Melhorar a concentração para os estudos é a alegação de estudantes para fazer uso da ritalina (nome comercial do metilfenidato), droga prescrita pelos médicos para crianças acima de 6 anos e adultos portadores do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). De acordo com psicólogo Antonio José dos Santos, o uso indevido do medicamento pode provocar problemas graves, como alucinações, delírios e até morte, em caso de ingestão de altas doses. O especialista ressalta que se ingerido sem acompanhamento médico e por um longo período pode causar dependência
De acordo com especialistas, no entanto, o uso dessa droga tem crescido entre jovens e adultos. Sem necessidade médica a Ritalina virou uma companheira dos concurseiros e estudantes que, conseguem o remédio ilegalmente ao comprar receitas médicas ou caixas do remédio pela internet.
Concentração
Um estudante de curso pré-vestibular, de 18 anos, que preferiu não ser identificado, conta que tomou o remédio por quatro meses, sem ter nenhum tipo de necessidade médica. “Eu tomava 2 ou 4 comprimidos de 10 mg. Faz 3 meses que não tomo”, diz. Ele completa dizendo que tomava direto, sem intervalos e não apenas quando ia estudar, “é assim o melhor jeito de se tomar”. O uso do remédio pelo estudante foi com o objetivo de “ter mais rendimento em aula”, comenta, “fiquei sabendo por amigos, que ja tinham tomado. É bem comum no meu meio de amigos fazer isso”.
Outro estudante entrevistado, também de cursinho, de 19 anos, tem resposta semelhante. “Tomava pra conseguir me concentrar por mais tempo e assim estudar mais”. Entretanto, diferentemente do primeiro entrevistado, o estudante conta que em seu meio social apenas ele tomava o remédio.
Pesquisa
Apesar da sua fama de “pílula da inteligência” ou “droga dos concurseiros”, a Ritalina foi desmistificada por uma pesquisa daUniversidade Federal de São Paulo (Unifesp). A pesquisa mostra que a pílula não causa nenhum tipo de benefício à atenção, funções executivas ou memória do jovem que não possui o transtorno.
A psicóloga Silmara Batistela, autora do estudo, decidiu investigar o tema ao perceber a popularização da prática de doping mental. O objetivo da pesquisadora era avaliar se o remédio realmente trazia vantagens cognitivas.
A metodologia usada na pesquisa consistiu em selecionar 36 jovens saudáveis de 18 a 30 anos e dividi-los aleatoriamente em quatro grupos. Um grupo tomou placebo e os outros três receberam uma dose única de 10 mg, 20 mg e 40 mg da medicação. Após tomarem o remédio os participantes passaram por uma série de testes que avaliaram a atenção, a memória operacional e de longo prazo e as funções executivas. O resultado foi semelhante nos quatro grupos, ou seja, ele mostrou a ineficácia da Ritalina em “turbinar” cérebros saudáveis. “O uso não alterou a função cognitiva. A única diferença que observamos foi que os que tomaram a dose maior, de 40 mg, relataram uma sensação subjetiva de bem-estar maior em comparação aos demais”.
Popularização
Segundo levantamento feito pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma) a pedido do Estado, houve um crescimento de quase 50% na venda de remédios à base de cloridrato de metilfenidato no Brasil entre 2008 e 2012. Entre setembro de 2007 e outubro de 2008 foram vendidas 1.238.064 caixas, enquanto entre setembro de 2011 e outubro de 2012 as vendas cresceram para 1.853.930 caixas. Nesse intervalo, os valores gastos com a medicação passaram de R$ 37.838.247 para R$ 90.719.793. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Estimulante
A Ritalina faz com que o indivíduo fique mais atento, concentrado, assim, os alunos tomam o remédio para poder aumentar a concentração durante os estudos e, consequentemente, aumentar o rendimento. O psicólogo, Antonio José dos Santos, explica que “a substância química presente, o metilfenidato, é estimulante e aumenta a liberação da dopamina (precursor natural da adrenalina), corrigindo o funcionamento deficitário e auxiliando no controle da hiperatividade”.
O problema é que a droga, muitas vezes prescrita de forma indiscriminada e desnecessária, teve seu uso generalizado. “Muitas pessoas estão confundindo uma inquietação, uma ansiedade, uma alta atividade de crianças e adolescentes”.
Acesso
O descuido dos médicos de indicar este medicamento em situações desnecessárias faz com que a prescrição do remédio seja facilmente alcançada por pessoas que não possuam nenhum indício dos distúrbios. Uma forma de conseguir o medicamente sem possuir o transtorno é “copiar” os sintomas do TDAH. Assim, os pacientes, que desejam o remédio, encenam os possíveis sintomas de um indivíduo que tenha o transtorno, já que os exames que comprovariam o diagnóstico não são exigidos por todos os médicos.
Outro jeito de conseguir a receita é comprando ilegalmente. “A Ritalina só pode ser adquirida através de consulta com médicos, que vai fazer o diagnóstico e acompanhar o tratamento, embora exista venda dessa medicação de forma clandestina”.
Um estudante de Pré-Vestibular confessa que comprou a receita com um Neurologista. “É bem fácil, é só você falar que vai tomar de qualquer jeito que eles te passam qualquer coisa”, completa.
Perigos
Segundo o psicólogo, o perigo é que nesses casos os prejuízos causados para quem não necessita usar, são muito grandes. Inúmeras pesquisas ja feitas sobre a Ritalina mostram o perigo dos seus efeitos colaterais, tanto a pacientes com necessidades médicas, quanto aqueles que não necessitam do uso.
Na pesquisa feita pela Unifesp, ja descrita nessa matéria, o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, diretor do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Universidade, alerta que há perigos quando o medicamento é usado inadequadamente, podendo causar, dentre outros problemas, complicações no coração e levar a um quadro de arritmia cardíaca.
A consciência dos efeitos colaterais que a Ritalina pode causar, embora que ainda pouca, também transita entre os usuários do medicamento. A concurseira, Gabriela Santos, de 23 anos, diz que ja pensou em tomar o remédio, mas que desistiu. “Não sei como meu corpo vai reagir e se vou ter perda de memória sabe? Não quero procurar doença”, conta a concurseira, “estou estudando pra concurso e esse é um dos remédios dos concurseiros que querem passar na frente…dando vários efeitos colaterais, como perda de memória”. Um estudante entrevistado disse que, quando tomava o remédio, sentia o coração acelerar. “Bom, o batimento cardíaco acelera. Você sente menos fome. Ansiedade. Você não tem dependência, mas tem picos e vales de atenção”.
O psicólogo Antonio José dos Santos,contou que em pesquisas realizadas ja foram “observados sintomas como: náuseas, vômitos, dores de cabeça, tonturas, sonolência e, em alguns casos, um ‘efeito zumbi’, como uma desorientação temporal e espacial”.
Mito
Há, mesmo com tantas pesquisas e comprovações de que o uso do medicamento não causa melhora em pessoas que não possuem o transtorno, o mito da “turbinação do cérebro” continua. Os estudantes, aqui entrevistados, sem excessão, dizem perceber uma melhora sim. “Ajuda muito, isso não tem debate nenhum”, diz um estudante.
Independente dos riscos do remédio e dos alertas dos especialistas, estudantes e concurseiros continuam acreditando na “pílula da inteligência” e, assim, participando do consumo ilegal do medicamento.
O psicólogo diz não acreditar na melhora causada pelo remédio em jovens saudáveis e que, se ocorreu um aumento na concentração, foi em “detrimento e prejuízo de outros sentidos, percepções, sentimentos e emoções que foram suprimidas pelo efeito da droga”.
Em relação a esse tema o especialista Antonio José dos Santos diz que, na sua opinião, a história do remédio, o princípio ativo e suas consequências, os estudos e as pesquisas realizadas pelas instituições e associações responsáveis pelo controle e liberação dessa droga vão derrubar esse mito, “na medida em que as pessoas forem conscientizadas de que essa droga é desnecessária. A Ritalina deve ser usada apenas para quem tem o TDAH diagnosticado com critérios médicos rigorosos”.
Por Kimberly Dias