Ter o sangue correndo tão forte pelas veias, que foi capaz de engolir uma mola e levá-la até o pulmão. Essa foi só uma das difíceis situações na vida de uma mulher de 32 anos, que luta contra a rejeição dos próprios órgãos há 20 anos.
Jessica Jennifer, nascida em 1990 na capital do país, mora hoje em Arniqueiras. Atualmente trabalha como manicure em um salão próximo à sua casa e atua como maquiadora e designer de sobrancelhas de forma autônoma.
Desde a adolescência
A história começa na adolescência. Tratamento conservador aos 12 anos, hemodiálise aos 17 e transplante aos 19. Jessica descobriu muito jovem o que é ser privada de muitos prazeres e deveres da vida, como fazer educação física na escola, se formar no ensino médio, prestar vestibulares e entrar na faculdade.
Presa na obrigação de segurar os seus rins, o rim que lhe foi doado e, recentemente, seu pulmão e coração.
A primogênita de duas irmãs e quatro netas. Enfrenta problemas de saúde desde muito cedo e cuida da mãe — que tem esclerose múltipla, desde a morte do pai. Com apenas 12 anos de idade, iniciou um tratamento para manter os órgãos que seu próprio corpo rejeitava. Parou aos 14. Recebeu alta?
Ela achava que sim, que estava bem. Na verdade, sua mãe interrompeu o tratamento e parou de levá-la até o hospital. Três anos depois já era tarde demais. Seus rins já não funcionavam como devia e ela iniciou a hemodiálise.
Dois anos se passaram e ela precisava de uma nova glândula para compor seu sistema excretor. “Seria capaz de arrancar os braços de uma e colocar na outra”, conta o marido da sua doadora.
A primeira e única pessoa que fez todos os exames e aceitou dar o órgão que salvaria a vida de sua sobrinha. A compatibilidade era tão grande, que não houve dúvidas de que daria certo.
“Eu quero falar sobre isso. Que eu dei a volta por cima, né?”, ela fala com um sorriso no rosto, ansiosa em poder falar de tudo que passou desde novembro do último ano.
Novo baque
Após 13 anos de transplante, vivendo a vida normalmente — dentro do possível, a paciente foi chamada pelos médicos e recebeu a triste notícia de que havia uma fístula no rim transplantado. Uma conexão anormal entre uma veia e uma artéria que colocou sua vida em risco novamente.
Os sintomas estavam presentes desde 2020. Nos exames, a fístula arteriovenosa era visível desde 2018. Falta de ar, cansaço e inchaço foram os sinais que seu corpo têm mostrado desde o ano que marcou a pandemia. Inicialmente tratada como tromboembolia pulmonar, se revelou uma hipertensão arterial pulmonar, que viera afetar seu coração.
Suas escolhas são: o risco de perder o rim durante o procedimento ou se manter como estava e datar a validade dos outros órgãos. A cirurgia foi marcada próxima ao último natal. As expectativas eram altas, o medo também. Além da culpa que sentia por correr o risco de perder o órgão que um dia esteve saudável em outro corpo.
Deram início ao procedimento, mas os médicos não esperavam que o dano fosse tão grande. Eles não sabiam o que fazer, mas o que poderia piorar?
A resposta veio quando a pressão arterial foi forte o suficiente para puxar uma mola até o seu pulmão. Ela conta que o sangue começou a jorrar de seu nariz, sua tosse também era sangrenta.
No entanto, nada disso a impediu de “dar trabalho” na sala de recuperação. A melhor amiga conta que ela não parava de falar — como de costume, pedia para tomar banho e reavia a esperança para os entes após todo o trauma que viveu.
O trauma ela vem tratando na terapia. “Eu não consigo ir trabalhar sem dar umas dez pausas no caminho, não consigo me vestir após o banho sem sentar para descansar…” Essas são algumas das dificuldades diárias enfrentadas por Jessica, que aguarda o retorno dos médicos para uma nova tentativa da cirurgia.
Por Letícia Abreu
Foto: Arquivo da família
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira