O placar no plenário da Corte é de 4 a 0 pela liberação e a sessão de análise do caso está marcada para quinta-feira.
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar, nesta quarta (23), o julgamento crucial que aborda a questão da descriminalização da posse pessoal de drogas.
Este debate, em andamento desde 2015, busca concluir a análise do tema que ganha relevância na sociedade contemporânea. No início de agosto, o julgamento foi reiniciado, mas uma solicitação do ministro Gilmar Mendes, relator do processo, levou à sua suspensão.
O ponto central dessa ação reside na avaliação se o porte de drogas para consumo próprio deve ser considerado um crime. O ministro Alexandre de Moraes (foto abaixo) apresentou a sugestão de estabelecer uma faixa de 25 a 60 gramas como quantidade permitida para posse pessoal de maconha, uma proposta destinada a definir critérios distintivos entre usuários e traficantes.
Retrospectiva
A Defensoria Pública de São Paulo deu início ao Recurso Extraordinário (RE) 635.659, que questiona uma decisão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema, em São Paulo, que manteve a condenação de um indivíduo a dois meses de prestação de serviços comunitários por porte de drogas para consumo pessoal.
O recurso extraordinário é um instrumento processual usado para levar questões de cunho constitucional ao STF.
A alegação da defensoria pública é que essa ação não afeta a saúde pública, mas apenas a saúde pessoal do usuário. Além disso, no recurso, a defensoria contesta a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas nº 11.343/2006, que categoriza como crime a posse de entorpecentes para uso pessoal.
Um dos argumentos centrais é que esse dispositivo contraria o princípio da intimidade e da vida privada.
Diferenças entre Descriminalização e Legalização
Dentro da legislação, existe uma distinção entre os termos “descriminalizar” e “legalizar”. Apesar de frequentemente confundidos, eles possuem nuances distintas.
A descriminalização permite que o usuário faça uso da substância sem sofrer punições. Já a legalização abrange a regulação da produção, distribuição, comércio e consumo, eliminando a separação entre drogas lícitas e ilícitas, e envolvendo aspectos da saúde pública.
O professor de direito penal Victor Quintiere, do Centro Universitário de Brasília (Ceub), enfatiza a importância de esclarecer a população sobre esse assunto. Ele destaca que a descriminalização permitirá que o Estado se concentre de maneira mais eficaz nas atividades de repressão ao tráfico, evitando sobrecarregar o sistema judiciário com processos relacionados a usuários.
“ É importante esclarecer a população que o fato de descriminalizarmos o uso em si não significa dizer que o tráfico será abrandado”. Para ele, o efeito é o contrário, já que a descriminalização, ou seja, a separação do que realmente importa para o Estado em termos criminais e aquilo que importa à saúde pública do Estado permitirá outras ações.
“Na minha ótica, o Estado pode perseguir processualmente pessoas que realmente traficam entorpecentes de maneira mais efetiva, até porque o número de procedimentos que são abertos em desfavor do usuário acaba atrapalhando o próprio aparato estatal”
Saúde pública
Quintiere ressalta que o Estado desempenha um papel crucial na garantia da saúde pública como um direito fundamental para todos, sublinhando que a criminalização não resolve o problema.
“A criminalização em si não resolve o problema. Não é porque pessoas têm contra si uma imputação de crime que elas simplesmente deixam de usar entorpecentes. É necessário que o Estado promova, dentro de uma complexa política pública, mas necessária, a educação, a conscientização, para que eventualmente indivíduos que queiram usar entorpecentes usem a não destruir, por exemplo, a própria vida”.
O pesquisador também menciona os desafios que o STF enfrenta ao julgar esse precedente, enfatizando as dificuldades em distinguir entre usuários e traficantes. Ele destaca a necessidade de estabelecer critérios específicos que sejam eficientes:
“Esse pra mim é o grande desafio, porque muitas vezes, é muito difícil você distinguir o usuário de traficante, mas mais do que isso, muitos usuários acabam respondendo indevidamente e sofrendo as consequências processuais prévias a uma sentença penal, que esclareça após a introdução dos fatos, mas acabam respondendo como traficante, sendo que são usuários”. Para ele, essa análise é algo fundamental, é algo importantíssimo e que vai ser um grande desafio em termos de leis da ação e também em termos de própria jurisprudência”
Legalização em outros países
Em relação à autorização de entorpecentes, alguns países já flexibilizaram suas medidas para o consumo pessoal. Atualmente, países como Estados Unidos, Uruguai e Bangladesh permitem o uso da substância. Na Coreia do Norte, a maconha não é considerada um entorpecente, portanto, aqueles que a cultivam ou consomem não enfrentam prisão ou punição.
Por Mayara Mendes
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira