No próximo dia 3 de abril, o capítulo final de uma história de violação de direitos humanos completa 15 anos. A Clínica Planalto, localizada em Planaltina, foi fechada oficialmente depois de uma investigação de mais de sete anos por parte de promotores do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), profissionais de saúde, policiais e peritos de diferentes áreas. Com o encerramento das atividades, os pacientes foram transferidos para unidades de saúde públicas.
Desde 1996, uma série de denúncias contra a instituição apontava deficiências estruturais, técnicas e profissionais no atendimento. O chamado “Grupo de Trabalho”, que tinha a frente o MPDFT, realizou a ação de interdição em 20 de março de 2003, quando já havia 127 pacientes custeados pelo SUS sendo vítimas de diversas formas de abuso e maus tratos no local. Esses pacientes eram ambientados em espaço separado dos que possuíam tratamento particular e, segundo as investigações, faltavam água, medicamentos e acompanhamento psicológico, além de haver “péssimas” condições de higiene e de alimentação”, segundo relatório técnico.
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No mesmo período, também foram denunciados os desaparecimentos de pelo menos 61 pacientes em um período de tempo de apenas cinco anos (1991-1996). Em defesa da clínica, funcionários afirmaram que muitos pacientes abandonavam o tratamento e fugiam do local. “De um modo geral, são os pacientes rechaçados, desamados, são os que fogem das clínicas. A fuga significa a não aceitação, recusa ao tratamento, rebeldia contra a imposição”, afirmou na ocasião Yeda Rabello, então médica da clínica.
De acordo com os relatórios da Promotoria de Justiça e Defesa da Saúde (PROSUS), não havia registro da clínica no Conselho Regional de Psicologia (CRP) e apenas duas psicólogas trabalhavam em regime de 20 horas semanais. O local também não pagava aluguel, conta de água e sonegava impostos públicos e federias.
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Na época, Regis Benes Soares de Andrade, diretor, e Carlos Benes Soares de Andrade, tesoureiro da clínica, foram processados pelo MPDFT e condenados em primeira instância a seis anos de reclusão em regime semiaberto. Conforme o relatório de intervenção do MPDFT, após o fechamento da Clínica Planalto, os pacientes financiados pelo SUS ou foram distribuídos entre outras três instituições de saúde, onde poderiam obter os devidos cuidados médicos, ou receberam alta médica e voltaram para suas casas, em busca de um recomeço.
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Um desses pacientes que teve de retomar sua vida e reconquistas sua identidade foi José Alves, 54 anos. Ele ainda se lembra dos maus tratos que sofreu na instituição. “Toda noite a gente se unia para deitar. Quando a gente levantava no outro dia, tinha pessoa que a gente não via mais. Esses aí a gente não tinha notícia: se essas pessoas morriam lá dentro ou se eram levadas para outro ambiente”. Hoje, segue bem com seu trabalho e casa própria, onde vive uma vida tranquila e independente ao lado de seus animais de estimação.
“Quando eu pedia água, um guarda me agredia com cassetete em minhas costelas.Faltava pouco para quebrar. Quando eu pedia comida, a mesma coisa. Foi quando eu me vi em uma situação em que não dava mais conta porque, por mais que você esteja transtornado, a fome, a sede: você sente. Foi aí, então, que me vi necessitado de me alimentar das minhas próprias fezes e da minha urina. Foi quando eu, por várias vezes…”, relatou Alves.
Por Paulo Gonçalves e Lucas Santin
Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira, Carolina Assunção, Katrine Boaventura e Isa Stacciarini