O último boletim de casos de dengue (no mês de abril) no Distrito Federal registrou um aumento de 467,9% de casos, quando comparado ao mesmo período de 2021. Segundo o biólogo Denis Machado, pesquisador de pós-doutorado na Universidade da Carolina do Norte, em Charlotte (Estados Unidos), o avanço da doença requer atenção permanente. “O vírus da dengue requer pesquisa contínua e atenção constante, e não apenas quando há uma alta de casos”. Machado é pesquisador sobre a evolução de vírus como dengue e SARS-CoV-2.
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Outro alerta que ele faz é que os danos podem ir além do período de contaminação. “As sequelas clínicas da dengue são comuns nos dois anos após uma infecção aguda pelo vírus”, explicou o pesquisador.
Ele exemplifica que complicações oftálmicas podem ser observadas em adultos. “Apesar da boa recuperação da visão e resolução dos sinais clínicos na maioria dos pacientes, oftalmologistas e médicos devem estar atentos e vigilantes, pois há relatos isolados de casos de complicações oftálmicas da dengue em casos de baixa acuidade visual refratária. Além disso, desde 2007 nós sabemos que a dengue pode, em alguns casos, resultar em uma síndrome de fadiga pós-infecciosa que ocorre nos estágios posteriores da infecção”.
Boletim epidemiológico
De acordo com o boletim epidemiológico divulgado no último dia 8 de abril, foram notificados 21.767 casos dentro do DF em 2022. As regiões Central, Centro-Sul, Leste, Norte, Oeste, Sudoeste e Sul apresentaram, respectivamente, 827, 1089, 2200, 2641, 3867, 4277 e 313 casos. No total, foram registrados 21.767 casos em 2022, enquanto em 2021 foram 3.293, o que mostra um aumento de 467,9%.
O maior número de casos está em Ceilândia, São Sebastião e Samambaia, com respectivamente, 3693, 1613 e 1490 casos em 2022.
As regiões com maiores variações entre 2021 e 2022 são Taguatinga, que em 2021 teve 88 casos e esse ano 1197, totalizando uma variação de 1260,2%, São Sebastião, que saiu de 141 casos para 1613, ou seja, um aumento de 1044% e Vicente Pires, que subiu de 73 casos para 829, tendo assim 1035,6% de variação.
Como se prevenir
De acordo com Denis Machado, a população deve entender que a dengue é, hoje, a mais importante arbovirose (doença transmitida por artrópodes) que afeta o homem. “A dengue é um problema de saúde pública muito sério no mundo todo, mas especialmente nos países tropicais”.
Ele explica que, em países tropicais como o Brasil, as condições do meio ambiente favorecem o desenvolvimento e a proliferação do Aedes aegypti, principal mosquito vetor.
“Como não há dengue sem o mosquito vetor, a melhor forma de se evitar a dengue é combater os mosquitos. A população pode fazer isso evitando focos de acúmulo de água, que são locais propícios para o mosquito se reproduzir. Felizmente há várias atitudes importantes que todos podem tomar para isso”. Ele alerta que o mais importante é não acumular água em latas embalagens, copos plásticos, tampinhas de refrigerantes, pneus velhos, vasos de plantas, jarros de flores, garrafas, caixas d´água, tambores, latões, cisternas, sacos plásticos e lixeiras, entre outros lugares que possam reter água parada.”
O pesquisador alertou que medidas de curto prazo, como a limpeza de espaços públicos e as campanhas de conscientização, que apesar de essenciais não são o suficiente. “Mudanças climáticas e destruição do meio ambiente são dois dos principais fatores que nos expõem cada vez mais a doenças, tanto por novos patógenos quanto por antigos e conhecidos microrganismos que podem levar a novos surtos”.
“Abortar esta questão em médio e longo prazo requer considerar a saúde humana junto com a saúde animal e ambiental. Para isso, os governantes precisam investir tanto em pesquisa de base quanto em pesquisa aplicada, e ajudar nossas coleções biológicas, como museus de zoologia, a ficarem mais prontamente disponíveis para pesquisa biomédica.”
Sintomas
O pesquisador explicou que o sintoma mais comum é a febre. Este sintoma costuma ser acompanhado por um dos seguintes sintomas: dores (geralmente dor atrás dos olhos ou dores musculares, articulares ou ósseas), náuseas, vômitos, e irritação na pele. Estes sintomas geralmente duram de 2 a 7 dias.”
“Em caso de suspeita de dengue, é importante ficar especialmente alerta aos sinais de dengue grave, que geralmente começam dentro de 24 a 48 horas após a febre ter desaparecido. Estes sintomas de dengue grave incluem dor de estômago, sensibilidade ao toque, vômitos, sangramento do nariz ou gengivas, sangue no vômito ou nas fezes. Além disso, pessoas com dengue grave podem se sentir cansadas, inquietas ou até irritáveis.”
Parece com a Covid?
O pesquisador Denis Machado explicou que há diferenças importantes dos sintomas entre a dengue e o COVID-19. “A COVID-19 tem uma lista de sintomas relatados mais extensa do que a dengue, mas muitos dos sintomas são bem parecidos e podem confundir. Esses sintomas de covid vão desde sintomas leves até doenças graves e podem aparecer de 2 a 14 dias após a exposição ao vírus”.
Ele explica que os sintomas de covid incluem febre, tosse, falta de ar ou dificuldade de respirar, dores de cabeça, dores no corpo, perda de olfato ou paladar, dor de garganta, congestão nasal ou nariz escorrendo, náusea ou vômito, diarreia, e outros sintomas. A dengue pode ser grave.
“Além disso, sintomas como febre, dores no corpo, e náusea ou vômito podem ser observados tanto em pacientes de dengue quanto em pacientes de COVID-19. Por isso não se deve deixar de contatar um profissional de saúde se tiver febre ou sintomas de dengue.”
Paciente
A enfermeira Angélica Dias tem 43 anos, começou a sentir dor nas articulações e no corpo no dia 13 de março. Preocupada, foi, no dia seguinte, a um hospital público onde fez hemograma e exame de urina, uma vez que o estabelecimento não possuía teste de sorologia. A partir dos resultados e do surgimento de petéquias, manchas na pele típicas da dengue, recebeu o diagnóstico final da doença.
Além da dor no corpo e das petéquias, apresentou sintomas de fraqueza, dor de cabeça e dor atrás dos globos oculares. Como sequelas, Angélica ainda sofre com dor de cabeça e fraqueza física e mental, tendo dificuldades de cumprir tarefas do seu dia a dia. Apesar de ter tido uma dengue moderada, há casos em que pode evoluir para um estágio grave, sendo possíveis sintomas sangramento na gengiva, no ouvido, no nariz ou na vagina, sonolência extrema, boca seca, sede excessiva por extrema desidratação, problemas neurológicos e acometimento renal, cardíaco ou do fígado.
Como profissional de saúde atuante no Hospital Municipal de Valparaíso de Goiás (GO), ela afirma que o seu local de trabalho recebeu muitos casos de dengue ultimamente devido à baixa escolarização dos moradores da região, que não sabem dos cuidados necessários.
Embora não saiba de nenhuma campanha de conscientização, a enfermeira alega que os agentes endêmicos, responsáveis por registrar casos e avaliar possíveis áreas de alastramento da doença, estão mais concentrados no Entorno do DF, o que permite que casos não documentados estejam acontecendo em outras áreas sem que a população saiba.
Por Maria Clara Britto e Catharina Braga
Fotos: Secretaria de Saúde do GDF
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira