
O que pode ser feito para mudar a realidade em que vivemos? Para Dai Ribeiro, sua resposta para esse questionamento é a produção de um legado de sustentabilidade e ensino. Aos 41 anos, ela está à frente do Instituto Arapoti, que realiza projetos de iniciativas sustentáveis em escolas, condomínios e empresas. Ela conta que o início dessa jornada ocorreu por ideais. Juntaram-se a ela parceiros que entendem que preservar o meio e produzir é uma obrigação
Como é que você teve essa ideia de começar o instituto? O que você fazia antes e por que você resolveu dar essa volta na sua vida pra começar o estudo?
“Eu estava numa fase de maternidade, meu filho tinha mais ou menos um ano. Vim do mundo corporativo da área da indústria e também da parte da construção civil, e aí eu comecei a fazer alguns questionamentos sobre legado, que a vida passa como um sopro, e o que a gente tá fazendo nesse mundo, o que a gente tá deixando de transformação.
Todo mundo me questionou. Me chamaram de louca, o que você está fazendo com a sua carreira, já estava num grande grupo multinacional, já era coordenadora de sete fábricas.
Eu cuidava da parte de segurança, de meio ambiente e também da parte de medicina. Mas aquilo começou a não fazer sentido pra mim, que eu falei: o que realmente eu vou deixar? Eu vou ficar trabalhando, já ia completar dez anos nesse grupo. Ia ganhar um troféu joinha, né? Que é de uma década lá. Mas o que que eu vou deixar? Que transformação que a gente pode olhar pra trás e falar, poxa, valeu a pena? Me agarrei na coragem e fui justamente constituir o Arapoti, que hoje é um instituto especializado na implantação da sustentabilidade em condomínios, escolas e empresas, mas justamente querendo fazer a transformação. E o nosso intuito não é ficar com os nossos parceiros ad eternum, mas é de fazer a transformação e depois ir desenvolver outra comunidade. Então os nossos projetos tem início, meio e preparação pro fim que a gente fala que é desmamar. Tem uma hora que o filho precisa caminhar sozinho, andar e correr sozinho sem a mamãe. Então o Arapoti cuida naquele momento, faz esse aconchego, ajuda a implantar, mas depois vai desenvolver outros lugares também.”
Como é que funciona justamente esse primeiro contato que você tem com a os seus parceiros? Eles vão atrás de você, você que vai atrás deles com a ideia de fazer alguma coisa diferente dentro da escola ou da empresa ou do condomínio?
“No primeiro ano do Arapoti a gente abriu um edital e a gente fez captação por meio desse edital. Mas depois que a gente teve as primeiras vitrines, a gente não precisou abrir mais. Hoje as próprias pessoas procuram o instituto.
A gente mostra como é que funciona o programa. Então o instituto tem projetos e tem programas. Pra gente a linguagem do nome projeto significa que é algo que está sendo a primeira vez. No mundo dos negócios ele seria um produto mínimo viável. É quando você faz o teste daquela ideia.
E aí ele se torna em programa que tem metodologia definida. A gente sabe como é que vai ser o primeiro, o segundo, o terceiro mês, quarto mês, até doze meses de implantação. A gente sabe o passo a passo. Tanto na parte de projetos, que a gente ajuda nessa parte da infraestrutura, da adequação, da infraestrutura necessária, como centrais de resíduos.
Sobre as hortas comunitárias, a gente trabalha nessa parte da infraestrutura, trabalha também no engajamento das pessoas. A gente engaja o morador de um condomínio, a gente engaja o funcionário da minha empresa pra ele ter também se sentir sensível com essa questão ambiental e ajudar no movimento. E ao mesmo tempo a gente monitora os resultados. Pra poder divulgar amanhã quanto que a gente compostou, quanto que a gente reciclou. Quantas horas de sensibilização nós fizemos com esse parceiro? Então a gente trabalha sempre nesses três pilares, seja com empresa, condomínio ou com escola.”
Dentre essas realizações principais, o que costuma ser uma marca registrada? Vocês depois da parceria vocês analisam o que vai ser mais útil pra dentro daquele contexto? Quais são as maiores realizações que vocês tem?
“Primeiro é a realização da transformação, porque a gente mexe no ambiente físico também do lugar que a gente tá. Então as pessoas gostam porque a gente traz mais harmonia pros espaços verdes. Transformar aquela área comum de condomínio que não tem utilidade nenhuma, às vezes numa horta, numa central de resíduo onde o morador pode ir lá levar o seu resíduo, fazer o descarte correto. Então eles dão um feedback muito positivo porque a gente melhora a parte estética do condomínio, da escola, da empresa. Nas escolas as mães ficam encantadas com os espaços ecopedagógicos. Porque também saber que o seu filho está numa escola e está tendo vivências de jardim sensorial, de ter contato com horta, com pomar, é incrível trazer essa vivência. De mostrar pra eles da onde que vem o alimento, de como ele é produzido, quais são os ciclos da natureza e despertar essa conexão com a natureza nas escolas é muito bom. Porque as escolas também estão querendo cada vez mais ir pro lado do concreto, né? Está indo mais e o ser humano não dá conta de viver somente no concreto. A pandemia mostrou isso, que quando a gente fica enclausurado muito tempo, quando a gente tem essas vivências baseadas simplesmente no meio urbano sem conexão com a natureza, a gente tem alguns sintomas de depressão, tem psicólogo falando de déficit de natureza, ou seja, a gente precisa ter contato com a natureza, senão o ser humano tem realmente uma dificuldade com essas doenças mentais mesmo, isso é a doença do século.”
Você poderia comentar um pouco mais a respeito sobre o que é o Oscar da sustentabilidade?
“Esse é o nosso xodozinho. Agora em nove de dezembro, já está marcado. É o prêmio do Instituto Arapoti. É o Prêmio Arapoti. É o nosso Oscar da sustentabilidade, como você mencionou, que é justamente o reconhecimento dessas pessoas que estão fazendo acontecer, né? Tem 35 profissionais trabalhando com a gente dentro dos condomínios escolas e empresas, são mais de 20 mil pessoas que estão engajadas com a gente e elas merecem reconhecimento. Eu falo que o reconhecimento não é nem para o Arapoti, é o reconhecimento para as pessoas guerreiras que toparam o desafio de fazer acontecer, que toparam o desafio de transformar, e estão fazendo essa transformação. Todos merecem todo reconhecimento e vai ser o reconhecimento com direito a tapete vermelho, troféu e cobertura da imprensa com tudo que tem direito, como um Oscar pede, e no final também um coquetel para a gente comemorar, né? Tirar bastante foto e fazer entrevista com as pessoas que estão ali que são nossos guerreiros que fizeram acontecer ao longo do ano.”
Você fala que as pessoas têm interesse em conhecer mais sobre métodos de sustentabilidade, mas eu imagino que não seja todo mundo que tem esse conhecimento sobre a compostagem .Você poderia explicar melhor para as pessoas o que é?
“Compostagem é a transformação das nossas sobras, nosso resto de comida em adubo. É a grande mágica da natureza que a gente fala que é o ciclo da matéria orgânica. Acontece na própria natureza, lá na beira do rio, onde caí as frutinhas, né? Os animais decompositores fazem o processo de decomposição, e depois fica aquela terra preta na beira do rio, e todo mundo fala que para plantar a melhor coisa é a terra preta, que é exatamente esse conceito que a gente pode também em centro urbano pegar nosso resto de comida, não enterrar no aterro, e e transformar em adubo. Então resumindo em poucas palavras, a compostagem é a reciclagem do nosso resto de comida. A gente devolve para a natureza o que seria poluição a gente devolve como uma adubação, e trazer fertilização ao solo.”
Como é que a gente pode fazer uma compostagem caseira?
“Normalmente o pessoal gosta de usar um minhocário que é você dar comida para as minhocas. A gente também usa o resto das minhocas, que é o húmus de minhoca. No Instagram do Instituto Arapoti tem um link que tem um curso online de compostagem no valor muito simbólico de R$49,90, para custear pelo menos a plataforma em que o curso fica disponível. Não tem desculpa Vinícius, Qualquer pessoa pode compostar por R$49,90, faz o curso e compra a composteira que tá na hora da gente fazer esse movimento de transformação.”
Gostaria de saber do ponto de vista de escolas e instituições de ensino geral. Como é que elas fazem para ter o seu apoio para implantar uma compostagem ou uma horta comunitária?
“A gente tem um programa escola sustentável. É uma adesão a um programa que uma parte é custeada pelo Arapoti, mas uma parte é custeada também pela escola. Então não é um programa 100% gratuito, mas é um programa muito viável em função da captação de recursos que a gente pode fazer. É só entrar em contato com a gente; tem a página no Instagram, né Instituto Arapoti, tem um site também, o institutoarapoti.com.br. A pessoa entra em contato com a gente, e nós apresentamos como é que funciona o programa, fechamos o termo de parceria e começa já dentro da metodologia do passo a passo como fazer acontecer.”
Quem são os responsáveis por fornecer o apoio financeiro para vocês?
“No prêmio Arapoti a gente tem o apoio do Atacadão Dia a Dia, Ateliê natural gastronomia, Pão Nosso e 100 cmyk, que é uma gráfica. Ou seja, são vários empresários que acreditam nessa mudança e nos apoiam ,vários mesmo, graças a Deus tá tudo bem. Lembrando que não são programas gratuitos, eles têm uma contrapartida do parceiro, né? Seja condomínio, escola ou empresa, então também a gente coloca numa balança de forma que exista uma energia de troca.”
Eu queria conversar com você a respeito de duas iniciativas específicas, é que você falasse primeiro a respeito da horta Comunitária do Guará, que é uma hora que a gente já conversou na agência tem matéria, inclusive no site. Eu queria conversar com você sobre como é que funciona a distribuição de cestas básicas lá.
“Lá a distribuição de cesta é nos dias dos encontros. Então, a Horta Comunitária do Guará começou como: primeiro que era um terreno baldio com mato até mais alto do que eu, acumulava lixo e as pessoas não cuidavam, era uma área pública aberta. E aí a gente falou “uma área pública pode ser mais produtiva, pode trazer alimentos orgânicos e alimentação saudável para essa comunidade.” Hoje a gente se encontra a cada 15 dias, é uma distribuição de cesta gratuita. A gente consegue no ano gerar entre 900 e 1000 cestas distribuídas ao longo de um ano, então é uma produção bem ativa sim. As pessoas falam que a cesta não dá para uma família, e sim para duas na verdade, porque é muita coisa, tem que dividir com o vizinho.
Então a gente começou com essa proposta de a gente cultivar alimentos orgânicos no espaço público e trazer isso de forma gratuita. A gente produz de tudo um pouco, tem mandioca, batata-doce, alho poró, brócolis, couve-flor, as básicas cebolinha, salsa, coentro. Tem de todo tipo, depende muito da estação do ano também, mas para a gente a horta é muito especial, porque se formou uma família. E a gente tem acesso a alimentação saudável toda conexão com as pessoas que estão ali querendo também fazer o bem, e aí em função disso outros grupos se conectaram com a gente. Deixou de ser só uma horta comunitária, porque ali se tornou um grande centro de referência nessa parte de ações sociais e ambientais também.
Lá é um projeto legal, não tem burocracia nenhuma, quem quiser participar é só chegar no dia dos encontros que acontecem quinzenalmente. A gente faz encontro normalmente de nove à meio-dia, a gente chega planta cuida, faz um lanche comunitário e depois divide a colheita. É legal também que a gente tenha a sensação de literalmente ser um trabalho solidário e comunitário.
Tem um outro projeto muito legal também que se chama espaço Mc da sustentabilidade que eles fizeram uma grande sacada de negócio de fazer do Limão uma limonada, né? Eles têm que cumprir uma legislação sobre separação e destinação de resíduos, então eles aproveitaram para fazer um espaço compartilhado com a comunidade escolar. A gente recebe duas vezes por mês escolas públicas para eles conhecerem como se separa o resíduo, qual a importância da separação, qual a destinação do resto de comida, todo o resto de comida daquele restaurante vai para compostagem. É uma área privada que se tornou um espaço público, que disponibilizaram a área privada deles para se tornar espaço público. Lá a gente consegue fazer todo o ciclo da natureza com as crianças da escola.
Então a gente começou abordando aquele conceito de começar pelo pensar global e agir local. A gente começou com a escola classe 106 Norte. Essa vivência e essa experiência eles têm duas vezes por mês e também com a escola Gisno com crianças especiais. É um projeto muito bonito porque é uma horta comunitária no meio da W3 Norte, fica na 506/507 Norte.”
Além desses projetos que você tem junto ao instituto que outras iniciativas, você acha que merecem destaque?
“Eu citaria a escola Cantinho do girassol que é uma escola que fica em Taguatinga/Ceilândia, e ali eles fizeram a central de compostagem. Todo o resto de comida é transformado em adubo, que alimenta a horta. Além desse ciclo com as crianças da horta de plantar e colher, eles estão construindo o espaço Ecopedagógico com Jardim sensorial. Lá vai ter fonte e uma parte sensorial . Como lá tem educação infantil para crianças menores de 6 anos, elas vão ter experiências sensoriais como tato, paladar, com o olfato e isso por meio de piso sensoriais, estímulos visuais, estímulos da água. Todo o espaço está sendo construído agora e vale a pena visitar porque eles estão finalizando para a gente conseguir proporcionar para as escolas o momento de conexão com a natureza e conexão com os sentidos. É um ótimo projeto também para ser visitado porque lá se fecha o ciclo completinho desde plantar colher e também da parte de trazer a escola como um laboratório vivo de aprendizagem.”
Confira abaixo a entrevista completa:
Por Vinícius Pinelli