas de saúde mental.
Além disso, existe o risco dessa criança crescer e reproduzir os comportamentos violentos na fase adulta.
Para Karoline, tratar os traumas o quanto antes é dar chance para uma vida melhor.
“O tratamento permite construir uma história mais equilibrada, mais harmoniosa, poder sonhar, né? Poder viver melhor”, defende a psicóloga
Saber
Karoline utiliza da teoria do médico Gabor Maté para falar sobre como funcionam os traumas, como eles afetam o social e o mental e como eles devem ser tratados.
Em sua teoria, “Sabedoria do Trauma”, Gabor Maté afirma que o trauma é “a desconexão com o nosso eu, é uma ruptura que pode levar a doenças físicas e mentais, vícios e dificuldades nos relacionamentos. “
De acordo com a especialista, os traumas vividos,sejam eles naturais ou provocados, ficam marcados na pele e podem voltar a qualquer momento da vida.
“A gente esquece, mas a pele é o nosso maior órgão e a nossa barreira com o mundo, que é o limite. E é também o contato.”
Para ela, o primeiro passo para superar ou ressignificar os traumas é ser gentil com a sua própria pele. “Passe um creme nas mãos. Né?”.
Ela defende ser uma forma de entrar em contato com si próprio para de alguma maneira se acolher nos próprios traumas.
“A grande sabedoria do trauma está no que você vai fazer com eles” , ressalta.
Por Beatriz Ocké e Natalia Francescutti
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira