Decisão de barrar o implante hormonal, amplamente utilizado para fins estéticos, é vista com alívio por médicos, mas enfrenta resistência da indústria farmacêutica, que critica a falta de discussão prévia e os prejuízos econômicos
A suspensão do implante hormonal, conhecido como “chip da beleza”, foi comemorada por setores da medicina, como a ginecologia. A decisão foi tomada em outubro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essa determinação se baseou em uma resolução de boas práticas de manipulação em farmácias e buscou frear o uso indiscriminado de hormônios em implantes, cuja segurança não é garantida. O “chip da beleza” é um implante vendido em farmácias e amplamente usado para fins de terapia hormonal e estéticos.
A Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) já tinha alertado sobre complicações em pacientes que usavam o implante, inclusive com uma alta de atendimentos relacionados a efeitos colaterais dos hormônios utilizados.
A médica ginecologista Lia Damasio, que é diretora de Defesa e Valorização profissional da Febrasgo, explica que o produto — composto normalmente pelo hormônio sintético gestrinona — foi divulgado amplamente em redes sociais com a promessa de aumentar a massa magra, reduzir gordura corporal e aumentar a disposição. No entanto, ela alerta que a falta de fiscalização e controle sobre esse tipo de implante coloca em risco a saúde das mulheres. “Quando o produto é manipulado, não temos como mensurar o padrão da liberação hormonal no corpo da mulher e nem o impacto que pode causar à saúde.”, afirma.
Uma advogada de 36 anos que preferiu não ser identificada contou que fez o uso do chip da beleza durante 1 ano. E observou o aumento da massa muscular, mais força nos exercícios físicos e o fim dos sintomas ocasionados pelo ciclo menstrual. Em contrapartida, houve o aumento do peso corporal, surgimento de acne e queda de cabelo.
Para a médica Lia Damasio, o tratamento precisa ser feito com base na individualidade de cada pessoa. “Relatos de boas experiências não sustentam o lançamento e a comercialização de um novo medicamento. Essa é uma das razões que defendemos o tratamento individualizado da paciente, desde que seja baseado em evidências científicas e regulamentado, garantindo a eficácia da terapia”, explica.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) também expressaram apoio à medida e reforçaram a proteção da saúde pública.
Divergências no Setor Farmacêutico
A decisão, no entanto, não foi bem aceita por representantes da indústria farmacêutica, que alegam prejuízo e questionam a falta de debate com o setor. Em nota à resolução da Anvisa, a Elmeco, pioneira na manipulação de implantes hormonais no Brasil, se manifestou contra a suspensão e afirmou que a decisão “desconsidera a importância do acesso a esse tratamento para milhares de pacientes que encontraram nos implantes hormonais a solução para diversas condições de saúde”.
Por sua vez, a Associação Nacional dos Farmacêuticos Magistrais (Anfarmag) já havia declarado, em 2021, que a prescrição de implantes hormonais deveria ser personalizada e baseada na avaliação clínica de cada paciente, com aplicação restrita a clínicas e hospitais.
A entidade condenou o uso dos termos “chip da beleza” e “chip hormonal” por serem imprecisos e criticou a manipulação desses implantes em locais sem infraestrutura adequada, licenças sanitárias, profissionais qualificados e outros fatores que colocam em risco a segurança do paciente. Sobre a recente decisão da Anvisa, a Anfarmag se limitou a manifestar apoio aos membros afetados, sem contestar a resolução.
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Por Ágata Vaz, Dina Braga, João Pedro Carvalho, Juan Costa e Kallebe Simões
Sob supervisão de Isa Stacciarini