Entre medidas e flashes: modelo plus-size enfrenta preconceito no mercado da moda

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A intimidade de Sarah Rocha, 38, com os flashes é natural. Desde os 15 anos, volta e meia fotógrafos e conhecidos a encorajaram a ser modelo fotográfica, comercial e publicitária. Era uma menina fotogênica, tinha boa dicção e desenvoltura, era até comparada com algumas modelos que admirava, o que para ela eram elogios. Hoje, é designer e atua em uma agência de modelos para trabalhos dos mais variados. 

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“Decidi dar ouvidos a esses convites ou sugestões que já tinha recebido e fui procurar mais a fundo o mercado local e fora, estudar e fazer cursos e comecei a fazer alguns trabalhos e aos poucos ganhar experiência”. Sarah, modelo plus size desde 2018, resolveu se arriscar no mundo da moda em um período de transformação pessoal. “Foi um momento bem rico de aprendizagem e experiências na minha vida. Abriu meus olhos para outras possibilidades e versões minhas”.

 

“Muita gente ainda acha que a palavra ‘gordo’ ou ‘gorda’ é xingamento quando, na verdade, é só uma característica física. Como dizer que alguém é magro, alto, careca… São só características físicas e não são e não deveriam ser as únicas coisas consideradas em uma pessoa para medir seu valor ou beleza”, argumenta.

Comentários

Apesar de ainda sofrer um pouco nesse ramo com relação aos ajustes de roupas e comentários como “nossa, você é tão linda de rosto”, Sarah acredita que há avanços nesse mercado e a tendência é melhorar. “Ainda há um bom caminho a percorrer para ampliarmos e termos de fato representatividade no mundo da moda, com mais ofertas para participar de projetos como editoriais, desfiles, vídeos publicitários e por aí vai”.

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O preconceito em relação à forma física, imposta pela cultura da vez, são frequentes. Sarah não consegue contar as vezes em que já sofreu alguma discriminação por conta da aparência. “Mesmo que aparentemente sutis, já perdi as contas, daria um livro até”. Ela lembra de um caso específico que a deixou desconfortável e também revelou uma pressão sofrida pela maioria das mulheres.

Constrangimentos

“Uma situação constrangedora foi quando uma conhecida, super magra, comentando com outras gurias sobre padrões estéticos, dizendo que estava ‘gorda’ porque sua barriga não era negativa e que achava horrível mulher de barriga grande, porque era desleixo. Ao meu ver, naquele ambiente, tentou disfarçar e tentou desviar o assunto falando que era algo dela ou saúde/prevenção de doenças etc. Até algumas comentaram um pouco sobre pressão estética e padrão de beleza para mulheres, mas ficou um ‘climão’ mesmo eu buscando deixá-la tranquila, que aquilo era pesado pra ela também”.

De acordo com a pesquisa feita pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS), divulgada em dezembro de 2019, o Brasil é o país que mais realiza cirurgias plásticas no mundo. Os procedimentos mais procurados são a lipoaspiração e o implante de silicone.

Moldes

Esse ranking revela muito da sociedade em que vivemos, na qual cada vez mais procuramos nos encaixar em um “corpo perfeito”, “corpo aceito”. Sarah procura olhar para o corpo dela e de outras pessoas de um modo mais tolerante. “Vejo que cada corpo conta uma história e ele é companheiro nas jornadas boas e mais difíceis também e cada um tem seu processo. Atualmente, meu foco tem sido muito mais na busca por saúde mesmo e não apenas por pressão de me encaixar em um “molde’ que foge ao meu biotipo e seria impossível de eu alcançar. Isso é um cuidado até com a saúde mental e emocional que penso que deve ser o foco das pessoas”, diz.

 

Sarah acredita que outras mulheres estão começando a ter a mesma perspectiva sobre seus corpos. “observo como outras meninas e mulheres já estão pensando assim também e batalhando para que na moda possamos ter mais representatividade da mulher gorda ou fora do padrão. Porque estar ‘fora de um padrão’ não é só estar acima do peso, mas também estar muito magra ou com um visual de músculos mais definidos, enfim… Hoje acho que tem sido válido questionar o que é este tal padrão que muitas vezes exclui e discrimina tantos tipos de corpos que existem na nossa sociedade, né?”, indaga.

Padrões?

Com 1,66 metro de altura, busto 120cm, cintura 100cm, quadril 124cm e manequim 48/50, Sarah já pensou em ser magra por se sentir pressionada. “Creio que não conheço nenhuma mulher que não tenha sofrido com isso ou algo similar em algum momento da vida. É muito chato ver alguém querer meter o bedelho como se o seu corpo fosse público.”

Hoje, a modelo é mais tranquila em relação ao ser corpo, tem mais consciência do que ele significa para ela. Sarah acredita que não há porque se punir e buscar um padrão que pode até mesmo ferir o seu próprio corpo e ir contra ele é uma agressão e violência contra si mesmo. 

Espelho

A modelo plus size se sente afortunada por ter recebido tanto apoio, mesmo sendo gorda e começando a modelar um pouco mais tarde, o que também é visto com preconceito por alguns. Sarah se sentiu ainda mais motivada quando recebeu mensagens de mulheres que finalmente se viam representadas por ela em desfiles, editoriais ou até mesmo em uma capa de revista.  Para ela, aceitação é justamente se olhar no espelho e tomar a decisão de se amar. “É preciso mudar essa relação com o corpo, buscar deixar de odiar o que vê no espelho e passar a se cuidar, por amor ao corpo que habita, não importa o gênero ou idade.”

IMAGEM

Legenda: Sarah Rocha em editorial de lançamento da loja Closet Vestidos de Festa Plus Size

Crédito: Cláudio Andrade

Por Maiza Santa Rita

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