Deixar a escola antes de completar os estudos fez uma grande diferença na vida da empregada doméstica Catiana Araújo, que parou de ir à escola com 19 anos, no último ano do ensino fundamental. Hoje, com 44 anos, ela conta os desafios enfrentados.
![Foto: Caco Argemi / CPERS - Sindicato](https://agenciadenoticias.uniceub.br/wp-content/uploads/2023/12/Sala-de-aula-vazia-696x449-1.webp)
“Sinto muita falta de não ter acabado a escola, me arrependi de não ter me esforçado mais. Passou e eu não fiz”, disse.
Catiana explica que a principal razão para ter abandonado os estudos foi a falta de motivação. “Eu achava a escola muito chata. Tinha muita dificuldade com as matérias e tudo isso foi me desmotivando, aí como eu fui mãe e casei, meu ex- marido não concordava que eu estudasse, tudo isso influenciou”.
Aos 26 anos e com dois filhos, ela entrou para o programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA), onde fez o 1º e 2º anos do ensino médio, mas não chegou a concluir.
Para a diarista, o maior arrependimento foi não ter estudado quando teve a chance. “É mais difícil depois, mais responsabilidades. Minha única obrigação era estudar. As oportunidades da vida são únicas para quem estuda e poucas para quem não estuda. O mercado de trabalho está bem concorrido”, ressalta.
2 milhões fora da escola
Um estudo do ano passado retratou o estado da evasão escolar no Brasil. Cerca de 2 milhões de meninos e meninas de 11 a 19 anos deixaram a escola sem terminar o ensino obrigatório.
É o que mostra uma pesquisa realizada em setembro de 2022 pelo Instituto de Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec) para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
Segundo o Ministério da Educação, a evasão escolar acontece quando o aluno abandona os estudos antes de completar a educação básica obrigatória.
Trabalhar fora
O estudo também mostra as principais causas relatadas por crianças e adolescentes para terem deixado a escola, sendo que quase metade, 48%, afirma que deixou de estudar “porque tinha de trabalhar fora”; 30%, “por não conseguirem acompanhar as explicações ou atividades”; 29%, “a escola não tinha retomado atividades presenciais”; 28%, “tinham que cuidar de familiares”.
Outras causas, como transporte (18%), gravidez (14%), desafios por ter alguma deficiência (9%) e racismo (6%), também foram relatadas.
Fonte: Unicef
Ainda segundo a pesquisa, cerca de 21% dos estudantes de 11 a 19 anos de escolas públicas já pensaram em desistir de estudar. Cerca de 50% dos alunos apontam a preocupação de não conseguirem acompanhar as explicações ou atividades dadas pelos professores.
Outros dados de 2022, do Instituto Brasiliero de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que 18% dos jovens de 14 a 29 anos não terminaram o ensino médio, por terem abandonado ou por nunca terem frequentado a escola.
Desafios pedagógicos
Para a supervisora pedagógica Erci Gaspar, os prejuízos de deixar a escola são enormes. “O prejuízo na alfabetização e na aprendizagem vai fazer falta no futuro. Faz diferença na hora de trilhar o seu caminho como um profissional.”
A professora também observa a problemática de deixar os estudos e depois voltar em uma turma não compatível com a idade do aluno. “Quando o estudante retorna, os meninos não são da mesma faixa etária, não pensam da mesma forma, o cognitivo evoluiu, e não está compatível com os seus pensamentos, então tem muitos prejuízos”, disse.
Outro grande desafio, segundo a pedagoga, é sensibilizar os pais dos estudantes para incentivá-los a levarem os filhos para escola. “É importante eles estarem interagindo dentro da escola, convivendo, aprendendo as atividades de vida diária. Bem como o professor vai estar tentando desenvolver outras áreas cognitivas que e suas potencialidades.”
Possíveis soluções
Uma forma de tornar a escola mais atrativa são programas e projetos educacionais. Para a pedagoga Erci Gaspar, eles são muito bem-vindos. “Projetos que envolvem os nossos estudantes são referentes à questão esportiva e artística com música, teatro, xadrez, isso chama atenção porque o estudante fica na escola. Atividades precisam ser atrativas, lúdicas e pedagógicas, isso realmente atrai bastante as crianças.”
“Todos esses projetos que promovem a interação social potencializam o que ele é capaz de fazer”, explica.
Em nota, a Secretaria de Educação do Distrito Federal apontou que uma das medidas tomadas para reduzir a evasão escolar foi a criação de uma Comissão Especial para implementar a Busca Ativa Escolar, programa desenvolvido pelo Unicef.
A intenção do programa é apoiar os governos na identificação, registro, controle e acompanhamento de crianças e adolescentes que estão fora da escola ou em risco de evasão, segundo o Fundo.
A Secretaria de Educação destaca ainda que trabalha para amenizar o abandono escolar, por meio de ações como o acompanhamento de frequência escolar da rede pública de ensino, previsto na Portaria nº 33 de 2020, para identificar estudantes que não estão frequentando a escola e as causas.
Volta da pandemia
Erci Gaspar destaca ainda o aumento da evasão no pós-pandemia. “No decorrer da pandemia tivemos atividades virtuais e, logo após que retornamos, nem todos os nossos estudantes retornaram”, disse.
Uma pesquisa feita pelo FGV Social mostra um aumento da evasão escolar, na faixa de 5 a 9 anos, durante a pandemia de covid-19. A taxa passou de 1,41% em 2019 para 5,51% entre os últimos trimestres de 2020. Níveis de 14 anos antes foram alcançados na pandemia. No terceiro trimestre de 2021 a taxa de evasão voltou a 4,25%. O que ainda é 128% maior do que em 2019.
Por Maria Eduarda Lima
Supervisão de Katrine Boaventura e Luiz Claudio Ferreira