Familiares e amigos enfrentam desafios diários ao conviver e cuidar de pessoas que foram diagnosticadas com depressão. Cuidadores precisam se cuidar também, conforme explica a psicóloga Anna Luiza Gianasi, professora do Centro Universitário de Brasília (Ceub).
Ela explica que a rotina de quem oferece apoio é marcada por sobrecarga emocional, sentimentos de culpa e dificuldades para equilibrar o cuidado com o outro e consigo mesmo.

Rede de apoio
A especialista reforça que o tratamento exige acompanhamento psiquiátrico e terapêutico, além de uma rede de apoio que saiba escutar e respeitar os próprios limites para não adoecer junto.
O transtorno depressivo afeta pessoas de todas as idades. A pesquisadora explica como é difícil identificar um quadro depressivo, pois ele pode estar associado a outros tipos de adoecimento mental como transtornos de ansiedade e a síndrome de Burnout.
A depressão é identificada somente a partir de um exame clínico.
Depressão
Diferentemente da tristeza que é passageira, nesse transtorno, o estado de desânimo, apatia e desesperança é constante.
De acordo com o DSM-5-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), as causas da depressão podem estar ligadas a aspectos biológicos, como a genética e a bioquímica cerebral.
Outros fatores importantes são os aspectos psicológicos, frequentemente após passar por um trauma, e os aspectos sociais, como a exposição a uma série de comparações, comuns nas redes sociais.
“A depressão não é ‘loucura’, não é ‘doideira’. É uma doença muito séria que precisa de cuidado e precisa de tratamento”, esclarece a psicóloga.
“Existem tratamentos bastante eficazes sob o ponto de vista psiquiátrico e psicoterapêutico”, diz a psicóloga.
A depressão possui uma relação direta com a rede de apoio e os convívios saudáveis. Apesar do investimento em políticas públicas na saúde mental ser raso.
“Apenas 2% de toda a renda de um estado tem sido aplicado e investido em programas de saúde mental”, alerta a especialista.
Porém a melhora não depende apenas do Estado, mas também de todos os membros da sociedade, que são considerados agentes promotores de saúde mental.
Cuidado invisível
O principal desafio é a dificuldade por parte dos familiares em entender a doença, que tendem a não vê-la de uma forma leve, pois existe a incompreensão de que “a gente pensa que se a pessoa tem o que comer, tem onde dormir, tem um trabalho, não tem motivos para você estar chateado. Só que a vida não é só isso”, adverte a psicóloga.
Existem medo e preocupação constantes por parte do familiar, pois a incerteza do próximo dia e das próximas ações da pessoa doente gera a sensação de falta de controle e manejo da situação, independente do quanto se deseja ajudar.
“Por isso é tão importante a gente desenvolver estratégias para cuidar não só do doente, mas da família do doente para que esse familiar não adoeça também. É a máxima de quem cuida de quem cuida”, explica.
Limites
Por esse motivo, é fundamental desenvolver estratégias para preservar a saúde mental desse familiar também e gerar um alerta a respeito da importância do autocuidado consigo.
Ela explica que dedicar a atenção e o cuidado apenas ao outro, em detrimento do próprio autocuidado, pode resultar em sobrecarga emocional e, posteriormente, em um adoecimento do familiar. É necessário reconhecer que a situação é de extremo desconforto e que o não se tem como controlar o que a pessoa fará.
“Pessoas com depressão sofrem diariamente altos e baixos e é importante que a rede de apoio tenha noção dessas oscilações para que não haja expectativas ou surpresas”, explica.
O suporte exercido pelo familiar deve envolver a escuta ativa, validar o sofrimento da pessoa doente, ajudar nas tarefas essenciais, como marcar consultas e preparar refeições, apoiar o tratamento e principalmente, construir memórias sinceras e positivas com a pessoa com depressão.
“Falar sobre o desejo de morrer não gera suicídio; evita o suicídio”, destaca a psicologa.
A chance de sucesso do tratamento aumenta exponencialmente ao não se colocar em posição de “salvador do doente” e priorizar o autocuidado, evitando um futuro adoecimento.
Ações como buscar atendimento terapêutico, criar pausas de descanso e também trabalhar em colaboração com o próprio doente, definindo responsabilidades, gera mais saúde e qualidade no apoio.
“Divida o problema para que ele se torne menos complexo, pedindo a ajuda inclusive para o doente, para que ele faça a própria parte”, explica Anna Gianasi.
A ajuda não pode se transformar em uma total substituição de obrigações, pois existem tarefas em que se pode auxiliar e as que precisam ser desempenhadas pela própria pessoa com depressão, como o trabalho dela, o cumprimento do tratamento, entre outras. A professora do Ceub ressalta a importância de não se colocar constantemente na linha de frente do adoecimento.
“O cuidado não pode significar a anulação do familiar. Ninguém pode dar o que não é possível”, ressalta.
Apoio
Em contextos como o ambiente acadêmico, onde as pressões por desempenho, sucesso e estabilidade são constantes, é comum que estudantes e profissionais desenvolvam sintomas que afetam diretamente a saúde mental.
A professora de psicologia destaca que, embora existam políticas institucionais voltadas ao cuidado, como ações do RH e da direção acadêmica, ainda persiste um grande tabu em torno da busca por ajuda.
“Depende de quem escreve matéria, de quem faz pesquisa, de quem convive. Depende de todos nós desmistificar isso”, afirma a pesquisadora.
Para ela, oferecer uma escuta atenta e humanizar o convívio são formas essenciais de cidadania e de cuidado mútuo.
A professora destaca que o Centro Universitário de Brasília (CEUB), por exemplo, mantém o programa de extensão “Eis Me Aqui”.
Trata-se de um programa que tem o propósito de construir um espaço de acolhimento, escuta e convivência, visando a prevenção e promoção de saúde mental para os alunos e professores do Ceub. 
O “Acolhimento Porta Aberta” oferece escuta individual aos alunos da instituição. Os atendimentos são realizados por estudantes do último ano do curso de psicologia, sob supervisão da professora Tania Inessa, normalmente às segundas-feiras.
“É um atendimento para alunos que querem conversar, trocar uma ideia, enfim, e buscarem ajuda pros seus próprios sofrimentos”, explica a professora.
Às sextas, o grupo “Coletivo Singular” promove atividades em grupo como cinema, karaokê, origami e rodas de conversa, fortalecendo o senso de pertencimento e a saúde mental.
O programa também apoia docentes que lidam com situações delicadas envolvendo seus alunos, ampliando a rede de acolhimento dentro da universidade.
Por Júlia Harlley e Beatriz Ocké
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira
 
								


