Há nove meses, o pizzaiolo Wanderson Lima de Souza, de 36 anos, chega para o trabalho às 16h, coloca suas luvas e um óculos de proteção. Dirige-se à máquina de cortar frios e começa sua jornada de oito horas por dia. O local trabalha com forno a lenha.
A pizzaria que Wanderson trabalha proporciona a ele todos os equipamentos de segurança e possui chaminé para exalar, o que faz com que ele não tenha contato direto com a fumaça, o que é de extrema importância, visto que o principal risco à saúde é a inalação dessa fumaça que prejudica os pulmões, desenvolvendo DPOC, doença pulmonar obstrutiva crônica.
Essa realidade, contudo, não contempla a maior parte dos brasileiros diante de uma nova realidade: o uso de fogões a lenha.
Com o aumento em média de 2,3% no preço do gás de cozinha no mês de março, registrado pelo levantamento da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), muitos brasileiros, sem poder comprar o botijão, voltaram a cozinhar com lenha. Isso, traz um grande risco à saúde, podendo causar prejuízo às vias respiratórias e doença pulmonar obstrutiva crônica, além das queimaduras.
Inalação da fumaça pode prejudicar as vias respiratórias e causar doença pulmonar obstrutiva crônica. Rivalino Vaz da Silva Junior, clínico geral que trabalha na emergência dos queimados no Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), alegou que já atendeu pacientes que sofreram acidentes ao tentar ligar o fogão a lenha com algum combustível, e que isso é cada vez mais comum.
Riscos da lenha
O médico também afirmou que habitualmente atende pacientes fotossensíveis (condição na qual o indivíduo possui uma certa sensibilidade a luzes intermitentes) e enfermos que tiveram crise epiléptica sobre o fogão, causadas pela claridade da chama do fogo.
Queimaduras e problemas respiratórios, conjuntivite e graves problemas oculares também foram registrados na unidade em que Rivalino trabalha.
Segundo a Revista Brasileira de Queimaduras, a partir de uma amostra de 224 pacientes realizada em 2019, o perfil epidemiológico de vítimas de queimaduras admitidos pelo hospital é de predomínio do sexo masculino, compreendendo 62%, com média de idade de 32,5 anos.
Os agentes mais frequentes foram os térmicos (86%), com supremacia de agentes inflamáveis (54,68%), ocasionados por acidentes domésticos. A frequência de óbitos foi de 6%, sendo a sepse (complicação potencialmente fatal de uma infecção) a causa de morte mais predominante.
Preço alto
Com o preço do gás beirando os R$ 100 em Brasília, a população de baixa renda se vê obrigada a recorrer ao fogão a lenha para cozinhar seus alimentos.
Com o avanço da pandemia, se tornou mais comum o uso de álcool para higienização das mãos, substância inflamável extremamente perigosa junto ao uso do fogão a lenha.
O médico Rivalino afirma que não há estudos que comprovem uma tolerância para quem vive em constante contato com a fumaça do fogão a lenha, e que cada um reage de uma forma a longo prazo em contato com a fumaça.
Rivalino alerta para algumas medidas de primeiros socorros que devem ser tomadas caso haja queimaduras oriundas do fogão a lenha.
“Ao se queimar, é preciso antes de tudo, jogar água fria sobre a queimadura, porque assim o local quente e inflamado pode abaixar a temperatura e gerar uma cicatrização mais rápida. É preciso também lavar o local com sabão para prevenir a infecção”, explicou.
Segundo o Rivalino, a grande parte dos pacientes não cumprem com esses primeiros socorros por não acharem que é o correto a se fazer, e ao chegarem na emergência, passam por períodos mais difíceis de cicatrização.
Por Maiza Santa Rita e Maria Luiza Castro
Imagem: Adrian Pelletier / Creative Commons
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira